Discutir a presença feminina no mercado de trabalho, hoje, já devia ser página virada da história — tema resolvido como a altura da saia ou o tamanho do biquíni de praia. Mas, não é, infelizmente. A importante invasão das mulheres em praticamente todas as profissões, em processo iniciado na segunda metade do século 20, contudo, foi insuficiente para acabar com as diferenças entre os gêneros.
Quando o homem se torna pai, é visto como o profissional que sustenta a família; já a mulher é vista como alguém que tem que se dividir entre trabalho e filhos
Levantamento do Banco Mundial revela que apenas metade delas em idade ativa está empregada. Entre os homens, 80% têm trabalho. Um dos principais motivos, segundo estudos da economista Claudia Goldin, uma das 64 representantes do sexo feminino no rol de laureados com o Prêmio Nobel (homens são 901), é a maternidade. Ter filhos é punição para a carreira.
A mais recente confirmação desse triste retrato é uma pesquisa realizada pela London School of Economics and Political Science (LSE) em parceria com a Universidade Princeton. A equipe comparou a condição de trabalhadores em 134 países, com e sem filhos, mas de perfil profissional similar. O estudo constatou que a chegada do primeiro rebento é um divisor de águas na trajetória feminina: 24% das mulheres deixam o emprego no ano inicial da vida do bebê e 15% permanecem afastadas depois de uma década.
O quadro é ainda mais alarmante no Brasil: 42% das novas mães deixam suas ocupações ao parir, e 35% seguem nessa condição dez anos depois de dar à luz. “As mulheres, de modo geral, têm níveis mais elevados de educação e tirá-las do mercado significa perder mão de obra qualificada”, diz o francês Camille Landais, professor da LSE e coautor do levantamento. “Além dos prejuízos financeiros, é preciso reconhecer que a situação não é justa”.
Mulheres forçadas a desistir da gravidez são coagidas pela incessante busca de produtividade do mundo corporativo. “Quando o homem se torna pai, passa a ser visto como um profissional dedicado que precisa cuidar da família”, afirma Livia Jorge, pesquisadora da Universidade de São Paulo (USP), especialista no tema. “Com a mulher, ocorre o oposto, ela é percebida como alguém que tem que se dividir entre o trabalho e cuidados dos filhos”.
O desfecho não demora a despontar. Porque é nos ombros das mães, sobretudo as de classes sociais desfavorecidas, salvo raríssimas exceções, que costuma recair a responsabilidade das tarefas domésticas e até dos imprevistos, como as interrupções do expediente para socorrer as pequenas vítimas de inevitáveis viroses. Mulheres que não têm uma rede de apoio para esses momentos inesperados são mais propensas aos pedidos de demissão.
Uma publicitária, de 30 anos, tomou a difícil decisão de deixar o cargo que ocupava em uma empresa para cuidar da filha de 9 meses, que apresentou problemas de saúde. “Ela não foi aceita em creches e eu não tinha com quem deixá-la”, contou. “Pedi para ficar em home office, mas não havia essa opção e então, tive que sair.”
Esta é uma decisão comum, reflexo de uma discrepância constrangedora, que não deveria nem poderia mais existir. Os legisladores e a sociedade precisam — com urgência — mudar o rumo dessa prosa.
(Fonte: Paula Freitas para veja.abril.com.br)
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