Será que somos civilizados?

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

Neste início de ano, em plena pandemia e entre tantos acontecimentos,
também por estar estressada e triste, quis aprofundar meus laços afetivos e
literários com os animais. Logo, na primeira semana, adotei uma cachorrinha
abandonada na estrada. Como me fez bem cuidar dela, tive a sensação de
estar resgatando o mundo dos seus males. Duas semanas depois, foi um
encantamento por um cavalo que vive sozinho num terreno. Que vontade estou
tendo de trazê-lo para casa e fazê-lo feliz.
Dedico esta coluna aos animais também por querer conhecê-los mais e
entender um pouco melhor meus sentimentos. Ao escrever, vou pesquisar e
avaliar minhas sensações a respeito deles; a literatura sempre oferece meios
para que possamos ampliar nossos conhecimentos e sentidos de vida.
O primeiro livro que abracei foi o de Silvia Othof, Os Bichos que Tive,
editora Salamandra, 18ª. edição, em que a autora relata sua relação com os
animais quando criança. Nas primeiras páginas, perguntas me invadiram: por
que as crianças estabelecem uma relação de afeto tão plena com os animais e
de tamanha beleza? Por que alguns adultos não percebem o modo como os
animais vivem, o que sentem e de que forma olham para a vida? Ah, os
animais têm uma percepção que não temos. Às vezes, penso que são anjos
que vêm à Terra buscar aprimoramento e cuidar de outros seres, como nós.
Lendo Sylvia, eu me dei conta de que os animais, ao participarem do
processo de formação do ser humano, oferecem importantes contribuições. A
criança que convive com animais tem algo de diferente das que não convivem.
Eles são companheiros e tanto podem nos ensinar, posto que possuem
especial sabedoria que exigem de nós acuidade mental para que possamos
perceber intenções significativas às nossas necessidades em suas atitudes e
reações. Quando meu marido infartou, o olhar da minha cachorra Vênus
brilhava de modo diferente, reluzia. Ela sentiu, antes de todos nós, que a saúde
dele estava correndo riscos. O cavalo, ao perceber que eu estava estressada e
de luto pelo meu filho que faria aniversário se aqui estivesse e por uma amiga
de infância que partiu, aproximou-se, levantou sua cabeça sobre o arame

farpado e encostou seu focinho em mim. O que me fez tão bem, trouxe-me
afeto e alegria. Beto adorava animais!
A belíssima história de Beleza Negra, clássico da literatura inglesa, escrito
por Anne Sewel, publicado em 1877, livro que esteve na estante da casa da
mamãe enquanto minha irmã e eu éramos crianças. Como a leitura me tocou!
É um relato autobiográfico de um cavalo que sofre inúmeras crueldades ao
longo de sua vida. O pior que, infelizmente, a história é, hoje, vivida por cavalos
em todos os cantos do mundo. Vou até relê-lo para me tornar mais humana.
Outra obra que busquei foi a de Lygia Bojunga, Os Colegas, 48ª. edição,
editado pela José Olympio, que conta a história de cachorros de rua, Virinha,
Latinha, Flor, Voz de Cristal que vivem num terreno baldio, ao lado de um
coelho e outros animais. A história me remete aos cachorros que andam em
bandos pelas ruas e campos, suas difíceis vidas, brincadeiras e rivalidades.
Eles têm uma vida socialmente silenciosa, pouco considerada por nós, seres
civilizados. Mas será que somos mesmo?
Por último, “fui acolhida” pelo Angel Dogs: Anjos de Quatro Patas, de
Allen e Linda Anderson, editado pela Giz Editorial, em 2008. É um livro que
mostra que os cachorros não são apenas companheiros, mas guias espirituais.
Acho muito difícil trazer o cavalo para minha casa, mas vou estar atenta a
ele, pronta para compartilhar afeto. A cachorrinha e o cavalo trouxeram vida ao
meu mês de janeiro. Que bom!

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Tereza Cristina Malcher Campitelli

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Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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