Não quando é não

Paula Farsoun

Com a palavra...

Paula é uma jovem friburguense, advogada, escritora e apaixonada desde sempre pela arte de escrever e o mundo dos livros. Ama família, flores e café e tem um olhar otimista voltado para o ser humano e suas relações, prerrogativas e experiências.

sábado, 10 de junho de 2023

Começo a coluna desta semana com uma citação atribuída ao escritor colombiano vencedor do Prêmio Nobel de Literatura, Gabriel García Márquez: “O mais importante que aprendi a fazer depois dos 40 anos foi a dizer não quando é não.” Baita aprendizado. Dizer um “não” dói em muita gente Há quem sofra a ponto de não conseguir fazê-lo. Há quem diga “sim” para tudo e todos, se gastando por inteiro e fazendo pouco das migalhas de tempo e energia que sobram para si.

Quem não impõe limites, não conhece as próprias vontades e não aprende a priorizar e selecionar, provavelmente está sempre envolto pela sensação de não ter tempo. E aí o ciclo se vai. E se esvai. Falta energia. Parecem as próprias escolhas. Para cada tarefa nova assumida, um sonoro “não” é ouvido intimamente. Quem sofre de não saber dizer “não”, sabe o peso gerado pelo acúmulo de afazeres assumidos.

Refiro-me àqueles que estão sobrecarregados justamente por não conseguirem respeitar seus limites e assumirem menos do que o mundo exterior demanda deles. Desde as pequenas coisas às grandiosas. Desde futilidades às funções elementares.

Um dia, a vida ensina que a cada “não” sentenciado, podem ser abertas portas para inúmeros “sim”. Sim, a vida é feita de escolhas sob muitos aspectos, e aprender a escolher, a aprender a impor limites, a respeitar sua própria capacidade, inclusive de discernir o que deve e o que não deve, o que pode e o que não pode, o que quer e o que não quer, é mesmo um tremendo e precioso aprendizado.

Para além daquelas coisas que só aprendemos com a preciosa maturidade, com o passar do tempo e as pancadas da vida, tenho por certo que o autoconhecimento ajuda bastante nesse processo. Há “nãos” na vida que não podem ser ditos. Isso é um fato. Porém, há muitos outros que são frutos de escolhas que tomamos sem reflexão alguma. Que dizemos “sim” sem pensarmos.

É preciso refletirmos sobre o que se deve fazer por obrigação de trabalho. O que se deve fazer por amor. O que se deve fazer por missão de civilidade. O que fazer por prazer. Ou por necessidade. Ou pelo querer. Ou por responsabilidade. Ou por compromisso. Ou fazer por fazer. E o que é excesso. Separar o joio do trigo. É bom que o movimento seja cauteloso, porque não duvido que a conclusão a que podemos chegar é deveras angustiante: a de que muito do que fazemos a cada dia pode ser excessivamente oneroso para nossas próprias vidas.

A sobrecarga, o peso, o arrependimento, a culpa pela imperfeição, o acúmulo de tarefas, a falta de tempo são consequências dessa incapacidade de delimitar limites, e aqui me permito a redundância das palavras. Ao aprender, finalmente, a dizer necessários “nãos” para certas coisas, podemos conseguir nos cuidar mais, amar mais nosso ofício, destinar mais tempo à família, fazer as tarefas com mais paz e a viver com maior qualidade de vida. O tal tempo de qualidade, é verdade. O tão desejado...

Por vezes, é dizendo “não” aos excessos de tudo e às demandas infinitas que estamos escolhendo vivenciar o “sim” para nós mesmos.

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Paula Farsoun

Com a palavra...

Paula é uma jovem friburguense, advogada, escritora e apaixonada desde sempre pela arte de escrever e o mundo dos livros. Ama família, flores e café e tem um olhar otimista voltado para o ser humano e suas relações, prerrogativas e experiências.

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