Antonieta de Barros, uma intelectual negra pioneira e atual

Primeira deputada negra eleita no Brasil, criou o Dia do Professor em 1948
sexta-feira, 14 de outubro de 2022
por Jornal A Voz da Serra
(Foto: Memorial Antonieta de Barros)
(Foto: Memorial Antonieta de Barros)

Há alguns anos, durante o mês de outubro e, especialmente, quando se aproxima o dia 15, aparece em redes sociais, mensagens na mídia e imagens enviadas por celular, cartões com fotografias e pequenos textos sobre Antonieta de Barros, em função de ter sido ela a propor a data como Dia dos Professores. Nesses materiais, lemos que ela foi professora e a primeira deputada estadual eleita em Santa Catarina e primeira mulher negra eleita no Brasil, na primeira metade do século 20. Mas, quem foi Antonieta de Barros?

Além dos atributos citados, que a consagraram como personagem principal dessa data, Antonieta de Barros foi dona de escola de prestígio, professora em Escolas Normais; teve uma coluna fixa no principal jornal de Florianópolis sob o pseudônimo Maria da Ilha, e depois publicou os textos em livro — Farrapo de Ideias, título homônimo à coluna; foi uma intelectual que se manifestava publicamente sobre temas delicados como direitos da mulher, importância da educação e desigualdades. 

Antonieta de Barros nasceu em Santa Catarina no alvorecer do século 20, em 1901, num período em que a escravidão tinha sido abolida muito recentemente e em que racismo e eugenia permeavam as relações sociais. Sua mãe, Catarina, tinha origem escrava e, como tantas mulheres negras no Brasil, foi cozinheira, empregada doméstica e lavadeira, e criou sozinha o filho e duas filhas, que alçaram importantes postos na sociedade local. Leonor, a caçula, também foi professora e acompanhou Antonieta durante toda a vida. 

Após se formarem professoras, por falta de concurso público e “pistolão”, as irmãs não teriam conseguido lecionar no ensino público, por isso começaram a dar aulas particulares em casa. Esse curso se transformou no Colégio Antonieta de Barros, que obteve grande prestígio na sociedade local, sendo frequentado por alunos pertencentes à elite catarinense e que Leonor dirigiu após a morte da irmã. Professora de português, literatura e psicologia em instituições públicas e privadas, ganhou reconhecimento e admiração das normalistas que a convidavam para paraninfa em sucessivas formaturas.

Católica atuante, combinava a personalidade religiosa e os trabalhos filantrópicos com a defesa das mulheres, se aproximando das questões relacionadas ao feminismo daquele período. Defendia a importância do voto feminimo e da participação das mulheres na política, mantendo contato com feministas de diferentes regiões como Bertha Lutz e outras, que vibraram com sua eleição para deputada estadual em dois mandatos. Dirigia o próprio carro, possuía telefone, viajava nas férias e defendia os direitos das mulheres.

É admirável e ao mesmo tempo perturbador notar que na primeira metade do século passado, Antonieta já defendia temas urgentes ainda hoje: necessidade de concurso público para magistério, para o cargo de direção de escolas, de organização da categoria docente; igualdade de salário entre professores e professoras; relevância da educação de adultos; importância da aproximação entre crianças pobres e livros, por exemplo.

Parte de uma família negra na região sul do Brasil num período em que tudo era ainda mais difícil, Antonieta ultrapassou as expectativas da sociedade para uma mulher negra. Ser moderna, ter superado a pobreza, obter prestígio e reconhecimento social, porém, não a livraram de sofrer racismo. Um exemplo relatado por familiares eram os “trotes”: 

“Ela sofria ameaças por telefone. Ouvia coisas horríveis. Atendia, e as pessoas mandavam perguntar à Antonieta se ela queria vender ‘o beiço para fazer feijoada’”(ROMÃO, 2021, p. 98). Nas disputas políticas, sua origem também era usada para atacá-la, como aconteceu nas campanhas para deputada e nas tribunas. Em 1951, um adversário acusou as discussões sobre educação feitas em sua coluna na imprensa de “intrigas da senzala”. Em um contundente texto, que merece ser lido na íntegra, respondeu: 

“Na verdade, não há intriga, porque não houve, mas as considerações em torno da situação desoladora do ensino público, foram ditadas pelo coração de uma negra brasileira, que se orgulha de sê-lo, que nunca se pintou de outra cor, que nasceu trabalhou e vive nesta terra e que bendiz a Mãe, a santa Mãe, também negra, que a educou, ensinando-a a ter liberdade interior, para compreender e lastimar a tortura dos pobres escravos que vivem acorrentados, no mundo infinitamente pequeno das cousas infinitamente pequeninas e insignificantes…”. (Fonte: www.brasildefatopb.com.br)

Publicidade
CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
Publicidade
Publicidade
Publicidade

Apoie o jornalismo de qualidade

Há 79 anos A VOZ DA SERRA se dedica a buscar e entregar a seus leitores informações atualizadas e confiáveis, ajudando a escrever, dia após dia, a história de Nova Friburgo e região. Por sua alta credibilidade, incansável modernização e independência editorial, A VOZ DA SERRA consagrou-se como incontestável fonte de consulta para historiadores e pesquisadores do cotidiano de nossa cidade, tornando-se referência de jornalismo no interior fluminense, um dos veículos mais respeitados da Região Serrana e líder de mercado.

Assinando A VOZ DA SERRA, você não apenas tem acesso a conteúdo de qualidade, mantendo-se bem informado através de nossas páginas, site e mídias sociais, como ajuda a construir e dar continuidade a essa história.

Assine A Voz da Serra

TAGS: