De papo pro ar

Parar e prestar atenção apenas no momento e nos sons ao redor
quinta-feira, 22 de agosto de 2024
por Jornal A Voz da Serra
De papo pro ar

Momentos de lazer e de descanso são importantes para ajudar na criatividade e na solução de problemas. Mas não pense que apenas ficar "sem fazer nada" o transformará num profissional mais talentoso. O ócio é um terreno fundamental para o surgimento do novo, mas não é uma solução em si. Momentos de relaxamento e lazer são benéficos ao cérebro, pois ativam áreas corticais e do sistema límbico relacionadas ao prazer e à recompensa. Como consequência, a resposta dessas áreas leva ao reforço do sistema imunológico, regulação do tônus do sistema respiratório e cardiovascular e à harmonização do ciclo sono vigília.

Uma série de estudos com ressonância magnética cerebral têm mostrado como o chamado "modo padrão" — aquele ativado quando descansamos e deixamos de focar nossa atenção no mundo externo — é essencial para criar novos processos mentais, como imaginar o futuro, recuperar memórias e sentir emoções. E esses ingredientes são fundamentais na solução de problemas.

Ou seja: enquanto você descansa, seu cérebro trabalha para que você possa planejar o que fazer da vida. O tempo livre é necessário para que as pessoas possam dar sentido e significado às suas experiências de vida. Por isso, muitas vezes uma pausa forçada por uma doença acaba levando pessoas a mudarem de atitudes e estilo de vida. Aliás, quanto mais momentos de ócio praticamos em nosso cotidiano, mais saudável tendemos a ser.

O termo "ócio criativo" foi popularizado pelo sociólogo italiano Domenico de Masi, que publicou um livro com esse título em 1995. O conceito de de Masi tem pouco a ver com redes, chinelos e água de coco. Sua obra faz uma crítica à sociedade industrial, que dissociou trabalho e tempo livre. De Masi ressalta que o ócio criativo não é sinônimo de "não fazer nada", mas, sim, trabalhar, divertir-se e aprender ao mesmo tempo. 

"Aquele que é mestre na arte de viver faz pouca distinção entre o seu trabalho e o seu tempo livre, entre a sua mente e o seu corpo, entre a sua educação e a sua recreação, entre o seu amor e a sua religião. [...] Almeja, simplesmente, a excelência em qualquer coisa que faça, deixando aos demais a tarefa de decidir se está trabalhando ou se divertindo. Ele acredita que está sempre fazendo as duas coisas ao mesmo tempo", diz um trecho do livro. 

Meditar, cochilar e se exercitar 

Em um artigo sobre a importância do descanso mental e físico, a educadora americana Mary Helen Immordino-Yang faz uma crítica à geração que entende a navegação pela internet por horas a fio como lazer. Ela classifica o hábito como "antiócio", pois prejudica a dispersão natural do cérebro.

Fazer uma caminhada sem compromisso ou sonhar acordado no sofá é muito mais produtivo para deixar o cérebro em "modo padrão". Para utilizar o tempo livre de forma útil, uma das recomendações é praticar a meditação: parar por alguns minutos e prestar atenção apenas no momento presente, na sua respiração e nos sons ao redor. Essa prática, de fato, ajuda a melhorar a produtividade. 

Uma equipe da Harvard Medical School, nos Estados Unidos, debruçou-se sobre os efeitos da meditação no cérebro e constatou que apenas oito semanas dessa prática, de tradição budista, são capazes de gerar um espessamento em áreas cerebrais ligadas à aprendizagem, memória, cognição e regulação emocional. Tirar um cochilo durante o dia, ou ao menos dormir bem à noite, também libera espaço no cérebro para a assimilação de novas informações. 

Se uma pessoa estiver muito cansada, um cochilo é mais apropriado do que a meditação. De qualquer modo, em ambas as práticas o corpo é convidado a se recompor, reequilibrar-se e se revitalizar. Praticar uma atividade física também fortalece o cérebro. Há diversos estudos que associam exercícios físicos a melhorias na memória e no aprendizado.

(Fonte: www.uol.com.br / Com: Ricardo Leme, neurocirurgião, autor do livro "Saúde é Consciência”; Mary Immordino-Yang, psicóloga - Universidade do Sul da Califórnia; "O ócio criativo", de Domenico De Masi)

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