No Dia da Advogada, mulheres que relatam seus principais desafios na profissão

“Coragem é algo que definitivamente não nos falta”, diz profissional do Direito
terça-feira, 15 de dezembro de 2020
por Guilherme Alt (guilherme@avozdaserra.com.br)
Themis, a deusa da Justiça na mitologia grega
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Nesta terça-feira, 15, celebra-se o Dia da Mulher Advogada. A comemoração, ainda pouco conhecida, é em prol do respeito e da efetiva igualdade de gêneros no país. Essa data foi criada como homenagem a Myrthes Campos, a primeira advogada do Brasil. Em 1898 foi a primeira mulher a atuar como defensora no Tribunal do Júri.

Myrthes fez questão de ressaltar a importância da presença feminina nas instituições judiciais: “Tudo nos faltará: talento, eloquência, e até erudição, mas nunca o sentimento de justiça; por isso, é de esperar que a intervenção da mulher no foro seja benéfica e moralizadora, em vez de prejudicial como pensam os portadores de antigos preconceitos”. A informação foi publicada no jornal O País, do Rio de Janeiro, na edição de 30 de setembro de 1899.

Em seu pioneirismo, a advogada Myrtes Campos inspirou milhares de mulheres a conquistarem seus lugares e derrubarem ambientes predominantemente ocupados por homens. Em Nova Friburgo, A VOZ DA SERRA reuniu depoimentos de algumas profissionais do Direito que falaram sobre os desafios da profissão que abrange diversas áreas e, de acordo com elas, requer ética, coragem e sede por justiça. Confira:

Tamires Santos Correa

“Um dos principais desafios da advocacia nos dias de hoje, é o envolvimento de muitas atividades que vão além da área jurídica. Além do controle dos prazos, controle financeiro e atualizações do mundo jurídico, devemos oferecer e manter um bom relacionamento com os clientes. Trabalho principalmente com Direito de Família, que é essencial a compreensão, entender o que o cliente pensa e sente, e assim, esclarecer sobre a solução jurídica a ser aplicada ao caso. Antes de ingressar no curso de direito, sempre busquei ajudar as pessoas a resolverem seus problemas da melhor forma possível, sem conflitos e sofrimento. Vejo o Direito como uma ferramenta com a finalidade de ajudar pessoas a solucionarem seus problemas, buscando equilíbrio onde muitas das vezes parecem impossíveis e injustos. É gratificante como mulher e advogada, representar, defender interesses e lutar pela valorização no meio jurídico. O Direito é lindo, precisamos acreditar e lutar pela aplicação das leis em busca da justiça.”

Jeanne Faria 

“Eu sempre gostei da área jurídica. Na verdade, sempre falei para os meus pais que seria juíza e hoje sou juíza de paz. Gosto de desafios e escolhi a área jurídica porque me permite ajudar as pessoas de uma forma técnica e encarando os desafios jurídicos. Atuo nas áreas de família e sucessões com mais intensidade. Enquanto presidente de comissão os desafios são enormes quer com a sociedade civil quanto com os órgãos públicos. Essas áreas precisam estar interligadas para que tudo flua bem. Todos os casos são desafiadores sejam eles mais simples ou complicados. O meu maior desafio de todos os dias é fazer com que a sociedade ainda machista entenda que as mulheres podem estar à frente de cargos e profissões que desejarem.”

