Notícias de Nova Friburgo e Região Serrana
Ganhar para não fazer nada
Robério Canto
Escrevivendo
No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.
Morimoto adianta que não faz sexo, não carrega peso, não discute
Estava escrito no mural: “O trabalho enobrece o homem”. Alguém, mais realista, ou mais pessimista, corrigiu por cima: “emagrece”. São duas maneiras de se encarar a questão, cada uma delas deve ter algum fundamento, que pouca coisa neste mundo ─ provavelmente nada neste mundo ─ é absolutamente preto ou branco (basta olhar a cara dos brasileiros!).
Não sei se o leitor acha que o trabalho enobrece ou emagrece. No geral, ele enriquece alguns poucos e deixa a grande maioria a contar os centavos para pagar as contas no fim do mês. Muitos são os que conseguem apenas (se tanto!) pagar a conta (no singular), porque não é fácil acertar tudo de uma tacada só: numa vez paga-se a luz, na outra paga-se a água, na outra compra-se o gás, e assim vai-se levando a vida, até que chegue a morte ou coisa parecida, como dizia o cantor Belchior.
Há trabalhos que, além de pouco reconhecidos, são pesados e mal pagos. Cansa! Quem não gostaria de encontrar uma moleza, um desses empregos em que, em câmaras e palácios, servidores do povo, de terno e gravata, tribunas e assessores e cafezinhos, definem quando e quanto trabalharão, quando e quanto receberão pelo trabalho que fizerem ou mesmo que não fizerem?
Mas em matéria de ganhar dinheiro sem fazer força, ninguém supera o cidadão japonês Shoji Morimoto. Ele mesmo define sua ocupação profissional como “comer, beber e dar respostas simples”. Qual é a mágica que esse sábio nipônico faz para viver bem, sustentar mulher e filho, sem fazer nada? Segundo a Agência Reuters de Notícias, Morimoto se oferece para acompanhar. E daí? Não tem daí nenhum. Sua função é apenas acompanhar pessoas que se disponham a lhe pagar R$ 367,00 para tê-lo ao lado delas por um dia.
Morimoto adianta que não faz sexo, não carrega peso, não discute. Apenas acompanha. Não é muito, mas não lhe faltam fregueses, e ele costuma fazer ao menos dois acompanhamentos por dia. Pode ser que essa profissão seja uma particularidade de países como o Japão, que, tendo gente demais, acaba fazendo com que muitos vivam na solidão. E aí, achar alguém que aceite andar conosco, sem perguntar aonde vamos ou o que vamos fazer, sem dar opinião contra ou a favor de qualquer coisa, é uma bênção dos céus. Quer você chore, quer você dance, quer simplesmente você sente num banco de praça e fique jogando milho aos pombos, o acompanhante está ao seu lado, solidário e inútil.
Como sabe o douto leitor, trabalho vem do latim tripalium, e designava um instrumento de três pontas usado para imobilizar animais a serem ferrados. Como os escravos eram considerados pouco mais ou pouco menos do que os animais, para castigá-los ou fazê-los trabalhar, passou-se a usar o tripalium. Daí que tripalium e trabalho logo tornaram-se sinônimos. É mais ou menos isso, talvez eu tenha distorcido um pouco, não me levem a mal nem me levem a sério.
Um filósofo concluiu que “todo trabalho supõe tendência para um fim e esforço”. Shoji Morimoto descobriu um meio de atingir um fim sem fazer esforço. Realmente, temos que reconhecer a superior inteligência nipônica, que até sem fazer nada consegue ganhar dinheiro.
Robério Canto
Escrevivendo
No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.
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