Brasil fecha 2024 com pior índice de incêndios desde 2010

Crise ambiental é intensificada por fenômenos climáticos globais e pelas mudanças climáticas
quinta-feira, 09 de janeiro de 2025
por Liz Tamane
(Foto: Secom - Myke Toscano)
(Foto: Secom - Myke Toscano)
O ano de 2024, no Brasil, foi marcado pelo maior número de incêndios registrados desde 2010, com 278.229 focos, de acordo com o programa BD Queimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

Com quase 280 mil focos, aumento representa crescimento de 38,63% em comparação com 2022, ano em que o país registrou mais de 200 mil focos
Esse aumento acentuado, que representou um crescimento de 38,63% em comparação com 2022, ano em que o país havia registrado 200.699 focos de incêndio, reflete uma crise ambiental mais profunda, intensificada por fenômenos climáticos globais, como o El Niño, e pelas mudanças climáticas.

Em um cenário de seca histórica, a quantidade de incêndios no Brasil em 2024 não apenas ultrapassou os números de gestões anteriores, mas também trouxe à tona um debate acirrado sobre as políticas públicas ambientais e a resposta do governo federal frente aos desafios. 

Este panorama se torna ainda mais complexo quando se considera o contexto de discursos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em prol da preservação ambiental e de seu compromisso público de reduzir o desmatamento ilegal até 2030. Contudo, o aumento drástico das queimadas no país neste ano contrasta com esses objetivos e coloca em xeque a eficácia das estratégias adotadas até o momento.

A seca histórica e o fenômeno El Niño

A seca em 2024, apontada como a mais severa em 73 anos no Pantanal e em quatro décadas na Amazônia, é um dos principais motores para o crescimento dos focos de incêndio no Brasil. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, atribui a intensa estiagem, impulsionada pelo fenômeno El Niño, como a principal causa da multiplicação de queimadas. Este fenômeno climático, que está associado ao aquecimento das águas do Oceano Pacífico, não só agrava as secas, mas também favorece a propagação de incêndios devido à baixa umidade e altas temperaturas.

O impacto do El Niño se estendeu por toda a América do Sul, afetando países como Bolívia, Peru e Paraguai, que também enfrentaram um aumento considerável de focos de incêndio. Na região amazônica, a combinação da seca e das altas temperaturas favoreceu o aumento das queimadas, já que muitos focos de incêndio são provocados pela ação humana, seja por práticas ilegais de queimadas para a expansão da agricultura ou como resultado de incêndios descontrolados. 

A intensificação desse fenômeno climático deixou o Brasil vulnerável a uma onda de incêndios que se estendeu por boa parte do ano.

Regiões mais afetadas

O impacto das queimadas foi particularmente intenso em três biomas que, além de sua importância ecológica, enfrentam desafios específicos relacionados ao uso ilegal do fogo: a Amazônia, o Pantanal e o Cerrado.

A Amazônia, que liderou os registros de incêndios no Brasil, contabilizou 140.328 focos de incêndio, marcando um aumento de 42% em relação ao ano anterior. Este é o pior índice desde 2007 e reflete o impacto devastador das queimadas no maior bioma de floresta tropical do mundo, crucial para a regulação do clima global. Além disso, a região tem sido alvo constante de exploração ilegal de madeira e atividades de grilagem de terras, práticas que frequentemente geram incêndios criminosos e descontrolados. 

O Cerrado, com 81.432 focos de incêndio, registrou um aumento alarmante de 60%, enquanto o Pantanal viu um crescimento de 120%, com 14.498 ocorrências, o maior número desde 2020.

No caso do Pantanal, que já sofre com os efeitos das secas prolongadas, o incêndio se tornou um fenômeno ainda mais devastador. A área foi atingida por queimadas durante um período mais extenso em 2024, com incêndios já registrados a partir de junho, afetando ecossistemas delicados e colocando em risco diversas espécies da fauna e flora locais.

A região Sudeste, que inclui importantes áreas urbanas e rurais, também observou um crescimento expressivo de 145% nos focos de incêndio; o Centro-Oeste, que possui vastas áreas de cerrado, registrou aumento de 138%, com destaque para Mato Grosso, um dos maiores focos de desmatamento no Brasil.

A intensificação dos incêndios nestas duas regiões pode ser atribuída à combinação de práticas agrícolas e a proliferação de incêndios criminosos em áreas de pastagem e plantação. O uso do fogo como técnica de manejo agrícola tem sido apontado como uma das causas principais, além de fatores como desmatamento e o avanço de fronteiras agrícolas para áreas de vegetação nativa.

A “aliança criminosa” e o impacto das políticas públicas

A ministra Marina Silva, ao comentar sobre o aumento dos incêndios, denunciou o que ela chamou de "aliança criminosa de terrorismo climático", uma atuação conjunta entre setores que negam as mudanças climáticas e utilizam o fogo como método de destruição ambiental. A expressão reflete uma crítica à postura de certos segmentos da sociedade que ainda desafiam a urgência das políticas ambientais, ao mesmo tempo em que se beneficiam economicamente da destruição da natureza.

O governo federal, por meio de órgãos como o Ibama e a Polícia Federal, tem se esforçado para intensificar a fiscalização e desmantelar redes de crimes ambientais, mas os resultados até agora ainda são insuficientes diante da magnitude do problema. Em 2024, foram instaurados mais de 100 inquéritos para investigar as causas e responsáveis pelas queimadas ilegais, mas a quantidade de focos registrados sugere que o sistema de monitoramento e ação é superado pelo volume de atividades ilegais que ocorrem no país.

O Brasil não está sozinho nesse cenário de crise de incêndios. O aumento das queimadas também afetou diversos países da América do Sul, com destaque para o Equador, que registrou um salto de 248% no número de incêndios, alcançando 3.466 ocorrências. 

Este aumento global de incêndios evidencia o caráter transnacional da crise, que exige uma resposta coordenada entre os países da região. Além disso, é uma indicação clara de que o Brasil, como um dos maiores responsáveis pela preservação da biodiversidade e das florestas tropicais, possui uma responsabilidade ainda maior na luta contra as mudanças climáticas e a degradação ambiental.

Recuperação e a preservação ambiental

A situação dos incêndios em 2024 levanta sérias questões sobre a eficácia das políticas ambientais no Brasil. Enquanto o governo federal tenta aumentar os investimentos em fiscalização e controle de queimadas, o desafio é imenso. A seca extrema e os impactos das mudanças climáticas tornam o controle de incêndios ainda mais difícil, mas é preciso que as autoridades federais, estaduais e municipais se articulem para combater esse problema de forma mais eficiente.

Além disso, é essencial que se promova uma conscientização mais profunda sobre os impactos dos incêndios na biodiversidade e no equilíbrio ecológico. A meta de zerar o desmatamento ilegal até 2030 e de implementar políticas de proteção ambiental para os biomas brasileiros exige, urgentemente, uma resposta mais rápida e eficaz. 

O país tem um papel crucial em mitigar as mudanças climáticas globais, e sua postura no combate ao fogo e na proteção das florestas será decisiva para o futuro ambiental da região e do planeta.

 

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