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Ciúme normal e doentio
Cesar Vasconcellos de Souza
Saúde Mental e Você
O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.
Você é uma pessoa ciumenta? Qual o significado do ciúme? O que é ciúme? É um conjunto de sentimentos que surgem na pessoa quando ela sente que existe uma ameaça à estabilidade e qualidade de um relacionamento que para ela tem um valor importante.
Segundo o dr. Geraldo Ballone, que foi professor de neuropsiquiatria na PUC de Campinas, no ciúme existem três elementos:
1 - o ciúme é uma reação frente a uma ameaça percebida;
2 - existe um rival real ou imaginário;
3 - a reação ciumenta visa eliminar os riscos da perda do objeto amado, ou seja, o ciumento age com exagero na ideia de que conseguirá controlar o outro.
Quando falamos de ciúme doentio, significa que existem no ciumento muitos sentimentos perturbadores, fora de proporção e absurdos. Estes sentimentos doentios conduzem para comportamentos que vão desde estranhos, até criminosos. Podem existir delírios de ciúmes, como ocorre em algumas doenças mentais como, por exemplo, no dependente do álcool. Ciúme doentio envolve medo desproporcional de perder alguém para um rival. Tem que ver com desconfiança excessiva e sem fundamento, que prejudica o relacionamento com a pessoa que o ciumento diz que ama.
Quando ideias de ciúme invadem a mente do indivíduo e ele reage exageradamente, o resultado é surgir uma compulsão para ver onde a pessoa está, se está mesmo com que disse que estaria, mexe nas bolsas, carteiras, abre envelopes que está em nome do outro, fica atento aos telefonemas, verifica as roupas íntimas da pessoa de quem sente ciúme, às vezes fica tão perturbado que contrata detetives, ou ela mesma segue a pessoa na rua.
A pessoa com ciúme doentio vive à busca de provas, confissões, evidências que possam confirmar suas suspeitas. O clima no relacionamento dela com a outra pessoa é tenso. Ao analisarmos psicologicamente a pessoa com ciúme exagerado, encontramos que o principal sentimento nela não é amor pelo outro por quem ela sente ciúme. O sentimento principal é o egocentrismo devido ao medo de perder a pessoa que é o objeto de seu ciúme. O ciumento exagerado quer a pessoa em sua vida como se fosse um objeto pessoal sobre o qual exerce total controle. Quer exclusividade, domínio, posse. E isto não é amor. A Bíblia diz na primeira carta de Paulo aos Coríntios no capítulo 13 e versículo 4 que “O amor [maduro] não arde em ciúmes.”
Ter muito ciúme pode ser uma forma de manifestar insegurança pessoal e forte desejo de ser amado com exclusividade. Pode significar medo de ficar só, de não ter todo o afeto que pensa que precisa. Ciúme tem a ver com o medo da perda. Perda de quê? Da pessoa ou do que ela representa emocionalmente para o ciumento? Ou de ambos?
O ciúme normal é temporário, transitório e tem um fundamento real por ser ligado a fatos verdadeiros. No ciúme normal, a preocupação tem que ver com a preservação do relacionamento, enquanto que no ciúme doentio a preocupação é o ego do ciumento.
A pessoa com ciúme doentio pode sentir raiva, vergonha, ansiedade, depressão, insegurança, culpa, desejo de vingança. Ela em geral tem uma desvalorização de si mesma, assim se sente insegura, o que favorece o ciúme. É uma pessoa vulnerável, sempre desconfiada, geralmente impulsiva, atuando facilmente de forma agressiva. Estes comportamentos e características não são assim nos indivíduos com ciúme normal.
Pesquisadores têm verificado que a maioria dos crimes de morte seguidos de suicídio ocorrem em função de uma paixão numa pessoa cheia de ideias delirantes de ciúme doentio. A maioria é cometida por homens com sérios problemas emocionais, podendo ser um transtorno de personalidade, dependência de álcool e outras drogas, estado depressivo, transtornos obsessivos e até esquizofrenia. Nas pessoas com diagnóstico de Transtorno Paranoide o ciúme doentio surge em cerca de 16% delas.
Para solucionar o ciúme excessivo, é preciso crer no afeto existente e valorizar o que o outro realmente sente por ela, por ele, e parar de se preocupar com algo idealizado, confiando que os ganhos são reais, eles existem porque a pessoa tem amor genuíno, outras pessoas também gostam da pessoa, e ela pode gostar mais de si mesma a ponto de não esperar demais dos outros. O amor da pessoa por você não depende do quanto você a controla. Depende do que ela pode sentir e fazer por você. E isto é com ela.
Ciúme exagerado é posse e posse é abuso. Como comentei antes, geralmente produz agressividade e até violência. Um ciumento sente que é dono da pessoa para quem o ciúme é dirigido. Quer o outro como seu escravo. Mas o amor é contrário à escravidão. Cada ciumento deve lutar para ser dono de si mesmo, de suas emoções, aprendendo a controlá-las para sua saúde ao invés de se deixar levar por elas, gerando, por exemplo, ciúme exagerado. Saúde mental tem que ver com ter as emoções, sem deixar que as emoções tenham você. Se você não consegue dominar e acabar com seu ciúme que pode ser doentio, procure ajuda com um conselheiro capaz ou psicólogo.
Cesar Vasconcellos de Souza
Saúde Mental e Você
O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.
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