A situação financeira é delicada há anos, mas o bom trabalho feito pelo Friburguense sempre sobrepôs as dificuldades. Desde 1998, o clube passou 19 dos últimos 23 anos na primeira divisão, acumulou boas campanhas, brigar por semifinais do Estadual em diversas oportunidades – e conquistou a classificação em algumas delas – e sonhou com o reankeamento nas divisões do futebol nacional. Tudo isso sempre com restrições de receitas, folha de pagamento enxuta e muita organização. A fórmula continuou sendo seguida, mas o cenário externo mudou. Vieram, por exemplo, uma pandemia, mudanças de calendário e extinção da cota de TV.
O Tricolor da Serra terá pela frente uma Série A2 do Campeonato Carioca, a partir de meados de junho, mas a participação, hoje, é incerta. Sem “dinheiro novo” desde março de 2020, quando começou a pandemia, e sem previsão alguma de consegui-lo, o clube acumula dívidas do passado. Havia a expectativa de equacioná-las com os recursos que poderiam vir da Seletiva deste ano, mas a rescisão de contrato da TV Globo junto à Federação de Futebol do Rio de Janeiro atrapalhou os planos. Os R$ 750 mil não chegaram, as despesas com folhas de pagamento, jogos, viagens e testagens se multiplicaram e a balança financeira do Friburguense desequilibrou de vez.
“Para começar a planejar alguma coisa, primeiramente, temos que acertar o que ficou. Pela primeira vez, não fizemos o último mês de salário dos jogadores. Todos eles entendem a situação, mas para programar de trazê-los novamente é complicado. Temos que acertar o que ficou, e temos algumas específicas para fazer antes de planejar algo. A Série A2 possui previsão de início para junho, com regulamento igual ao da A1, e nesse primeiro momento a ideia era voltar no início de abril”, explica o gerente de futebol José Siqueira, o Siqueirinha.
À exemplo do que acontecera para a disputa da Seletiva – quando treinou por 16 dias antes da estreia -, o Friburguense não vai conseguir cumprir esse período considerado ideal de preparação. O clube, inclusive, não descarta o pedido de licença junto à Ferj, o que acarretaria com o rebaixamento automático para a Série B1.
“Nesse momento não temos condições. Estamos tentando buscar algumas ajudas, parcerias, para tentar viabilizar a volta da maioria dos jogadores que disputaram a Seletiva. Mas para isso precisamos criar todo um projeto, um ambiente diferente. Se não, é mais fácil pedir uma licença, não gastar e cair de divisão do que gastar, ampliar a dívida e ser rebaixado. Essa é uma realidade que a gente precisa colocar para a imprensa e para a torcida, e tentamos fazê-la em dezembro. Aí depois só ficou caracterizado o mau trabalho. Naquele momento, foram os jogadores que aceitaram as nossas condições, treinando apenas 16 dias e foram até o final”, pondera o dirigente.
De fato, o Friburguense sempre foi um clube que manteve os pés no chão. A manutenção da base e as contratações dentro do teto salarial, com investimentos direcionados ao futebol base, conviveram com a vontade do torcedor em ver grandes contratações, equipes mais caras e jogadores renomados. Esse mesmo pensamento equilibrado se mantém, e aponta para uma realidade bastante delicada no futuro próximo.
De acordo com o regulamento da Série A2, apenas o campeão conquistará o acesso para a primeira divisão em 2022. Em dificuldades, o Friburguense terá como adversários equipes com alto poder de investimento, e outras que irão iniciar a preparação em breve. Ou seja: apesar do peso histórico, o Tricolor entraria na competição em desvantagem sob variados aspectos.
“Temos que mostrar que, numa Série A2, o Friburguense não é favorito. O América já voltou a treinar, o Americano em breve, o Sampaio Corrêa retorna no dia 15. Nós temos duas estruturas muito fortes para esse ano, que são o Maricá, com o todo o apoio da prefeitura e empresariado local, e o Artsul, com boa capacidade de investimento após a venda do Pedro (atacante comprado pelo Flamengo junto à Fiorentina por R$ 87 milhões, dos quais quase R$ 9 milhões serão repassados ao Artsul). Então, é um campeonato com o qual temos que ter muito cuidado, pois corremos sim, o risco de acontecer o pior”, alerta Siqueira.
“Temos exemplos de um Bonsucesso, por exemplo, que estava numa Série A em 2019 e, atualmente, disputa a terceira divisão do Rio. Olaria, Campo Grande e tantas outras equipes de tradição no futebol estadual. É uma preocupação que nós temos, e não queremos deixar acontecer. Então, o planejamento atual para uma série A2 é somente de intenção, pois no momento não temos condições de fazer o campeonato”, completa.
Dentro dessa nova realidade delicada surgem as oportunidades. Os novos rumos do Campeonato Carioca de uma forma geral, sem as cotas de televisão, abrem um leque novo de possibilidades, inclusive para um abraço maior da cidade, dos empresários e torcedores. As limitações para a criação de novos produtos praticamente foram superadas, e o Friburguense planeja envolver o município, de vez e de fato, no projeto do clube.
“A Série A2 vem trazer a oportunidade do envolvimento da cidade. Nova Friburgo ainda é conservadora na questão da rivalidade do futebol amador antigo, mas isso já melhorou muito. Há uma nova geração que nos trata com muito carinho. Mas na questão do empresariado, eles nunca tiveram muita oportunidade. Todas as placas de publicidade, por exemplo, pertenciam à emissora que comprava o campeonato. Restava só o espaço da camisa para vender, que conseguíamos, mas ficávamos limitados a criar coisas novas. A Série A2 e a saída da Globo nos trazem para um processo novo, que leva um tempo para estabilizar financeiramente. Ainda mais quando se deixa quando se deixa de ganhar R$ 750 mil e há uma dívida a ser paga”, pontua Siqueira.
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