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Geração bendita. É isso aí bicho! - Última parte

quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

Filme e trilha Cult

A comunidade de hippies Quiabo’s ficou aproximadamente três anos em Nova Friburgo. Drogas como LSD e maconha eram utilizadas pelos hippies, em geral, para ampliar o nível de consciência e proporcionar uma experiência mística. Carlos Doady nos informa que alguém lhe perguntou sobre a utilização de drogas na comunidade Quiabo’s. Ele teria respondido “Raramente!”. “Raramente usavam?”, indagou a pessoa. “Raramente faltava!”, ele respondeu.

Filme e trilha Cult

A comunidade de hippies Quiabo’s ficou aproximadamente três anos em Nova Friburgo. Drogas como LSD e maconha eram utilizadas pelos hippies, em geral, para ampliar o nível de consciência e proporcionar uma experiência mística. Carlos Doady nos informa que alguém lhe perguntou sobre a utilização de drogas na comunidade Quiabo’s. Ele teria respondido “Raramente!”. “Raramente usavam?”, indagou a pessoa. “Raramente faltava!”, ele respondeu.

Poucos meses após a prisão dos hippies, o delegado Rechaid foi transferido da cidade em consequência da repercussão negativa que teve o episódio. Na ocasião, a mídia friburguense se calou conforme nos informa as pesquisadoras Débora Breder e Thamyres Saldanha Martins no artigo “É isso aí, bicho, narrativas sobre o filme Geração Bendita no jornal A Voz da Serra durante a ditadura militar”. O jornalista Pedro Paulo Cúrio, em um artigo intitulado “Na tonga da mironga do cabuletê!” criticou os hippies chamando-os de gang do tóxico, salafrários e apoiava a atuação do delegado Amil Rechaid ao prendê-los e expulsá-los da cidade.

Após esse incidente, as filmagens de “Geração Bendita” foram retomadas em Santo Antônio de Pádua e Itaocara, mas tiveram igualmente problemas com a polícia. Em outubro de 1971, quando o filme foi apresentado a Divisão de Censura de Diversões Públicas, mais de 40 minutos foram censurados, havendo necessidade de rodar outras cenas para substituir os cortes, mas gerou problema de continuidade. Analisando o filme hoje na íntegra, possivelmente foram cortadas as cenas de nudez e de consumo de drogas.

Como novos cortes foram realizados os produtores alteraram o nome do filme de “Geração Bendita” para “É isso aí, bicho!” com o intuito de burlar a censura. Apenas em janeiro de 1973, o filme foi finalmente liberado para exibição nos cinemas. Lembrando que estávamos em plena ditadura militar. Porém, poucos meses depois de exibido o filme foi novamente censurado e as cópias recolhidas de todos os cinemas pela  Divisão de Censura e Diversões Públicas da Polícia Federal.

Karl Kohler e Carlos Doady foram presos e obrigados a assinar um Termo de Confissão no DPOS, a polícia política da época. Expulsos de Nova Friburgo, um grupo da comunidade Quiabo´s foi para Barra do Sana, na serra de Macaé e outro para Visconde de Mauá. Anos depois, o filme foi restaurado por iniciativa de Carlos Doady contando com a colaboração de Osvandil Silveira Quimas e Bruno de Oliveira, com a conversão da película para o formato digital, telecinagem, retoques de coloração, melhoria do áudio e remasterização. Foram resgatadas todas as cenas que haviam sido cortadas, reintegrando-as ao filme.

Uma grande preciosidade de “Geração Bendita” é a trilha sonora da banda Spectrum, composta por integrantes da própria comunidade Quiabo´s e por friburguenses. Segundo Bini, as músicas eram compostas durante as gravações, atendendo às necessidades das cenas e dos personagens. O disco foi lançado no mesmo ano que o filme.

O rock psicodélico do grupo é o estilo musical característico do movimento hippie. Atualmente, o long play em vinil da banda é disputado por colecionadores do mundo inteiro, chegando a valores astronômicos, e ocupa os primeiros lugares nas want lists de raridades psicodélicas. “Geração Bendita” não foi o primeiro filme a abordar a temática da contracultura. “Meteorango Kid, o herói intergaláctico”, lançado em 1969, já havia abordado a temática de uma comunidade hippie.

O filme tem imenso valor por ter documentado o cotidiano de mais uma comunidade hippie no país. E como dito antes, uma trilha sonora de inestimável valor. Um bom trabalho sobre o tema pode ser encontrado na dissertação de mestrado de Igor Fernandes Pinheiro, “Não fale com paredes, contracultura e psicodelia no Brasil”. “Geração Bendita” entrou na lista dos filmes cult, fazendo parte da historiografia do cinema nacional, estando disponível no youtube.

