Olha a chuva!

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

Ora pois, não é que há sempre há motivos para escrever? Que podem nascer nas costas que coçam, no sono que não vem, até no bater do martelo que chega aos ouvidos sem harmonia. Hoje, por me aquietar em casa, por ontem tanto abrir o guarda-chuva, correr para não me molhar e me assustar, vou olhar para a natureza. 

Não repentinamente a vontade de escrever sobre as águas que vêm do alto cresceu em meus pensamentos, tão ávidos de sugestões. Para falar da chuva, que rega a terra e revigora a vida, vou buscar inspiração em Fernando Pessoa, o mestre da literatura, que bem fazia suas ideias escorrerem sobre o papel, através de palavras que nos tocam, tais quais os dias de chuva e de sol.

“Um dia de chuva é tão belo como um dia de sol./ Ambos existem, cada um como é.” (Poemas Inconjuntos)

A chuva nunca nos pega desprevenidos, avisa com nuvens carregadas, com o barulho dos trovões que tocam como os tambores das orquestras e o brilho dos raios que rasgam os horizontes com energia.

“Cai chuva do céu cinzento/Que não tem razão de ser. /Até meu pensamento/ Tem chuva nele a escorrer.” (Cai Chuva do Céu Cinzento)

Intensa e forte, a água faz uma cortina na minha varanda. É incansável e ruidosa, como se quisesse falar da coragem que tem para sobreviver milhares de anos através de ciclos contínuos. A natureza é inteligente a ponto de fazer com que nos chega de chuva, depois de penetrar no solo, ressurja em nascentes, capaz de refletir, em agitados espelhos, o sol, a lua e a luz artificial. 

A chuva é divina, inspira a arte, o amor, o descanso. Em Friburgo, chove e chove; a vida fica mais lenta. Úmida. Chove devagar, molhando a rua com pingos irreverentes que descem pelo nariz e caem sobre os pés. Sem pedir licença, escorrem pelos sapatos e se misturam a tantos outros em poças de lama, que ficam quietos até evaporarem, subirem encantados para as nuvens. Aos poucos, vão caindo, retornando ao solo. Tudo na mais perfeita rotina, até o tempo envelhecer.

“Sofremos? Os versos pecam. / Mentimos? Os versos falham. / E tudo é chuvas que orvalham/ Folhas caídas que secam.” (Às Vezes Entre a Tormenta)

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Tereza Cristina Malcher Campitelli

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Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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