Personagens mensageiros

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

terça-feira, 18 de junho de 2024

O mensageiro exerce uma função nobre de levar algo de um lugar a outro, com a finalidade de transmitir recados, informações, quiçá segredos ou códigos. Cá entre nós, o mensageiro é transparente, sem forma nem tamanho posto que o importante é o conteúdo que transporta em seu interior ou em seus envelopes. Posso até me arriscar a dizer que ele é responsável pelo intercâmbio dos saberes que transformam o mundo.

Quem nunca se utilizou de um mensageiro? Ora pois, esse agente mediador possui antiguidade, surgiu nas primeiras comunidades humanas. Tornou-se profissional na antiga Pérsia.

No universo literário, os personagens são mensageiros do autor, que encontra nas histórias um meio de transportar para o mundo as ideias que transbordam pelos seus poros e agitam o sangue em suas veias. Não há histórias sem personagens. Sim. São as ideias, os sentimentos e as ações dos personagens que fazem o acontecer dos enredos, universos imaginados com inteligência e criatividade, delimitados e carregados de sentidos.

O escritor toca o leitor de modo especial através do seu imaginário, materializado pela vida de cada um de seus personagens. Os leitores escolhem personagens que iluminam sua vida. Para mim, o “O Pequeno Príncipe,” criado por Saint-Exupéry, faz-se presente durante meu processo de escrita, como agora, em que os valores contidos na sua obra influenciam minhas ideias. Para muitos, é um livro como outro qualquer, como já me disseram. Mas me é único pelas mensagens enviadas através da rosa, do geógrafo ou da raposa.

O mais interessante é que os leitores podem se perceber em cada personagem. Pelo princípio da verossimilhança, emergem da realidade: são captados e interpretados pelo escritor. O autor, tal qual o leitor, é sujeito e está sujeitado às circunstâncias da realidade. 

Não passamos pela vida como imagens refletidas. O que vivemos é registrado e guardado na memória. Somos, dia a dia, resultado das experiências que tivemos. Assim como nós, os personagens guardam identidade, história e caráter. Não são bonecos de pano nem bolas de pingue-pongue, e sim, entidades que nos surgem espontaneamente e gritam dentro de nós para que ganhem vida nas histórias que vamos contar.

A cada conto, poesia, romance, matéria jornalística há mensagens para se refletir. O escritor não escreve à toa. Sua intenção é expor seus meandros que não suportam silêncios. Para cantar seus gritos eufóricos. Contorce-se através das suas palavras. E seus personagens, divinos ou vítimas das suas insaciedades, não dizem o que querem.

As estantes das bibliotecas são verdadeiras coxias, onde os personagens, com as capas fechadas, como a Sherazade, ensaiam a história que vão contar. Acredite: os livros são falantes.

Publicidade
TAGS:

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.