Esperando a Copa do Mundo

Robério Canto

Escrevivendo

No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.

terça-feira, 15 de novembro de 2022

Este país tão grande e tão perdido em sua própria grandeza

Tem gente que gosta de futebol, tem gente que odeia. O escritor argentino Jorge Luís Borges, tido como um dos grandes da literatura mundial, disse numa entrevista considerar o futebol um “esporte estúpido”. Sobre a Copa do Mundo em seu país, classificou o evento como “uma calamidade” que “felizmente vai passar” e aproveitou para fazer uma palestra justamente na hora da abertura da competição (auditório lotado). Já Nélson Rodrigues, desde “Vestido de Noiva,” considerado o mais importante dramaturgo brasileiro, era tricolor apaixonado e considerava que “o escrete é a pátria de chuteiras” (naquela época a seleção era chamada de escrete e não disputava partidas, desfilava em campo, diante dos adversários). O “Anjo Pornográfico”, como o chamou Ruy Castro, era, além de teatrólogo, contista, romancista e cronista. Ou seja, se tem intelectual que abomina, tem intelectual que adora esse esporte.

Agora que se aproxima a Copa do Mundo, são poucas as pessoas que conseguem (ou fingem conseguir) ficar alheias ao que vai acontecer no Catar e pouco ligar se vamos ser campeões ou se vamos ser eliminados ainda nas oitavas de final, e logo pela Argentina. E até ouvi um cidadão declarar com orgulho (sem saber que estava parodiando Karl Marx) que torce contra o Brasil porque considera o futebol o ópio do povo... porque os jogadores ganham muito dinheiro... porque não podemos mesmo ser melhores em nada... etc.

 Ora, somos alienados em muitas coisas e pouco ou nada nos revoltamos contra a miséria, a fome, a injustiça e a roubalheira. Desunidos em tantas coisas, o futebol é uma das poucas que ainda nos unem e reúnem. E se o futebol assim nos agrega e congrega, quem sabe não chegará o dia em que, a partir dele, nos tornaremos patrióticos em relação a tudo mais que diga respeito a este país tão grande e tão perdido em sua própria grandeza, país que foi assim cantado no exílio por Vinícius: “Não te direi o nome, pátria minha / Teu nome é pátria amada, é patriazinha”.

Eu sou dos que gostam de futebol, do jeito que considero que vale a pena gostar. Ou seja, torcer sem exagero, se emocionar sem choradeira, comemorar sem perder a compostura e a civilidade. Não xingo a mãe do juiz, nem mesmo quando acho que ele está errado e considero uma total imbecilidade discutir ou brigar por causa de futebol. Torço pelos times do Rio contra os de outros estados, pelas equipes brasileiras contra as de outros países e pela Seleção Canarinho em qualquer circunstância.  No mais, fico contente quando meu time ganha e não fico triste quando ele perde. Mais fair play do que isso não é possível.

Durante quatro copas seguidas, usei uma camisa com a inscrição “Brasil rumo ao hexa”. A camisa desbotou e o Brasil não ganhou. Agora que a joguei fora, por inútil e azarada, pode ser que a vitória venha. Os cronistas esportivos acham que há boas chances. De qualquer forma, estando a seleção em campo, estarei eu na frente da televisão, ansioso para gritar (moderadamente): “É campeão! É hexa! É pátria amada, é patriazinha!

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No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.

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