Uma longa sessão, de mais de quatro horas, na Câmara de Vereadores de Nova Friburgo, impôs ao ex-prefeito Renato Bravo a terceira derrota relativa à aprovação de suas contas no exercício fiscal de 2018. Por 19 votos contra apenas dois - os de Vanderléia Abrace Esta Ideia (DEM) e Jânio Carvalho (DC) -, o plenário rejeitou, na noite da última terça-feira, 9, a aprovação das contas daquele ano.
Agora, Renato Bravo corre risco de inelegibilidade por oito anos, caso seja condenado pela Justiça por ato doloso, de acordo com a nova Lei de Improbidade Administrativa, que entrou em vigor no mês passado. Caso decida concorrer em qualquer nova eleição, Bravo poderá ter sua candidatura impugnada pela Justiça Eleitoral.
O projeto de decreto legislativo 833/2020 que tratava da reprovação das contas de 2018 foi proposto pela Comissão de Finanças, Orçamento, Tributação e Planejamento da Câmara Municipal e seguiu o parecer técnico emitido no fim de 2019 pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ).
Derrotas em várias instâncias do TCE-RJ
No âmbito do TCE-RJ, as contas de 2018 de Renato Bravo já haviam sido rejeitadas em várias instâncias: em parecer prévio do Corpo Instrutivo daquela côrte; pelo conselheiro relator, que abriu diligência após defesa apresentada pelo Executivo; e, por fim, pelo colegiado do tribunal, em sessão plenária. O Ministério Público Estadual (MPE) também se posicionou contra a aprovação, ainda que tenha aceito parcialmente os argumentos apresentados pelo governo municipal na época.
O mesmo entendimento se repetiu na Câmara friburguense. Em agosto de 2020 o plenário já tinha reprovado, desta vez por 17 votos a três, as contas de 2018 do ex-prefeito. Mas ele recorreu à Justiça e conseguiu anular a sessão, a tempo de manter sua candidatura à reeleição. Foi um fracasso: o candidato que no pleito de 2016 se elegeu prefeito com 29.046 votos, desta vez obteve apenas 3.538 votos e ficou na décima posição entre os 16 concorrentes à cadeira número 1 do Palácio Barão de Nova Friburgo.
Na época, Bravo alegou ter sido notificado fora do prazo, falha assumida pela Câmara de Vereadores, e a Justiça acolheu o argumento de cerceamento de defesa. “Usaram de todos os artifícios e manobras para ganhar tempo e se esquivar do processo, mas quem acompanhou e fiscalizou o governo passado sabia que essas contas jamais poderiam ser aprovadas. Renato Bravo conta com a lentidão da Justiça como aliada”, diz o vereador Zezinho do Caminhão (PSB), líder do governo Johnny Maycon na Câmara e ex-integrante da tropa de choque contra o governo passado. Membro da Comissão de Constituição e Justiça, ele subiu à tribuna para discursar a favor da rejeição das contas.
Mais de R$ 27 milhões gastos sem autorização legislativa
O TCE rejeitou as contas de Renato Bravo por encontrar diversas irregularidades, entre elas a abertura de créditos adicionais de R$ 194.971.892,45, ultrapassando o limite estabelecido na Lei Orçamentária Anual (LOA) em R$ 27.524.771,75, o que descumpre a Constituição Federal. Ainda de acordo com o TCE, foram identificadas 14 impropriedades que geraram 15 determinações ao Executivo municipal.
A votação na Câmara das contas de 2019 do governo Bravo, em abril passado, também precisou ser adiada para que ele tivesse direito a ampla defesa. Essas contas, aprovadas pelo TCE com ressalvas, passaram na Câmara por 12 votos favoráveis e oito contrários.
Renato Bravo teve bens bloqueados ao apagar das luzes do seu mandato, em dezembro de 2020, e foi condenado pela 2ª Vara Cível de Friburgo a devolver ao erário quase R$ 400 mil em reparação a danos causados por pelo menos um contrato emergencial, sem licitação, de fornecimento de alimentação hospitalar. Apontado como “chefe do esquema”, o ex-secretário de Governo, Bruno Villas Boas também foi alvo da ação civil pública por atos de improbidade proposta pelo Ministério Público Estadual.
O contrato também foi objeto de investigação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara de Vereadores, presidida pelo então vereador e agora prefeito Johnny Maycon, que acusou superfaturamento. O Ministério Público Federal ainda analisa outros contratos.
Segundo Zezinho, é possível que Renato Bravo - afastado da vida pública desde que deixou o governo, em 31 de dezembro do ano passado - recorra mais uma vez à Justiça para anular a sessão desta terça, desta vez alegando que os vereadores não foram formalmente notificados. O vereador lembra, no entanto, que o próprio ex-prefeito não compareceu para se defender nem enviou representantes ao plenário.
"Depois de longa briga nos tribunais, o presidente da Casa, respeitando ordem judicial, pautou a matéria para a sessão de ontem (terça-feira, 9). Agora cabe à Câmara Municipal publicar o decreto legislativo com o resultado da votação e, posteriormente, comunicar a alguns órgãos, como o MP e o TCE, por exemplo", informou a Câmara em nota oficial.
O que diz Renato Bravo
Em nota, o ex-prefeito Renato Bravo afirma que tomará as medidas judiciais cabíveis a fim de reparar os danos que lhe foram ocasionados. Ele esclareceu que o parecer do TCE-RJ deixa claro que não houve dolo nem dano ou prejuízo financeiro ou econômico ao erário. “A acusação é de ter gasto mais com investimentos em educação, numa interpretação equivocada da leitura da lei, conforme já esclarecido”, afirma.
Renato lembra que o processo está sub judice, tramitando ação anulatória. Alega ainda que, por tratar-se de uma nova legislatura, deveria haver um novo processo legal, com novo relator, já que o antigo não se reelegeu, e novos prazos, conforme determina a lei.
Na nota, o ex-prefeito destaca ainda que no último dia 25 foi sancionada a Lei Federal 14.230/2021, que alterou a lei 8.429/92, que dispõe sobre improbidade administrativa. No seu entendimento, a nova lei tem eficácia retroativa sobre todos os procedimentos administrativos e/ou judiciais que estejam em curso e versem sobre o tema de improbidade administrativa.
Entenda a prestação de contas
Pela Constituição Federal, a fiscalização contábil, financeira e orçamentária do poder público, no âmbito municipal, é feita em duas etapas, pela aprovação ou rejeição. Na primeira, a competência é do Tribunal de Contas do Estado, um órgão técnico designado para a situação financeira e legal das contas do Executivo, responsável legal pela administração dos recursos da cidade. Já na segunda etapa, a Câmara Municipal, em posse do parecer técnico que sugere aprovação ou rejeição, delibera sobre seguir ou não o parecer técnico.
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