A leitura, os manuais de instrução e a literatura

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

segunda-feira, 10 de junho de 2024

A literatura tem pano de sobra, aliás sobra tecido para todas as mangas dos mais diferentes tipos e tamanhos. Nesses dias, ao me deparar com um manual extenso, refleti sobre as diferenças entre os manuais de instrução, que têm por finalidade ensinar ao usuário a operar um equipamento e a literatura, que é a arte de usar as palavras ao recriar a realidade através da visão do autor da obra na produção textual de prosa e poesia. 

Os manuais de instrução e a literatura são apresentados através de textos, ou seja, usam a palavra como matéria prima. Os primeiros fazem uso da linguagem objetiva com sentido denotativo, ou seja, a palavra é empregada em seu sentido próprio e preciso. Já o texto literário emprega uma linguagem subjetiva e um sentido conotativo através do qual o leitor tem a possibilidade de interpretar e imaginar, indo além do sentido real das palavras. 

“A leitura é, provavelmente, uma maneira de estar em outro lugar.”

                                                                                 José Saramago

O mais interessante é que as palavras usadas nos manuais podem ser as mesmas empregadas nas obras literárias. Até me arrisco a supor que existe uma magia nos processos de escrita, que até hoje ninguém decifrou. 

De que substância és feito,

Que milhões de sombras te envolvem?”

                                                           William Shakespeare, Soneto 53

Quando caminhamos por um bosque vamos admirando as árvores e a beleza da natureza, escutando os passarinhos e o barulho do vento até chegarmos na fonte, onde vamos matar a sede, saboreando a água fresca. Nesse passeio, o leitor busca prazer ao debruçar seus olhos sobre um texto literário. Lendo, torna-se uma pessoa melhor. Usa seu tempo livre tendo contado com ideias e modos de viver de outra pessoa, até porque o autor, acima de tudo, é tão humano quanto ele. Além do que vive ou viveu em contextos culturais diferentes dos do leitor.

Em caso de falta d’água, o leitor percorre um caminho certeiro que o leva à fonte, onde terá a certeza de encher seus recipientes de água potável para levá-los para casa. Ao ver-se diante de uma máquina desconhecida, o leitor se detém em cada item do texto, geralmente numerado, e busca compreendê-lo tendo em vista o mais eficiente uso do equipamento.

“Não há problema que a leitura não possa solucionar.”

                                                                       Charles Bukowski

O que há de comum entre a literatura e os manuais de instrução é que todos foram criados para serem lidos.  

Ora pois sim, cada leitor elege seu estilo de leitura. Há quem não goste ler manuais de instrução e há quem não sinta prazer de ler textos literários. Porém não há leitores certos e errados. E, sim, há leitores versáteis, que reconhecem o valor de cada texto e sabem lê-lo com desenvoltura. 

Aí reside a importância do desenvolvimento do hábito de leitura. A leitura, sem sombra de dúvidas, é uma habilidade cognitiva complexa posto que exige atenção, estabelecimento de semelhanças e diferenças, compreensão de significantes e significados, análise, crítica e interpretação. O que requer do aprendiz tempo e dedicação. Porém o ponto de partida é o leitor saber encontrar prazer, interesse e motivação durante a leitura.

“Leitura, antes de mais nada, é estímulo, é exemplo” 

                                                                                  Ruth Rocha

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Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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