Nossa tendência de experimentar medo e ansiedade é genética?

César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

quinta-feira, 16 de novembro de 2023

A revista Scientific American online publicou uma resposta à pergunta do título acima do dr. William R. Clark, professor do departamento de biologia molecular, celular e do desenvolvimento da UCLA (Universidade da Califórnia em Los Angeles). Original em inglês disponível nesse link: https://www.scientificamerican.com/article/is-our-tendency-to-experi/ Vamos ver a resposta do dr. Clark sobre se a ansiedade e medo tem base genética.

Ao sentirmos medo, a tendência automática é reagir frente ao perigo percebido. Pessoas diferentes reagem de forma diferente diante do medo. Quanto à ansiedade, algumas têm ansiedade traço, que é a que existe desde que o indivíduo era pequeno, enquanto que outras têm ansiedade estado, que surge temporariamente diante de algum evento estressor, mas depois retorna ao nível normal.

O medo ajuda a pessoa a não arriscar a vida. Serve de proteção. O problema é quando o medo se torna uma fobia, que é uma emoção de medo exagerado. A fobia não é útil e prejudica o desempenho da pessoa. A fobia e a ansiedade excessiva, explica o dr. Clark, causam não só angústia mental, mas vários sintomas físicos reais, incluindo dor localizada. Mas até que ponto o medo é aprendido com a vivência e a experiência do ambiente, e até que ponto sofre influência genética?

O estudo do medo em camundongos mostrou que ele pode ser criado seletivamente nas gerações seguintes, sugerindo forte componente genético. Camundongos selecionados ao acaso submetidos a um teste numa caixa aberta e iluminada, sem esconderijos, exibiam respostas diferentes. Alguns se encolhiam e ficavam parados perto de uma parede, defecando e urinando repetidamente, enquanto outros andavam pela caixa, cheirando e explorando sem preocupação.

Se os ratinhos medrosos forem criados uns com os outros ao longo de várias gerações, é possível desenvolver gerações nas quais todos os membros serão altamente ansiosos e com medo em testes diferentes. Interessante que eles não aprendem esse medo e ansiedade excessiva uns com os outros ou com suas mães. Um rato recém-nascido de uma linhagem temerosa, criado por uma mãe destemida junto com irmãos destemidos, ainda poderá medo quando adulto.

Camundongos sem receptores de células nervosas para o neurotransmissor Gaba (ácido gama-amino butírico) são mais medrosos do que os com o receptor. O Gaba é usado por regiões superiores do cérebro e pode funcionar para diminuir as respostas excessivamente temerosas aos estímulos ambientais. Verificou-se que camundongos sem um receptor no cérebro para hormônios do estresse glicocorticoides são bem menos ansiosos do que camundongos de controle.

Dr. Clark diz que há evidências em humanos, obtidas de estudos de crianças adotadas e gêmeos idênticos criados juntos ou separados, de que uma tendência à ansiedade e ao medo é um traço hereditário. Fobias específicas, como medo de cobras, de dor, altura ou espaços fechados, estão quase inteiramente ligadas a experiências ambientais individuais. Mas a tendência de desenvolver respostas de medo ou ansiosas ao meio ambiente em geral tem componente genético claro.

Parece que grande parte da contribuição genética para o medo e a ansiedade em humanos envolve neurotransmissores e seus receptores, e o Gaba e seus receptores têm papel fundamental. Talvez o mais importante neurotransmissor que media a ansiedade em humanos seja a serotonina. A depressão grave também tem um componente genético marcado.

Medo e ansiedade são influenciados por muitos genes. Não existe um simples gene de "medo" herdado de uma geração para outra. O que recebemos geneticamente de nossos pais nos predispõe a responder com maior ou menor grau de ansiedade a eventos em nosso ambiente. Mas o quanto nossa vida é afetada por essa predisposição herdada depende em grande parte de nossa história individual - o número, força, tipo e duração dos eventos que provocam tais reações.

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Cesar Vasconcellos de Souza – doutorcesar.com

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