Notícias de Nova Friburgo e Região Serrana
Trocou-se a fantasia, mas a festa segue a mesma

Lucas Barros
Além das Montanhas
Jovem, advogado criminal, Chevalier na Ordem DeMolay e apaixonado por Nova Friburgo. Além das Montanhas vem para mostrar que nossa cidade não está numa redoma e que somos afetados por tudo a nossa volta.
Nos últimos meses, Nova Friburgo tem vivido uma sequência de escândalos que envergonham até o mais otimista dos cidadãos. A cada semana, surgem novas informações sobre contratos suspeitos, valores incompatíveis com a realidade e a já conhecida promiscuidade entre o poder público e certos fornecedores.
É como se a cidade estivesse presa num ciclo de repetições de más gestões e de escândalos sem fim: troca-se o palco, muda-se o evento, mas os personagens e os bastidores continuam os mesmos. Desde a época dos acalorados embates em Paulo Azevedo e Heródoto, passando pelos absurdos pós enchente até o presente momento.
Eventos são importantes, porém
É inegável que eventos públicos são importantes para a cidade. Eles movimentam a economia, atraem turistas, fortalecem o comércio local e geram oportunidades. Mas também é inegável que, em Friburgo, essas iniciativas têm sido tratadas como verdadeiros balcões de negócios.
Basta uma leitura atenta nos contratos publicados no Diário Oficial para notar incoerências gritantes: empresas recém-abertas vencendo licitações vultosas, estruturas superfaturadas, pagamentos adiantados e uma falta de transparência que já beira o deboche, especialmente se falando dos valores gastos com shows de artistas para o evento “Reforma Protestante”.
Enquanto isso, a cidade enfrenta dificuldades reais. O mato toma conta de praças e calçadas, o hospital segue ao léu, e os bairros mais distantes continuam esquecidos, sem infraestrutura mínima. Os servidores, que carregam a máquina pública nas costas, convivem com atrasos salariais, falta de insumos e promessas não cumpridas.
Mas, para os eventos, há sempre verba e espaço no orçamento — desde que os contratos caibam no bolso certo. E o mais irônico é que, em muitos desses contratos, o discurso é de valorização do turismo e da cultura friburguense. No entanto, os verdadeiros artistas da cidade sequer são, muitas vezes, os contratados.
Revolta, mas não surpreende
Em vez de servir à cultura, os eventos parecem servir a um grupo muito específico — sempre os mesmos, diga-se, o grupo de apoio político à atual gestão. A tal "turma dos eventos" virou piada pronta nas rodas de conversa e palco de um escândalo que dividiu os palcos políticos da cidade.
É triste ver o nome de Nova Friburgo envolvido em escândalos que poderiam ser facilmente evitados com transparência, ética e respeito ao dinheiro público. Mais triste ainda é ver que, mesmo diante de tantas denúncias, ainda há quem defenda o indefensável — seja por conveniência, por medo, ou por interesse.
Em uma cidade onde há artistas locais qualificados, produtores culturais experientes e mão de obra abundante, é curioso ver que apenas determinados nomes aparecem repetidamente nas contratações, como se fossem os únicos capazes de realizar uma festa ou um show.
É importante dizer que a crítica aqui não é contra eventos — ao contrário. A cidade precisa deles, especialmente em tempos difíceis, quando o lazer e a arte se tornam refúgios. Mas precisamos de eventos que respeitem a legalidade, que valorizem o artista local, que prestem contas dos seus gastos e que beneficiem a população como um todo, e não apenas quem está com o crachá certo no peito.
Fiscalização
O Ministério Público tem cumprido seu papel – ao menos no presente momento -, com investigações que já resultaram em ações, afastamentos e pedidos de explicações. Mas não pode agir sozinho. A Câmara de Vereadores, em grande parte omissa, precisa lembrar que o seu papel não é apenas votar projetos do Executivo, mas fiscalizar com independência.
No entanto, as audiências públicas têm, a cada dia, escancarado o distanciamento entre o discurso e a prática. Muitos vereadores se comportam como defensores da gestão, ainda que diante de fatos gritantes. Preferem o silêncio conveniente ao confronto necessário. Esquecem que foram eleitos para fiscalizar, não para aplaudir.
Esse alinhamento político com o Executivo, diante de fatos tão graves, enfraquece a democracia local e mina a confiança da população em soluções. Quando os vereadores deixam de questionar contratos suspeitos, de exigir transparência e de representar os interesses da comunidade, tornam-se cúmplices do que deveriam combater.
A Câmara não pode ser palco de conchavos e acordos velados, mas espaço de debate, fiscalização e coragem política. O povo não precisa de aliados do prefeito, mas de guardiões do interesse público.
Friburgo é uma cidade linda, cheia de potencial e com um povo trabalhador. Merece mais do que administrações que enxergam o serviço público como uma extensão dos próprios interesses. A cidade merece um novo capítulo, longe dos velhos vícios. Mas esse capítulo não vai se escrever sozinho. Vai depender da coragem de quem denuncia, da independência de quem fiscaliza e da consciência de quem vota.
Muitas pessoas sempre acharam que os textos desta coluna tinham tendência política, mas o tempo tem se encarregado de revelar que não era questão de lado — era questão de lucidez. Enquanto alguns preferiam o conforto da conveniência, optei por enxergar o que muitos insistiam em ignorar. Não se trata de oposição, mas de compromisso com a verdade, mesmo quando ela incomoda. Afinal, quem escreve com consciência antecipa aquilo que, mais cedo ou mais tarde, salta aos olhos de todos.

Lucas Barros
Além das Montanhas
Jovem, advogado criminal, Chevalier na Ordem DeMolay e apaixonado por Nova Friburgo. Além das Montanhas vem para mostrar que nossa cidade não está numa redoma e que somos afetados por tudo a nossa volta.
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