Um diamante que está deixando de brilhar

Tereza Malcher

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

segunda-feira, 23 de maio de 2022

Um debate no Clube Leitura Vivências me despertou para as festas juninas. O que está acontecendo com elas? Eu me perguntava na medida em que me reportava à infância e delas me recordava através de saudosas lembranças. Conforme ia pesquisando e desvelando o tema, reencontrei um diamante que está deixando de brilhar.

Cada vez mais raras, essas folclóricas e populares comemorações estão ficando no passado, dando espaço para as eletrônicas e suas brincadeiras substituídas por troca de mensagens nos celulares. São tais transformações, como tantas outras, que fizeram com que Ferreira Gullar deixasse de se espantar e poetar.

Extraviei-me no tempo

Onde estão meus pedaços?

                                           (“Extravio”, Ferreira Gullar)

***

E vai findando maio, num rápido passar dos dias. E vem chegando junho, tempo festeiro e gostoso de viver! Do dia 13 a 29, o mês fica movimentado pelas comemorações dos santos populares, Antônio, dia 13, João, dia 24, e Pedro, dia 29. É um tempo enfeitado pela alegre criatividade com que se organizam e realizam os “arraiás”. Desde os preparativos até as comemorações, a literatura, especialmente a infantil e a poesia contida nas letras das músicas juninas, dá um toque lúdico, através de delicadas e cuidadas palavras que contam o acontecer das festas, também enriquecidas pelas danças, brincadeiras, balões e roupas. E, principalmente, pelo divertido encontro entre pessoas de todas as idades e culturas.

“Capelinha de Melão 

é de São João.

É de cravo, é de rosa, é de manjericão”.

                           (“Capelinha de Melão”, de João de Barro e Adalberto Ribeiro)

 

As festas vêm de longe. Há muitos e muitos anos, surgiram no tempo em que as bruxas, os duendes e as fadas andavam pelos campos e repousavam nas raízes das árvores, lá no hemisfério norte, na passagem da primavera para o verão. Nesse dia, o mais longo do ano, 24 de junho, as pessoas se reuniam para celebrar a fertilidade da terra e desejar boas colheitas dos cereis plantados, como o milho. Esses eventos aconteciam em torno da fogueira, símbolo característico dos festejos, que protegia as terras dos maus espíritos que atrapalhavam a prosperidade das plantações.

Quando olhei a terra ardendo

Qual fogueira de São João

Eu perguntei a Deus do céu, ai

Por que tamanha judiação”

           (“Asa Branca” de Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga)

 

As festas, carregadas de simbolismos, nasceram nas culturas populares de regiões de vários países e mostram as crenças dos povos. Como tudo se mistura nas comemorações juninas, as festas são ricas de significados. As quadrilhas, por exemplo, eram comuns nos salões franceses, ou “quadrille”, porém tiveram sua origem nas tradicionais festas dos camponeses ingleses. O vestuário das moças, lindos vestidos armados, rodados e enfeitados, representam a riqueza da corte francesa. Os passos sempre puxados por expressões, alguns traduzidos do francês, como “para trás” (anarrié) e “para frente” (avancer).

“Pra dançar quadrilha no sertão é mais mió

sanfoneiro e violeiro tomam conta do forró

não precisa de orquestra pra animar a festa

o fungado da sanfona vai-se até o nascer do sol”

(“Piriri”, de Luiz Gonzaga)

 

Para o catolicismo se consolidar como a principal religião do continente europeu, as comemorações juninas foram incluídas em seu calendário para melhor conversão dos povos pagãos. Tempos depois, já populares na Península Ibérica (Portugal e Espanha), foram trazidas para o Brasil durante a colonização.

 

Cai, cai balão

Aqui na minha mão

Não cai não, não cai não, não cai não

Cai na rua do sabão

                             (“Cai, cai, balão” de Assis Valente)

 

Obs: O solstício é um evento astronômico. Sendo a Terra dividida em dois hemisférios, norte e sul, o solstício de verão ocorre quando um desses hemisférios está o máximo possível voltado ao sol e recebe a maior incidência de raios solares, ficando, portanto, mais aquecido e fazendo o dia o mais longo do ano. O solstício de inverno ocorre simultaneamente no outro hemisfério, que recebe os raios solares com menor intensidade, ficando menos aquecido e sendo o dia mais curto do ano. Os solstícios de verão e de inverno marcam o início das respectivas estações do ano em cada hemisfério.

 

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Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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