Enayle Gama

“Escolhi o Direito por ter passado por alienação parental. Fiquei motivada a ajudar pessoas a não passarem pelo que passei. Na faculdade conheci outras áreas do Direito que me interessaram, mas a área de família me cativou. Me fez querer trabalhar com crianças, incentivar outras pessoas a querer investir nessa área. No Tribunal de Justiça, conheci o Juizado Especial Criminal (Jecrim). Nele alguns relatos de acusações feitas a um padrasto e que no fim ele era inocente me chamaram atenção. Já formada, conheci Sérgio Thompson Flores, ex diplomata, acusado injustamente por sua ex-esposa. Depois de um tempo me chamou para conhecer diversos grupos em que ele denominou Justiça para Todos. São grupos que visam a ajudar homens falsamente acusados na Lei Maria da Penha e pais que sofriam de alienação parental e foram afastados do lar, também por falsas acusações. Em um ambiente predominantemente dominado por homens, fui recebida com menos resistência e muito respeito. Cerca de 80% dos casos de denúncia na Lei Maria da Penha são falsos, segundo os dados da psicóloga forense Glicia Barbosa. Isso me motiva a continuar nessa área. Acabei por atingir a área criminal e familiar ao mesmo tempo, combatendo a falsa acusação para que a família fosse protegida.”

Aline Freitas Spinelli

“A atividade da advogada criminal é primeiramente fazer frente ao estado opressor, levando em consideração que a advogada criminal, geralmente  já se apresenta com uma postura hipossuficiente diante de uma estrutura opressora do Estado que, através do MP, dispõe de uma super estrutura com dinheiro, máquina, policiais e o advogado de defesa vem sozinho buscando garantir a dignidade do cliente. Em muitas vezes ele não dispõe das mesmas armas, dos mesmos mecanismos em uma condição de equilíbrio para fazer frente ao Estado opressor. Um dos grandes desafios é construir uma retórica adequada que permita a advogada influenciar com respeito e com isonomia, naquela decisão judicial, que vai surtir efeito na vida do cliente. Essa argumentação qualificada exige da profissional uma preparação e uma atualização porque ela precisa confirmar a sua competência, até por ser mulher. A mulher carrega uma sensibilidade muito maior para lidar com o que é muitas vezes mais reprovável na natureza humana. A atuação da advogada criminal, com a sua sutileza e jogo de cintura, traz leveza que é necessária para a condução do trabalho. Eu fiz teatro antes de fazer Direito. A arte me trouxe essa sensibilidade, essa ausência de julgamento, essa condição que não sei se é paixão ou admiração e me trouxe com unhas e dentes, com corpo, alma e sangue para a atividade da defesa criminal. Atuei em alguns casos famosos e marcantes de Friburgo, como no processo dos Irmãos Necrófilos, quando tive a experiência de estar ao lado do dr. Marcelo Barucke, atuei na defesa de sindicalistas e em um caso peculiar em que um pai idoso e religioso, atirou no agressor de sua filha, após suportar meses de tortura. Nós temos que tomar muito cuidado e conceber a ideia da ética, que é o principal condão da advocacia criminal. A ética é fundamental. A área criminal é muito sensível.”

Lia Rodrigues

“Um grande advogado brasileiro, Sobral Pinto, disse que a advocacia não é profissão de covardes. Se eu pudesse acrescentar algo, diria que a advocacia exercida por mulheres exige uma dose extra de coragem. Em uma área profissional tradicionalmente marcada pela atuação de homens, os desafios diários que se impõem a uma mulher são muito mais sensíveis e dignos de nota. Uma dose de preconceito aqui, de desdém ali, uma postura pouco colaborativa são partes da rotina das advogadas. Mas isso não assusta, desafia! Não desestimula, incentiva! Não limita, faz crescer! Afinal, coragem é algo que definitivamente não nos falta e a força de vontade faz compensar todo o resto. Quanto à minha experiência pessoal, aos 17 anos, ao fazer vestibular, escolhi o caminho certo e venho seguindo firme nele. Optei pelo Direito por seu imenso grau de fascínio e encanto. Permaneço no Direito movida por ideais de igualdade, mudança social e justiça. A vida me fez advogada e fez várias outras mulheres advogadas, o que só engrandece a profissão. Se me perguntarem se existe igualdade de gênero na advocacia, eu me recusarei a dizer que não existe. Apenas direi que não existe ainda, mas isso é simples questão de tempo, mero detalhe de cronologia, porque se tem uma coisa da qual eu não duvido é a força da advogada brasileira.”

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