De acordo com o Centro de Controle de Doenças e Prevenção americano (CDC), uma em cada 44 crianças de 8 anos de idade é diagnosticada com o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA). O relatório publicado em dezembro do ano passado representa um aumento de 22% em relação ao estudo anterior, divulgado em 2020, que mostrava o diagnóstico de autismo em uma a cada 54 crianças da mesma idade. No Brasil, não há um número fechado de pessoas inseridas no espectro autista, mas se aqui tiver a mesma prevalência dos Estados Unidos da América (EUA), o país tem hoje cerca de 4,84 milhões de autistas.
Neste sábado, 2, celebra-se o Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo, data criada em 2007 pela Organização das Nações Unidas (ONU), com o objetivo de alertar as sociedades e governantes sobre esse transtorno do neurodesenvolvimento, ajudando a derrubar preconceitos e esclarecer a todos. O tema da campanha deste ano é “Lugar de autista é em todo lugar”, mostrando que independente e da situação, a pessoa inserida no espectro autista tem o direito e pode levar uma vida normal.
O diganóstico
O diagnóstico do transtorno é difícil e demorado. Não há um exame que confirme o autismo. A jornalista Isabela Stutz, mãe do pequeno Enzo, de 3 anos, começou a identificar um atraso nele para falar e buscou a ajuda de um fonoaudiólogo. “Estava incomodada pela fala do Enzo não evoluir. Ele também gostava muito de palavras em inglês e mostrava seletividade com algumas texturas de alimentos. Quando descrevi isso para a fonoaudióloga, ela falou da possibilidade do TEA. Fomos a neulorogista infantil, neuropsicóloga, terapeuta ocupacional e, com todos os questionamentos e observações, depois de seis meses, chegamos ao diagnóstico de que o Enzo é autista”, disse ela.
Antigamente, o TEA era considerado um transtorno de meninos. Hoje, apesar de ter incidência menor, já se sabe que elas também podem ser inseridas no espectro autista. É o caso da pequena Isis, de 3 anos. A mãe dela, Maxsuele Tavares Santos, conta que até um ano e seis meses, nunca desconfiou do transtorno. “Foi uma surpresa e um desafio, porque com uma porcentagem tão pequena de autismo em meninas, até o último minuto antes do diagnóstico pensávamos que poderia ser qualquer outra coisa. A Ísis sempre foi uma criança "normal". Quando completou um ano, já andava e falava algumas coisas até 1 ano e 5 meses. Quando fez 1 ano e 6 meses, ela começou a andar na ponta do pé, brincar de girar as panelas e ficar parada na frente da TV vendo desenho. Mas, até então, achávamos que era só uma fase e, literalmente, de um dia para o outro ela parou de falar. Depois de 2 meses sem falar nada resolvemos procurar uma fonoaudióloga. Nunca imaginamos que poderia ser autismo já que nunca tínhamos conhecido alguém com o transtorno. Desde o início do tratamento, a fonoaudióloga alertava sobre a hipótese de ser autismo e encaminhou a Ísis para um neurologista que, após examinar vídeos dela e depois da entrevista, a diagnosticou como autismo leve. Há seis meses, ela fez uma nova consulta com a neurologista e foi diagnosticada com autismo moderado para o severo”, explicou Maxsuele.
Já o pequeno Max, de 4 anos, filho de Sheila Costa Silva Pareschi, demonstrava algumas características desde bebê. “Ele nunca atendeu pelo nome, não sentia dor, frio, nem calor. Aprendeu as letras com 1 ano, logo que passou a olhar um pouquinho para a TV. Falava frases curtas e gestos. Com 2 anos e 6 meses teve poda neuronal, esqueceu tudo. Parou até de dar tchau. E ficou com ecolalia de duas frases: a porta está trancada e o copo está vazio. Aí, foi confirmada a suspeita de autismo”, descreveu ela.
Diferente de pessoas com down, quem é autista geralmente não tem estereotipia, o que leva muitas pessoas a não acreditarem no diagnóstico. “Uma das perguntas que mais ouço é: Enzo é autista mesmo? Porque ele não tem cara...” A mesma experiência é compartilhada por Maxsuele, que já ouviu frases tipo "Nossa, ela parece tão normal. Tem certeza que ela é autista? "
Luta contra o capacitismo
O preconceito talvez seja o maior desafio que o familiar de uma pessoa autista possa enfrentar. E, com a divulgação sobre deficiências, sobre o autismo, uma palavra vem ganhando espaço no vocabulário, mas espera-se que perca espaço na ação: o capacitismo, que é a prática que consiste em conferir a pessoas com deficiência tratamento desigual (desfavorável ou exageradamente favorável), baseando-se na crença equivocada de que elas são menos aptas às tarefas da vida comum.
“Uma vez no parquinho uma mãe de uma criança que estava brincando com a Ísis perguntou o motivo dela não falar eu disse que ela era autista. A mãe nem disfarçou, fez uma cara estranha e logo tirou a filha dela de perto da Ísis. E na nossa família, no início, não podíamos falar a palavra "autismo". Era um assunto que todos desconversavam e algumas pessoas falavam que ela ia ser "curada" mesmo sem saber que não tem cura. Isso tudo dói bastante , mas sempre explico da melhor forma para poder se tornar um assunto sem tabu”, revelou Maxsuele.
Todo o potencial dos três pequenos, Enzo, Ísis e Max, é trabalhado em diversas terapias: fonoaudiólogos, terapia ocupacional, psicoterapia, entre outras. A busca é para que eles sejam o melhor dentro da realidade deles , vivendo um dia por vez. “Os autistas podem frequentar todos os lugares, podem ser quem querem ser. Temos autistas engenheiros, médicos, professores. Que a gente consiga apagar da sociedade todo o descrédito, o capacitismo. Que a gente possa normalizar que cada um é um ser único, mas que todos tem os mesmo direitos”, clama Isabela.
E, a luta dessas mães, além da rotina desafiadora diária de levar a terapias, escola, esporte, ainda é ter que lidar com preconceitos, falta de profissionais qualificados, falta de terapias na saúde pública, ações judiciais. “Dizem que quando nasce uma mãe atípica também nasce uma batalhadora, pois muitas terapias que, por vezes, são indicadas o plano não cobre e pelo SUS é muito difícil conseguir”, explica Isabella. “Existe fé e pedir muita energia a Deus para continuarmos a maratona de terapia todos os dias em duas clínicas particulares, Caps infantil, Apae, neuropediatra, psiquiatra infantil, medicação, exame, ação judicial e tam bém energia para curtir Max. O importante é sorrir como ele faz o tempo todo e ser feliz”, declarou Sheila.
“Eu não sou de romantizar o autismo. É uma das coisas mais difíceis que eu já tive que enfrentar na minha vida até hoje. Cada dia é muito diferente do outro. Mas, o autismo me mostrou uma força que eu não imaginava que eu poderia ter. E a Ísis me ensinou que ninguém é perfeito, que só com muito amor tudo fica muito mais fácil e o amor que ela distribui é lindo”, finalizou Maxsuele.
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