Formas de enriquecer

Robério Canto

Escrevivendo

No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.

quarta-feira, 13 de maio de 2020

Querer ficar rico entre um sol e outro, é se apressar além da conta

Diz-nos Mateus, nos evangelhos, que “Ele faz nascer o seu sol sobre maus e bons e vir as chuvas sobre justos e injustos” (creio ser desnecessário explicar a quem se refere o pronome Ele). Daí se conclui que qualquer pessoa pode abrir um negócio aqui neste mundo e assim ir vivendo honesta ou desonestamente, sem que Ele se meta, como se fosse um sócio ou mesmo um acionista, ainda que minoritário.

Disso é que se valem os maus e os injustos para passar a perna (se me permitem usar essa expressão antiga) nos bons e nos justos. É a conclusão a que se chega ao saber que várias pessoas investiram seu rico dinheirinho numa empresa de energia solar, na esperança de faturar juros superiores a dez por cento. Ao ano?, perguntará  o leitor, espantado com o alto valor dos rendimentos. Nada disso: ao mês!, o que multiplicaria por doze os ganhos dos aplicadores. Só que, na hora de receber, eles foram gentilmente informados de que o dinheiro tinha desaparecido e os juros, esses então!, nunca tinham existido.

Macaco quando vê muita banana... ou: laranja madura na beira da estrada... Em nada disso pensaram os ingênuos investidores. Acreditaram que, se o sol brilha para todos, a todos igualmente deve enriquecer. No caso da energia solar, ele não brilhou para quem botou grana no negócio e depois descobriu que havia embarcado numa canoa furada. Certamente brilhou para quem teve a feliz ideia de criar uma empresa capaz de iluminar casas, bairros e cidades inteiras, simplesmente aproveitando o calor dourado que Ele, diariamente, faz nascer para bons e maus, justos e injustos.

 Quem tudo quer, tudo perde e, em se tratando de aplicar dinheiro, toda prudência é pouca. E prudência, vocês sabem, é como caldo de galinha: nunca fez mal a ninguém. Devagar se vai ao longe, mas querer ficar rico entre um sol e outro, é se apressar além da conta e a consequência inevitável é dar com os burros n´água. No entanto, a toda hora temos notícia de que alguém caiu na conversa fiada (mas paga à vista) de gente que nos oferece vantagens ou nos pede ajuda, que ilude nossa inteligência ou comove nosso coração. Seja por ganância, seja por ingenuidade, muitas vezes nos deixamos enganar. Sim, o sol nasce para todos, mas, excetuando-se as dádivas da natureza com que Ele gratuitamente nos enriquece, tudo mais custa trabalho.  

Na Bíblia encontramos o exemplo de Jacó, que se apaixonou por Rachel, filha de Labão. Para casar-se com a amada, aceitou trabalhar sete anos para o sogro. Ao acordar, após a noite de núpcias, Jacó se viu na cama ao lado de Lia, a quem pretendia ter como cunhada, e não como esposa. Labão, que pelo visto não era dado a sentimentalismos românticos, propôs que o genro trabalhasse mais sete anos para se casar com Rachel. Trato feito, Jacó suou a camisa durante quatorze anos, sem férias, sem carteira assinada, sem 13%, ou seja, de graça, para enfim conseguir amar a mulher amada.

Muita coisa pode ter mudado do Gênesis até hoje, mas se tem uma coisa que continua a mesma é que não existe forma de enriquecer ao mesmo tempo rápida e honestamente. Salvo a loteria ou alguma herança, mas se você for contar com isso, aí mesmo é que provavelmente morrerá mais pobre do que está agora. Pois, como bem disse Einstein, “O único lugar em que o sucesso vem antes do trabalho é no dicionário”.

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No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.

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