O grande encontro

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

São raros os momentos na vida em que nos deparados com a verdade,
em que sentimos que somos invadidos pela constatação de fatos, que, muitas
vezes e naturalmente, negamos reconhecê-los como realidades presentes em
nossa história de vida. Um desses raros momentos é o da morte. Ninguém
consegue mentir na hora de findar.
A maioria das pessoas, como eu, não gosta de pensar nesta última etapa
da vida, nos minutos finais. A médica Ana Claudia Quintana Arantes, autora do
livro “A morte é um dia que vale a pena viver”, editado pela Casa da Palavra,
em 2016, através de uma escrita leve e cativante, por incrível que pareça,
coloca-nos frente a frente com a premissa: a única certeza de que temos na
vida é que vamos morrer um dia. Com vasta experiência e estudiosa em
Cuidados Paliativos, prática da medicina que, segundo a Organização Mundial
de Saúde, consiste na assistência promovida por uma equipe multidisciplinar
que objetiva a melhora da qualidade de vida de pacientes e de seus familiares
diante de uma doença que ameace a vida, por meio da prevenção e do alívio
do sofrimento.
Ah, a literatura nos salva durante a vida, do nascer ao morrer. Esse livro
tem me mostrado que estar preparado para o derradeiro momento é um modo
de findar com dignidade. Ler, pensar, falar e escrever a respeito é um ato de
coragem e de amor a si. Não é um gesto de autoconsolo, mas um modo
amadurecido de refletir sobre a vida, ou seja, uma avaliação sobre as decisões
que tomamos e como as realizamos. A vida é única. O tempo passa e não
retorna. Cada dia acordamos para um dia diferente. O modo como vamos
morrer será a síntese de tudo o que vivemos.


Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte disso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

(Poema Tabacaria de Álvaro de Campos – Fernando Pessoa)

Nosso poeta, através do seu heterônimo, revela a essência da existência
humana na primeira estrofe de “Tabacaria”: somos seres em permanente
realização.
Na proximidade da morte, as dimensões espiritual e emocional dominam
a consciência. É o grande encontro. Não é um momento de abandono, nem de
deterioração. Mas de cura.
Quando partimos deixamos nossas gavetas cheias. Não levamos malas
carregadas de materialidades. Neste momento, podemos nos tornar heróis
quando temos a possibilidade de perceber grandezas: a nossa, a do outro e a
da natureza.
A literatura ao nos oferecer a possibilidade de compreender o processo
de morte com sabedoria, nos abre os olhos para lidar com a vida de modo
diferente, para observar o que nossas decisões têm nos oferecido e para
constatar o que temos possibilidades de ser e de fazer.

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Tereza Cristina Malcher Campitelli

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Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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