Precisamos falar da revolução no Irã

Lucas Barros

Além das Montanhas

Jovem, advogado criminal, Chevalier na Ordem DeMolay e apaixonado por Nova Friburgo. Além das Montanhas vem para mostrar que nossa cidade não está numa redoma e que somos afetados por tudo a nossa volta.

quarta-feira, 23 de novembro de 2022

Hoje, todo o mundo celebra e vibra com a Copa do Mundo, que nos alegra a cada quatro longos anos. Nós, brasileiros, então, apaixonados por futebol, acompanhamos ansiosamente os jogos da nossa seleção, na expectativa de bons resultados e até mesmo na conquista do hexacampeonato.

Ultimamente, evitamos falar de algo que não esteja relacionado com futebol. Deixamos de falar da Guerra da Ucrânia e diminuímos um pouco a nossa animosidade em relação às incertezas da política brasileira. Todos nós, sem exceção, nos alienamos um pouco com todo esse clima de alegria e festividade. Mas o mundo deve dedicar olhos, ouvidos e muita atenção ao Irã.

Um olho na Copa e outro nos protestos

A seleção de futebol do Irã foi à Copa do Mundo no Catar em meio a uma onda de protestos contra o seu governo. Na estreia dos jogadores contra o time da Inglaterra, na última segunda-feira, 21, o time do Irã se recusou a cantar o hino. O gesto certamente, durante o maior evento de festividades do mundo, não passou despercebido.

O Irã vive sua maior onda de protestos, em uma escala que já não era vista há mais de 40 anos. As manifestações começaram há 50 dias como uma forma de denunciar a violência contra as mulheres no país e se tornaram o desafio mais sério ao governo desde a revolução Islâmica de 1979.

O estopim foi em resposta à morte de Mahsa Amini, uma jovem moça de apenas 22 anos que havia sido detida pela polícia da moralidade por supostamente violar as rígidas regras do país, que exigem que as mulheres usem um lenço na cabeça que cubram os cabelos, conhecido como hijab.

Durante a abordagem, Mahsa teria sido golpeada propositalmente com um cassetete na cabeça. Imagens da jovem desfalecendo na unidade policial tomaram conta das redes sociais do país. A jovem, que tinha apenas 22 anos, ficou em coma e morreu, gerando grande levante de protestos, em sua maioria mulheres.

Abandono do Hijab e pichações

Acredite ou não, mas nem sempre as mulheres eram obrigadas a hijab. Após a revolução islâmica no final dos anos 70, o lenço foi instituído pelo novo governo e tornou-se símbolo de uma dura repressão religiosa imposta às mulheres. Retirar o véu ainda é contra a lei.

Contudo, nas últimas semanas, um levante foi montado e as iranianas desafiam as rígidas regras sobre cobrir a cabeça. Uma onda de mulheres inconformadas com a imposição, em meio a protestos, ocupa as ruas do país numa luta por mudança. Afinal, no Irã: uma mulher é vista como a metade de um homem. Ou até menos!

Não só com as mulheres, mas os movimentos revolucionários tocaram toda população jovem, também luta contra o regime. Crianças em idade escolar, adolescentes e jovens adultos estão entre os grupos mais ativos, que cantam músicas antigovernamentais, queima de fotos do líder do aiatolá Khameni (livro de interpretação radical do islã) e pichações com o rosto dos mártires nas ruas da cidade.

Respostas violentas do governo

Todo dia um novo enterro, jovens que são carregados até a sepultura por suas famílias e amigos. Mas também há crianças que acompanham as mães até a sepultura. Essas imagens difíceis de suportar marcam há semanas as notícias no Irã pelo mundo.

Até agora, são pelo menos 270 iranianas e iranianos, entre os quais 30 crianças, foram espancadas até a morte ou fuziladas, por terem ido às ruas, em meio as manifestações. Assassinado por lutar por valores liberais e em favor da democracia. Gente que quer viver segundo esses valores, paga com a vida, segundo o conservadorismo árabe.

Ao lado das faculdades, cemitérios são agora os maiores locais de protestos contra o governo. Gente cujas famílias sofrem pressão ou são presas, para prestar confissão pública sob tortura, para afirmar que seus filhos morreram de parada cardíaca, derrame cerebral ou suicídio. O governo do Irã a todo tempo culpa os ocidentais por motivarem os protestos e lutam com armas contra a população que usa apenas a voz.

Em contra partida, damos atenção à ocupação da Ucrânia, à Copa do Mundo no Catar e suas violações aos direitos, mas quase não vemos sobre o Irã nos meios de comunicação. É uma tapa na cara não falarmos sobre um regime prende, violenta, fuzila e espanca até a morte meninas de escola, no momento em que o Irã passa por uma das suas maiores revoluções - se não a maior – de todos os tempos.

Enquanto isso, as pessoas no Irã percebem que mesmo aquelas que não são engajadas na política podem ser mortas por nada. Isso a faz lutar por esperança. É olhar para o passado e para o presente e não querer que isso se repita no futuro. É o desafio que supera o medo!

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