15 anos juntos

quarta-feira, 15 de novembro de 2023
por Jornal A Voz da Serra
15 anos juntos

Meu afilhado Miguel nasceu um mês depois. Meus afilhados, Tiago e Davi, só vieram cinco anos mais tarde. Quando a coluna Observatório nascia, em novembro de 2008, eu nem era ainda nascido para a política eletiva, assim como outros por aí. Minha dedicação era exclusiva ao jornalismo: Rádio Nova Friburgo FM (à época ainda AM), TV Zoom e Portal de Notícias da InterTV. Em A VOZ DA SERRA, dei meus primeiros passos em setembro de 2006, quando começara a coluna semanal Palavreando.  

Lembro-me como se fosse hoje: diante da mesa bagunçada de Laercio Ventura, há 15 anos, ele me dizia: “uma coluna só por semana é pouco. Vejo você em todos os veículos de comunicação da cidade e no principal você não está todos os dias. Quero que você escreva todos os dias aqui. Crie algo”. 

Escrever, todos os dias, uma coluna literária como Palavreando seria exaustivo, não só para o cronista, como também para o leitor. Em um insight rápido, a ideia de Observatório surge, ali mesmo, em uma daquelas tardes de muito aprendizado diante do inesquecível mestre. Observar e fazer do cotidiano friburguense - notícia. 

Notava que muitas das informações que tinha do dia-a-dia não eram de conhecimento da imensa maioria das pessoas. Até mesmo do convívio profissional. Informações curiosas, que mudavam o rumo da cidade, do ir e vir de sua gente. Talvez não valiam uma matéria clássica, mas dariam notas; o comércio, a cultura, o esporte, as pessoas e instituições. Buscar notícias quentes, exclusivas. 

Era difícil não ser convencido por Laercio e, empolgado como são os entusiastas de Nova Friburgo, pediu para que eu montasse um modelo para ele ver. Entreguei dois dias depois, e na semana seguinte à conversa, em 12 de novembro de 2008, Observatório simplesmente estava publicado, sem qualquer alteração da boneca que eu havia montado. Com a minha foto e assinatura. Dando a cara à tapa. Nada de pseudônimos, inaugurando um momento especial do jornalismo local. 

No início, um pequeno artigo abria a coluna que era seguida de notas. E assim, abríamos a apresentação da coluna, há 15 anos: “Não tenho respostas, apenas observações. E de binóculo ou pelo buraco da fechadura, observo o cotidiano tecendo suas teias que aprisionam, mas também libertam. Aliás, sou daqueles que cultivam a crença do informar para transformar. Minha maior aspiração: ter instinto de cachorro vira-lata, daqueles sem dono, em que a lata do lixo é a rotina e as esquinas – a sobrevivência.

O luxo de um jornalista é gente e as esquinas são seu mundo. É nas esquinas que o global se torna tão perto ao ponto de ser local. Eu amo gente! E na minha eterna tentativa de entender gente é que descubro que é ousadia demais desvendar gente. Orgulhosamente, me junto às vozes de A Voz da Serra para analisar, testemunhar e eternizar as histórias de Nova Friburgo e região. E tentar assim, também ser professor e estudante do tempo. Espectador e agente dos acontecimentos. Herói e vilão. Fazer história e histórias. Afinal, é isso que A Voz da Serra faz há mais de sete décadas. O mundo é uma história da qual talvez eu não conte o fim, mas estou aqui para ver, contar e perpetuar o meio. E o meio é o que importa. Com alma de vira-lata, tenho a partir desse instante, uma caneta na mão e gente para todos os lados. Você está sendo observado!”

Ao longo destes 15 anos, a coluna foi mudando, sem perder sua essência. Seguiu diária, mesmo quando acabei entrando para a política eletiva. Laercio sempre me incentivou, ainda que, com o peculiar espírito protetor que abraçava os seus. Temia pela minha carreira, me achava jovem demais e por isso perigoso colocar o nome à disposição do voto. Porém, ele sabia desde sempre do meu sonho maior e foi um grande apoiador. Na primeira tentativa, acabei me tornando vereador. Mandatos tem tempo determinado. Ter consciência disso é essencial para não fazer do poder propriedade particular. A profissão de jornalista é permanente. 

