Viva a tecnologia

Paula Farsoun

Com a palavra...

Paula é uma jovem friburguense, advogada, escritora e apaixonada desde sempre pela arte de escrever e o mundo dos livros. Ama família, flores e café e tem um olhar otimista voltado para o ser humano e suas relações, prerrogativas e experiências.

sexta-feira, 31 de julho de 2020

Inevitáveis têm sido os estranhamentos, as surpresas e as reflexões sobre esse mundo novo, que ao mesmo tempo em que parece não ter engatinhado, já aprendeu a voar: o mundo virtual, a conectividade constante e a partilha de afetos e de vidas pelas redes sociais. Sinto que as vidas, os desejos, os passos, os afazeres, as perdas, os anseios, os familiares das pessoas nunca antes haviam sido tão expostos como nos últimos tempos.

Há filhos de estranhos cujo crescimento podemos acompanhar com sensação de proximidade ainda maior do que os próprios parentes que se encontram em almoços de domingo. Sem nunca sequer temos os conhecido. Porque seus rostos nos são apresentados às vezes por foto de exame de ultrassonografia. Porque não há mais necessidade de irmos à maternidade para sanar a ansiedade e a curiosidade de conhecer “ a carinha bebê”. Basta esperar algumas horas (às vezes, minutos) e alguém se encarregará de apresenta-lo ao mundo virtual, aos amigos reais, aos amigos de amigos, conhecidos e estranhos que estranhamente (e aqui cabe o plenonasmo) estão aguardando para conhecer a face da nova vida que chegou ao mundo. Muitas vezes, sequer os pais são conhecidos. Nunca os abraçamos. Não trocamos palavras, não compartilhamos momentos.

Venho percebendo que prestar satisfação sobre tudo tem sido uma conta cobrada e cara para algumas pessoas. Nos avisam se está tudo bem, se não está, se alguém nasceu, partiu... se o emprego vai bem, se a dieta está em dia, o que se faz na companhia de amigos. Por vezes, é até cansativo acompanhar em tempo real as vidas das pessoas que circulam por nossas telas. Tenho às vezes a sensação de que muitas pessoas fazem coisas apenas para dizer que fizeram. Para que terceiros saibam que foram feitas. Vivem no piloto automático, na ânsia de cumprir o roteiro e mostrar para os demais que o cronograma está sendo cumprido. Não sei se vivem tão bem cada momento, quando cada imagem por vezes denota personagens afoitos por provarem que fazem cada vez mais coisas legais.

 Às vezes, mesmo que o seu acesso às redes sociais seja muito limitado, se participar de alguma rede social, provavelmente tem conhecimento sobre o paradeiro de muitos conhecidos, de pessoas com as quais pouco trocou palavras na vida. Sabe o que comeram no almoço, a marca do vinho que bebem, as roupas preferidas, os lugares por onde passaram, as principais paisagens avistadas. Se bobear, aproximando alguma imagem, se informa até sobre número de voo e as poltronas em que sentaram-se no avião. Tudo isso, sem esforço algum. Hoje em dia, sabemos de pessoas sem precisarmos conquistar sua confiança, sem conversas longas por telefone para que saibamos o que têm feito e quando percebemos que elas sumiram - das redes – supomos porque será.

A vida multitarefas demanda de você o pensamento acelerado e distribuído nas muitas distrações mentais que demandam nosso pensar contínuo. Hoje em dia, depois que a pandemia deu as caras e chacoalhou as nossas vidas, é ainda mais intensa a interação virtual. E ainda mais cansativa. Mesmo assim, frente à necessidade de afastamento social, não posso imaginar como seria se não pudéssemos ver e saber das pessoas por algum outro canal que não fossem as visitas, os abraços e as conversas.

Aflijo-me em imaginar em como as famílias se conectavam antigamente em meio a pandemias e guerras. Como faziam as pessoas sem que pudessem ver os semblantes dos entes amados frente a uma imposição de isolamento. Como trocavam notícias, informações e cuidados à distância se não tinham a tecnologia como aliados. Basta imaginarmos vivermos esses últimos meses sem proximidade com as pessoas sem o milagre da comunicação. Inimaginável.

Graças à tecnologia, conseguimos proximidade com as pessoas, abraços ainda que virtuais no dia do aniversário. Podemos compartilhar o dia, o que fazemos com aqueles que nos importam. Podemos por vezes trabalhar sem sair de casa, aliviar as saudades em um clique, rever nossos familiares e amigos que estão por aí, no mundo. Nesses meses de confinamento, percebi que temos em mãos ferramentas poderosas sem as quais seria difícil vivermos. São as dores e as delícias desse mundo novo. E viva a tecnologia!

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Paula é uma jovem friburguense, advogada, escritora e apaixonada desde sempre pela arte de escrever e o mundo dos livros. Ama família, flores e café e tem um olhar otimista voltado para o ser humano e suas relações, prerrogativas e experiências.

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