Saber perder o tempo e achá-lo com outras cores e formas

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

terça-feira, 11 de julho de 2023

Os amantes usam o tempo para sentirem o prazer de gostar de estar com o outro e, às vezes, são momentos tão agradáveis que parecem eternos. Cecília Meireles, certa vez, poetou “Eu canto porque o instante existe e aminha vida está completa.” A sensação de bem-estar nos invade com ternura, como um véu que nos faz sentir embevecimento por aquilo que estamos fazendo. É possível que nos traga a sensação de que a vida em torno deixa de existir e o mundo de se movimentar.  O prazer é o presente que se faz presente como um presente que nos ofertamos ou que nos é oferecido com bondade e sem parcimônias. Há, por certo, uma magia que nos sopra suavidades.

Sócrates, condenado à morte por ser acusado de corromper a juventude e com poucos dias de vida, pediu a um professor que lhe ensinasse a tocar flauta. Ante o espanto do músico, ele argumentou que queria aprender o instrumento apenas para ter o prazer de tocá-lo, de dar serenidade e alegria ao seu espírito naqueles momentos finais.

Quem é amante da leitura encontra a delicada satisfação em mergulhar num texto do seu gosto, que seja um jornal, carta ou um conto despretensioso. Ler é um modo de configurar o tempo com a apreensão de ideias, utilizando a energia que emana fluida do corpo e da mente, bem diferente daquela carregada de responsabilidades e prazos, que tão bem conhecemos no dia a dia. 

Ler é um hábito de inserir a leitura nos momentos em que o olhar vagueia no céu entre as nuvens e dança com o tiquetaquear do relógio. Eu me relaxo antes de dormir lendo trechos de um livro a mim disponível na cabeceira e, mesmo cansada e pestanejando, avanço alguns trechos na história. É um momento noveleiro em que o livro acaba sendo absorvido em capítulos, além de ser um modo erudito de chamar os sonhos e as fantasias que habitam meu sono. Confesso que não é incomum sonhar com o que li. Chego até a visualizar os personagens e cenários, desejar estar entre as linhas à espera de novos acontecimentos, tomada por um suspense transitório e não comprometido com os da vida real.

A leitura prazerosa tem um jeito amistoso de nos abraçar que nos faz pausar, não deixando de ser um passaporte para relaxar as pernas e sossegar as preocupações diárias. Além de tudo, um leitor com mais idade sempre dá exemplo aos mais jovens. Inclusive a formação do hábito de ler é alimentado pelo exemplo, uma influência silenciosa e eficaz. 

Durante o tempo dedicado ao prazer, só há vantagens em compartilhar a leitura com outras atividades. E, cá para nós, perder o tempo e achá-lo com outras cores e formas não é melhor do que coçar o dedão do pé?  

 

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Tereza Cristina Malcher Campitelli

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Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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