“Pense em tudo o que você quis ou precisou ler e entender somente hoje, desde que acordou. Pensou? Raramente quem já está alfabetizado percebe, mas essa habilidade é uma porta de entrada para estar e participar do mundo. E se queremos garantir uma Educação de qualidade para todos, precisamos, antes de tudo, que todas as crianças saibam ler e escrever plenamente na idade certa. Infelizmente, muitas ainda não estão alfabetizadas em leitura, escrita e matemática, e isso pode trazer sérias consequências não só para a Educação, mas para o ciclo de pobreza e desigualdades do país.”
Há cerca de oito meses, o mundo começou a se reconfigurar. A descoberta de um novo vírus circulando pelo planeta impôs mudanças imediatas para conter uma transmissão que ainda hoje se alastra matando milhares de pessoas em centenas de países. Se a saúde e a economia foram profundamente afetadas, não foi diferente com a educação.
Segundo a Unesco (braço da ONU para educação), até 25 de março, 165 países haviam fechado suas escolas por causa da pandemia, interrompendo as aulas presenciais de 1,5 bilhão de estudantes e mudando a rotina de 63 milhões de professores de educação básica.
Em maio, eram 190 países com escolas fechadas e mais de 1,5 bilhão de crianças e adolescentes fora das escolas por conta da Covid-19. Diante das incertezas de quando tudo voltaria ao normal, instituições de ensino de todos os níveis educacionais iniciaram processo de ensino a distância que tem imposto desafios não só às próprias escolas e universidades, mas também aos profissionais de educação e às famílias.
Para a professora Claudia Costin, fundadora e diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas (Ceipe-FGV), a aprendizagem remota tem o aspecto positivo de acelerar o modelo híbrido de educação, que alia o uso da inteligência artificial à presença do professor em sala de aula, para ela, ainda insubstituível.
Por outro lado, o modelo pode aumentar drasticamente o abismo educacional entre ricos e pobres. Mas, segundo a especialista, a educação não pode parar. “Se a gente não fizesse nada, os riscos de aumentar a desigualdade educacional seriam tremendos. Com a atuação dos gestores educacionais, nós temos grandes chances de diminuir um pouco o dano causado. No entanto, a gente não pode ter ilusões”, alertou.
O melhor lugar para a criança
No Brasil, as respostas para a situação têm sido diversificadas, a depender de cada rede ou escola. Algumas anteciparam as férias e se prepararam para estruturar o ensino à distância; outras estão, em diferentes graus e com diferentes métodos, produzindo conteúdo e enviando tarefas e aulas para os alunos fazerem de casa.
Na rede pública, estados e municípios prepararam aulas virtuais ou via transmissões de televisão aberta, às vezes complementadas por material enviado às casas dos alunos pelo correio ou transporte escolar. Alguns montam grupos de WhatsApp com alunos e professores, trocando vídeos e áudios com atividades.
"Naturalmente, o melhor lugar para a criança é na escola. Não vamos agora ter soluções (que seriam ideais) para os tempos normais, mas vamos poder aprender para aperfeiçoar a educação quando voltarmos à normalidade”, afirmou Costin, que assessora redes estaduais e municipais a se adaptarem às circunstâncias atuais.
Soma-se a isso o fato de que, no Brasil, a qualidade da escola costuma ter o papel de redução - ou, em situações negativas, de aprofundamento - das desigualdades sociais. Especialistas em educação temem que estudantes de redes ou escolas menos estruturadas, particularmente em regiões carentes, acabem ficando para trás ou perdendo motivação em estudar e, futuramente, em retomar as aulas presenciais.
"Neste momento, a única certeza é de que temos de fazer algo para que não aumentem as desigualdades educacionais. Porque muitas escolas particulares estão realizando suas atividades, e nelas estão as famílias com mais letramento" - e, portanto, em teoria, com mais facilidade em manter os filhos estimulados no processo de aprendizagem.
(Fontes: Ong Todos pela Educação, Unesco, BBC News Brasil)
Deixe o seu comentário