Agressão ainda é usada por 29% dos brasileiros para disciplinar crianças

No Brasil, a violência física e psicológica contra menores é proibida pela Lei Menino Bernardo
segunda-feira, 04 de agosto de 2025
por Jornal A Voz da Serra
(Foto: Freepik)
(Foto: Freepik)
Mesmo com uma legislação que proíbe castigos físicos contra crianças há mais de dez anos, quase um terço dos cuidadores de crianças de até seis anos no Brasil admite usar a violência como forma de disciplina. O dado alarmante é parte da pesquisa Panorama da Primeira Infância: “O que o Brasil sabe, vive e pensa sobre os primeiros seis anos de vida”, lançada pela Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal em parceria com o Instituto Datafolha.

A violência na infância deixa marcas que vão além do momento da agressão, e nenhuma forma é inofensiva
Segundo o levantamento, 29% dos cuidadores afirmam que utilizam agressões físicas como palmadas, beliscões e apertos para educar os pequenos. Entre eles, 13% dizem adotar essa prática de forma recorrente. O dado revela um cenário preocupante, especialmente considerando que 17% dessas pessoas acreditam que esse tipo de violência seja eficaz. Mais grave ainda: 12% admitem agredir mesmo sabendo que não é um método educativo.

A pesquisa ouviu 2.206 pessoas em todas as regiões do Brasil, sendo 822 delas responsáveis diretos por crianças de até 6 anos. Os dados foram divulgados no início de agosto, mês em que se celebra o Agosto Verde, uma campanha nacional de mobilização em prol da valorização da primeira infância.

A lei é clara, mas a prática persiste

No Brasil, a violência física e psicológica contra crianças é proibida pela Lei Menino Bernardo (Lei 13.010/2014), também conhecida como Lei da Palmada. A norma determina que crianças e adolescentes têm direito à educação sem o uso de castigos físicos ou tratamento cruel. A lei leva o nome de Bernardo Boldrini, de 11 anos, morto em 2014 após sofrer maus-tratos do pai e da madrasta no interior do Rio Grande do Sul.

Apesar disso, a impunidade e a naturalização da violência ainda fazem parte do cotidiano de muitas famílias. “Somos o país do ‘eu apanhei e estou aqui, sobrevivi’. Ainda há uma cultura enraizada de que bater educa, de que a criança é um ser inferior”, afirma Mariana Luz, diretora-executiva da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal.

Ela destaca ainda que existe uma permissividade social com a violência infantil: “Um cachorro não pode ser agredido em praça pública porque as pessoas denunciam. Mas se uma criança leva um tapa ou um beliscão, muitos se calam. A sociedade ainda não reage como deveria”.

Consequências duradouras

A violência na infância deixa marcas que vão além do momento da agressão. A Fundação reforça que nenhuma forma de violência é inofensiva. As consequências vão desde o desenvolvimento de comportamentos agressivos e transtornos emocionais, como ansiedade e depressão, até prejuízos cognitivos.

A pesquisa identificou que 14% dos cuidadores admitiram gritar ou brigar com as crianças. Entre os que usam violência física, 40% acreditam que isso gera mais respeito e obediência. No entanto, 33% reconhecem que esses atos podem levar à agressividade, e 21% apontam efeitos como baixa autoestima e insegurança nas crianças.

“O tapa, a humilhação, o berro, a negligência são fatores que minam o desenvolvimento saudável. O impacto é real e permanente”, alerta Mariana.

A importância da primeira infância

Outro dado importante revelado pela pesquisa é o desconhecimento sobre o papel fundamental da primeira infância no desenvolvimento humano. Apenas 2% dos entrevistados souberam dizer com precisão que essa fase vai do nascimento até os 6 anos, como determina a legislação brasileira. E 84% não sabem que esse período é o mais importante da vida de uma pessoa.

“Todos os picos do desenvolvimento físico, motor, cognitivo e socioemocional acontecem nos primeiros seis anos. O cérebro dessa criança realiza cerca de 1 milhão de conexões por segundo, e 90% das estruturas cerebrais se formam nessa fase”, explica Mariana Luz.

Apesar disso, 41% dos entrevistados acham que o maior desenvolvimento ocorre na vida adulta, e outros 25% acreditam que isso acontece entre os 12 e 17 anos. O dado evidencia a necessidade de ampliar a conscientização sobre o tema.

Investir no começo é garantir o futuro

A diretora lembra ainda que diversos estudos internacionais reforçam a importância de investir na primeira infância. Entre eles, os trabalhos do economista americano James Heckman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia, em 2000. Segundo ele, cada dólar investido nessa fase gera um retorno de sete dólares à sociedade, com impactos positivos na educação, na saúde, na segurança pública e na economia.

“Assim como um dia foi preciso construir a consciência coletiva sobre o valor da terceira idade, hoje é urgente construir essa visão sobre a infância. Precisamos proteger e cuidar das crianças, garantindo o direito de crescerem com dignidade, respeito e afeto”, conclui Mariana Luz.

 

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