Café com nostalgia

Wanderson Nogueira

Observatório

Jornalista, cronista, comentarista esportivo, já foi vereador e deputado. Ufa! Com um currículo louvável, o vascaíno Wanderson Nogueira atua com garra no time de A VOZ DA SERRA em Observatório, sua coluna às terças e quintas.

sábado, 17 de abril de 2021

Lembro de minha mãe fazendo café no coador. Aqueles de pano colocado em uma armação de metal com uma base de madeira com azulejo colado e aparentemente pintado à mão. Talvez minha memória infantil esteja falhando ou inventando desenhos que sequer existiam. O que sei é que o gosto do café ficava ainda melhor conforme o pano que coava ia ficando ainda mais surrado.

A mania materna de fazer café assim, todas as manhãs e fins de tarde, é herança de minha avó. Ela fazia café com os grãos colhidos e secados por meu avô. Tinha gosto do trabalho suado e do tempo que o serviço levava. 

Meu avô plantava, cultivava, colhia do pé, peneirava, usava pilão. Tudo feito à mão por quem tinha poucos recursos para fazer de forma mais prática. 

Tudo em família, até a água fervente passar pelo coador e chegar às pequenas canecas metálicas de diversas cores. Elas tinham uma parte de tinta quebrada que revelava o metal por baixo. Tinha certo charme. 

Atualmente, vendem essas xícaras em cores diversas, vermelha, brancas, azuis e imagino, igualmente, com o pedaço faltando tinta. Chego a me perguntar se as de minha avó já eram compradas com essa característica… 

Todos os dias somos convidados a beber um café para relembrar histórias, traçar planos ou apenas jogar conversa fora. Não que relembrar momentos ou negociar futuro não seja também jogar conversa fora. 

Dias desses, fui beber um café com uma pessoa bastante íntima. Ela pediu café na prensa. “Na prensa francesa. Ah! Por favor, com aquele grão arábica bourbon”. Está tudo tão gourmetizado, ultimamente. Eu pedi apenas um velho e bom capuccino. 

Veio aquela chaleira ou prensa que depois vim a saber que nem francesa é. Sem coador, sem nada. Grãos mais grossos, água e até temporizador. Um luxo italiano que outros dirão francês e eu resumiria como humano. 

Seja como for, entre uma fofoca (ops), entre uma atualização e outra sobre a vida alheia, abandonei o capuccino e pedi um expresso até me render ao pedido da companhia, a tal prensa suíça, italiana, francesa, internacional... 

O café está presente nesses encontros que fazemos com os outros e com a gente mesmo. É parte da nossa cultura, não só gastronômica, mas social. E mais do que açúcar ou adoçante ou mesmo puro, seu maior tempero é a conversa sobre qualquer assunto que vira nostalgia ou nostalgia da própria conversa nostálgica. Lembranças doces e amargas, mas em um amargo que é bom até para quem não gosta de café amargo.   

Café e o que vem com ele é assim meio Manoel de Barros: faz da mesa quintal e esse quintal é maior do que o mundo. Abdica do tim-tim, pois é brinde que se faz pelo simples convite de se tomar junto. Não precisa de piquenique, ainda que caia bem com pão com manteiga. Mas até o pão de queijo é dispensável quando se bebe em boa companhia. E que a melhor companhia seja, antes de tudo e depois do café, você mesmo! 

 

Foto da galeria
(Pexels/Magali Guimarães)
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