Na última conversa com Laercio, ele me disse: “Menino, acho que não vou conseguir cumprir a promessa que fiz de te ver onde você vai chegar. Me libera dela?” Após me despedir, chorei no silêncio do interior do meu carro, mas com muita esperança de sua recuperação, que acabou ocorrendo. No entanto, poucos dias depois, perdemos o grande contador de histórias de Nova Friburgo.  

Mesmo tendo a obrigação de ficar na capital, quando Nova Friburgo me possibilitou o mandato de deputado estadual, já sob a direção de Adriana Ventura, seguimos com a coluna diária. A rotina pesada não foi fácil, mas compromisso é compromisso. Até que fomos diminuindo o ritmo para uma coluna mais repleta de informações com duas edições semanais, até chegar ao formato atual, uma página inteira, uma vez por semana, exclusivamente de notas.

Mesmo durante os mandatos, jamais fiz autopromoção pessoal. Nunca escondi o que penso e defendo: Nova Friburgo tem potencial para ser uma das melhores cidades do Brasil. Seja com olhar crítico ou sonhador, sempre regrado pelo equilíbrio. Hoje, peço licença do formato de notas informativas para fazer esse passeio e também revelar angústias e orgulhos. Nossa relação é de sinceridade. Por mais que pudesse fazer aqui bastidores da política, não foi o que nos propomos. E, a partir do momento em que estive inserido como nome também da política, evito o tema. Claro que ter sido o 2º mais votado na última eleição de prefeito fez com que o olhar para mim mudasse, especialmente do meio político. Mas não abro mão da minha profissão. Fiz pós em gestão pública, mas sigo também sendo jornalista e educador. Podem tirar tudo de alguém, menos o conhecimento adquirido.  

Você nunca leu aqui sobre partidos, articulações de político A ou B ou de mim mesmo, rumores do Executivo ou do Legislativo locais. Porém, sob o olhar jornalístico não nos calamos diante de fatos que afetam a vida de todos: denunciamos o estoque de vacina contra a Covid-19, enquanto dezenas estavam morrendo na cidade, à espera do imunizante. Mostramos, por estudos estatísticos exclusivos e minuciosos, que a gestão da Covid, na Nova Friburgo de 2021, matou mais pessoas do que os já trágicos números brasileiros. Pasmem, ficamos muito acima das médias estadual e nacional. 

Temos nos empenhado em trazer os mais variados rankings que comparam municípios através de dados oficiais. O que esses números têm revelado? O próprio leitor tem capacidade para perceber que Nova Friburgo ficou para trás, que ano após ano, a queda tem sido livre em praticamente todos os setores. Lendo números, nos deparamos com o irrefutável: não são apenas números, são pessoas! Ser, por exemplo, o 51º pior do país em acesso à saúde é a confirmação fria de que os friburguenses não estão tendo saúde básica.

Podem discordar de posições e isso é saudável, mas não há como ocultar os dados a que temos nos dedicado a simplificar para o leitor. Contra números não há argumentos. Entre dados e opiniões, vencem os dados, já que opinião todo mundo tem a sua! Portanto, esmiuçar essas métricas, comparar a períodos anteriores e dar publicidade a elas tem irritado quem está no poder.

Os mesmos que amavam, usavam e abusavam de A VOZ DA SERRA, quando com justiça, tinham todo destaque nas ações do finado G5. Título, aliás, dado por este jornal ao então grupo de cinco vereadores de extrema oposição ao governo anterior. Quem tanto gostava de fiscalizar, criticar sem soluções e apontar o dedo, passou a ter ojeriza ao que tanto fazia.

