Quarentena

Paula Farsoun

Com a palavra...

Paula é uma jovem friburguense, advogada, escritora e apaixonada desde sempre pela arte de escrever e o mundo dos livros. Ama família, flores e café e tem um olhar otimista voltado para o ser humano e suas relações, prerrogativas e experiências.

sexta-feira, 03 de abril de 2020

Este não é um “texto cabeça”. Definitivamente não é. Mas poderia ser. Está difícil dissociarmos nossa existência nesses dias da crise abissal enfrentada pela humanidade. Quem está tendo oportunidade de aprofundar suas reflexões com o coração aberto para o aprendizado, quem está fortalecido o bastante para encarar os perigos reais de frente e quem tem amor pelo próximo suficiente para pensar em ser útil uma hora dessas, provavelmente está crescendo e muito.

Tenho lido muitos comentários nas redes sociais finalizados pela hastag “vai planeta”. E essa expressão tem me remetido a uma sensação de esperança. Será que todas essas pessoas que fazem uso dela estão deveras apostando suas fichas na pandemia provocada pelo novo coronavírus como instrumento para nossa melhora enquanto humanidade? Será que elas têm razão? Seria possível sairmos melhores do caos? Todas as crises advindas serão mesmo presságios de bons acontecimentos?

Há momentos em que nos vemos em um beco em saída. Olhamos para um horizonte escuro e procuramos pelo sinal de luz. E por vezes, não o encontramos. Desesperamo-nos, pois estamos acostumados a esbanjar feixes de claridade por aí. Mas a realidade nua e crua nos mostra a escassez, nos revela que da noite para o dia, muitas coisas podem mudar drasticamente. Estamos preparados para encarar essa verdade?

Sinto estarmos vivendo um estado de profundas transformações e esforço-me para resgatar em meu arcabouço sentimental, as melhores ferramentas para verdadeiramente crer que serão para melhor, de alguma maneira. Fácil não está sendo. A “quarentena” mundial está fazendo doer a saúde, o coração, a saudade, o bolso, a paz, a fraternidade, a família, a fé.

O que estamos enfrentando, todos juntos, provoca as mais sensíveis dores e ouso dizer que de alguma delas, ninguém escapa. Não sei vocês, mas eu ando confusa até mesmo em relação aos métodos criados por nós para “tentarmos fazer o tempo passar”, para “aproveitarmos melhor o tempo em casa”, “para descansar nesses dias de isolamento”. Parece difícil de engolir. Não estamos todos imbuídos em simplesmente fazer o tempo passar. Não temos o que aproveitar. Ou temos?

Enquanto estamos confabulando sobre essas, hoje, superficialidades, tem gente morrendo, tem gente sofrendo, tem uma infinidade de pessoas preocupadas, angustiadas, apavoradas. Gente sem trabalho, gente passando fome. Há solidão, pobreza e falta de ar. O mundo não é o umbigo de quem está malhando em casa e escolhendo qual o cômodo de sua mansão confortável irá ostentar no próximo post.

Quando bravateamos a receita do prato maravilhoso, o ar puro respirado no quintal frondoso, os passeios ao ar livre sem ninguém no meio do caminho ou o trabalho em home office, podemos de alguma maneira estar afrontando aos que continuam dependendo dos transportes coletivos aglomerados para trabalhar, aos que estão na linha de frente nos serviços essenciais, aos que estão desesperados nos hospitais, aos familiares que estão rezando incessantemente pela cura de um ente querido contaminado.

Enquanto uns e outros investem todo seu tempo discutindo política de forma leviana e cega, que se recusam a pensar fora da caixa e a enxergar o mundo para além de si próprios, há outros milhares morrendo pela omissão e pelos erros de alguns outros que estão no poder. Tudo isso é muito duro de encarar. Acabamos por perceber, na doença e na tristeza, quem são as pessoas com quem não queremos manter relação depois, simplesmente porque não conseguem se conectar senão com suas próprias mazelas. Que ignoram as dores dos outros. Que desconhecem da empatia ou a usam em proveito próprio. Que jogam com interesses, esperanças, necessidades dos outros.

Está difícil crer em dias melhores. Mas eles chegarão. O tempo passará de qualquer maneira e quem sobreviver, poderá tentar retomar a vida e tomara que em outro patamar.

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Paula é uma jovem friburguense, advogada, escritora e apaixonada desde sempre pela arte de escrever e o mundo dos livros. Ama família, flores e café e tem um olhar otimista voltado para o ser humano e suas relações, prerrogativas e experiências.

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