VEJA AQUI A PRIMEIRA PARTE: https://avozdaserra.com.br/colunas/historia-e-memoria/geracao-bendita-e-isso-ai-bicho-parte-1

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    Carlos Bini na direção do filme

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    Uma preciosidade é a trilha sonora da banda Spectrum

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    Cartaz do filme Geração Bendita

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Uma visita a Fazenda de Sant´Anna

quinta-feira, 31 de maio de 2018

Na semana passada visitei pela segunda vez a Fazenda de Sant’Anna, de propriedade de Renato Monnerat. Acompanhava um grupo de suíços que foi visitar a fazenda de seus conterrâneos, os Monnerat e os Lutterbach, que há mais de um século atrás foram seus proprietários. A história da Fazenda de Sant’Anna teve início em 1857, com o médico Augusto de Souza Brandão, o segundo Barão de Cantagalo. Propriedade com 800 alqueires fluminenses, era uma das maiores unidades produção de café do país, e do mundo, em determinado momento.

Na semana passada visitei pela segunda vez a Fazenda de Sant’Anna, de propriedade de Renato Monnerat. Acompanhava um grupo de suíços que foi visitar a fazenda de seus conterrâneos, os Monnerat e os Lutterbach, que há mais de um século atrás foram seus proprietários. A história da Fazenda de Sant’Anna teve início em 1857, com o médico Augusto de Souza Brandão, o segundo Barão de Cantagalo. Propriedade com 800 alqueires fluminenses, era uma das maiores unidades produção de café do país, e do mundo, em determinado momento. O trabalho de seus 1,5 milhão pés de café era realizado por quase três centenas de escravos.

Em Cantagalo, o auge da plantação de café foi entre as décadas de 1840 e 1870, apresentando a partir de então um declínio em todas as fazendas cafeeiras. Terras cansadas, sem adubagem, cafeeiros velhos e improdutivos, era esse o cenário no fim do século 19. Cantagalo padecia igualmente com problemas ambientais que iria se refletir na lavoura. O uso do machado, do fogo e da enxada, a devastação dos morros cobertos de mata virgem para o plantio do café provocou mudanças climáticas, como a irregularidade das estações e menos chuva.

Quando o segundo Barão de Cantagalo faleceu a Fazenda de Sant’Anna estava bem endividada. O seu filho, Augusto Brandão Filho, solicitou empréstimo a José Heggendorn Monnerat para saldar as dívidas da propriedade. Porém, esse se recusou a conceder o empréstimo e arrematou a fazenda em um leilão. O sobrinho e genro de José Monnerat, o coronel Sebastião Monnerat Lutterbach, passou a administrar a propriedade.

Sob a sua gestão, a Fazenda de Sant’Anna além do cultivo de café, passou se dedicar à lavoura branca, a fabricação de farinha de mandioca, fubá de milho, polvilho, rapadura, melado e aguardente em seu engenho com moenda de cana. A fazenda possuía um rebanho bovino leiteiro da raça indiana guzerá, carneiros e suínos da raça inglesa. Toda a produção da fazenda era escoada pelo trem que ficava apenas a quatro quilômetros de sua sede.

A fazenda investiu em uma fábrica de laticínios produzindo manteiga e requeijão com a marca Fazenda de Sant’Anna. O tetraneto de coronel Sebastião Monnerat Lutterbach, Renato Monnerat, adquiriu essa propriedade por razões sentimentais em preito aos seus antepassados. Pouco restou do imenso complexo produtivo e de sua grandeza no passado, mas a fazenda está bem conservada.

A casa de vivenda, em estilo eclético, tem dois pavimentos, e suas fachadas são apoiadas sobre colunas de alvenaria que exibem a base e capitéis que dão ao casarão leveza e elegância. Na composição da varanda, um gradil de ferro batido entremeado por delgadas colunas em ferro fundido sustenta o telhado. As paredes de alvenaria são decoradas com pinturas e afrescos. A sala ainda conserva o papel de parede importado da França bem como a pintura original da barra com motivos florais sobre um fundo imitando madeira.

Já o maquinário de outrora, a exemplo do moedor de milho e do descascador de feijão, está em um Centro de Memória na fazenda criado por seu atual proprietário. Todos estão em pleno funcionamento e foram apresentados ao grupo de suíços que esteve na fazenda. Nessa visita fomos muito bem recebidos com um delicioso almoço cujo prato principal foi feijão tropeiro. O grupo se esfalfou de tanto comer essa iguaria.

Fiquei atenta às perguntas e impressões dos visitantes. Entre todas elas, uma impressão me chamou a atenção, o espanto do grupo com a dimensão da propriedade no século 19. Um deles observou que a Fazenda de Sant’Anna fora maior do que o seu cantão. Nesse momento, abrindo uma janela do passado, pude entender porque os colonos suíços abandonaram seus lotes de terras, em Nova Friburgo, em busca do Eldorado, em Cantagalo.

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    A máquina de descascar feijão faz parte do Memorial da Fazenda de Sant' Ana

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    Feijão tropeiro como prato principal

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    Visita dos suíços à Fazenda de Sant' Ana, em Cantagalo

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