As críticas seguem semelhantes, a falta de criatividade nas soluções continuam as mesmas, mas agora, perseguem o jornal, querem a minha cabeça, fazem ilações infundadas com argumentos que carecem de verdade. Também perseguem servidores públicos que pensam diferente, veículos de comunicação como um todo, desrespeitam a oposição, tentam aniquilar a institucionalidade. Típico de populistas, entusiastas de ditaduras, de quem não sabe ser criticado e apela para a teoria que separa situação em ungidos e oposição em renegados por Deus. Alguém tem que falar para eles que a Idade Média ficou no século 15. Estamos no Brasil de 2023.    

Em tempos de narrativas, rechaçam quem não compactua das narrativas criadas por eles e usam suas milícias digitais, patrocinadas ou não, para fazer de Nova Friburgo quintal de suas casas. Mas a cidade é maior e na arena certa, esse debate será feito, democraticamente, olho no olho, com todo olho nos produtores de fake news. Fake news e deepfakes não serão perdoadas! Fica dado o recado a quem se atreveu e se atreve na aventura do tudo pelo poder.

Durante 15 anos, colhemos credibilidade. Notícias que nos encheram de orgulho, outras de preocupação. Reflexões. Sonhos. O manual jornalístico diz que levamos muito tempo cristalizando credibilidade, mas a credibilidade pode se esvair muito rápido. O manual da vida diz o mesmo e acrescenta que seu discurso deve ser sua prática e sua prática um hábito. Felizmente, mantemos essa credibilidade cada vez mais fortificada e nossos ideais mais maduros e firmes. Coerência.

As trajetórias não podem ser apagadas. Todos os dias olho para o menino de 15 anos que começou como repórter esportivo na equipe do Fernando Bonan. Enquanto fazia formação de professores no Ienf e era vendedor de calçados na Mascote, pisava nos gramados do Maracanã. Lembro do menino de 9 anos que andava pelas ruas da cidade como garoto de estacionamento. Sou filho de costureira. Recordar isso faz com que eu não me esqueça de onde vim, não me perca em ilusões de poder e mantenha os propósitos que seguem me levando pelos ideais coletivos de uma Nova Friburgo grandiosa e de excelência para o seu povo. 

Ouço como se pudesse estar ouvindo neste momento que escrevo o conselho do mestre Laercio: “O que você fala no rádio, o vento pode até levar, mas o que escreve no jornal fica. Pois no jornal, o sujeito lê, relê e confirma: ele quis dizer isso mesmo”. E é isso que quero dizer mesmo: às vezes tenho medo, é claro, de enfrentar tudo que aí está posto, mas não tenho escolha.

Dissecadas - ainda que de forma rasa as angústias - por fim, orgulho do que escrevemos e gratidão. Gratidão não perece - nunca. Jamais fui demitido dos empregos que tive, nunca fui expulso de lugar algum. Quando tive que sair para outras oportunidades, as portas sempre ficaram abertas. Terminei amigo de todos os relacionamentos que tive e meus velhos amigos seguem se somando aos novos. Não começamos ontem, ainda que vinte e tantos anos de comunicação e 15 anos de Observatório em A VOZ DA SERRA possam parecer pouco diante dos honrosos 78 anos desta instituição. AVS é uma instituição. Respeitem.

Governos vão passar, novas lideranças vão surgir, despedidas vão acontecer, ideologias vão evoluir, pensamentos proeminentes agora darão lugar a outros, portas de lojas vão abrir e fechar. A cidade é um organismo dinâmico, cuja identidade é a história de seu povo e o que seu povo firma de legado às suas instituições. Que honra poder acompanhar tudo isso e ser parte. 

Obrigado, aos meus colegas de trabalho que possibilitam que eu chegue até você, querido leitor. Obrigado a você que me acompanha. Grato pelos elogios, pelas críticas construtivas, por nossa relação. Obrigado à direção, sob a árdua e diária luta de Adriana Ventura, para manter o jornal.

Como povo, fico grato pela oportunidade de escrever neste biógrafo que é A VOZ DA SERRA. Meus escritos testemunham ideias, percepções e sonhos. Perpetuam as observações de um tempo. Este tempo que tenho e temos juntos. Que a sensibilidade e a coragem sigam nos guiando.

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