A escolha por Belém, capital do Pará, para sediar a próxima Conferência do Clima, em novembro, foi alvo de críticas pela mídia internacional devido a precária infraestrutura da cidade e do transporte público para receber 50 mil pessoas. Faltam hotéis, voos e vias, sobram problemas logísticos. Mesmo assim, a realização da COP na Amazônia é vista como uma oportunidade única para discutir as mudanças climáticas em um território diretamente afetado pelos seus impactos, com potencial para o desenvolvimento sustentável da região e fortalecimento do protagonismo do Brasil na agenda ambiental global.
A 30ª edição da Conferência irá quebrar uma tendência (hipócrita) dos últimos três anos quando as reuniões aconteceram em estados petrolíferos - Sharm el-Sheikh, Dubai e Baku. Quem esteve nessas últimas reuniões contou anedotas sobre quantos milhares de passos seus relógios registraram ao andar pelos inúmeros pavilhões, com metragem faraônicas, durante as negociações. Os anfitriões conseguiram vender sua realidade de muito glamour e desenvolvimento à base de derivados do petróleo, mas entregaram pouca negociação efetiva.
Embora em Dubai o termo “transição para longe dos combustíveis fósseis” tenha sido usado em um texto das negociações pela primeira vez, faltou definir o “quem, quando e como”, resultando em um movimento mais simbólico do que efetivo. Essas questões persistiram em Baku e o financiamento discutido ficou um bilhão aquém do esperado, gerando a “ressaca de Baku” que provavelmente irá bater em Belém.
As reuniões pré-COP, realizadas no mês passado em Bonn, pouco avançaram nesse ponto crucial, o que gera um cenário de insegurança para a reunião que acontecerá em pouco mais de três meses, pois as adaptações às mudanças climáticas dependem de investimento.
Com as metas das negociações deste ano envolvendo adaptações das nossas infraestruturas e biodiversidade, estruturação e detalhamento do financiamento climático, transição energética justa, além da integração das políticas setoriais (energia, transporte, agropecuária), a Amazônia é uma escolha que simboliza todas as dificuldades logísticas da região e evidencia as contrapartidas entre a preservação do meio ambiente e o crescimento econômico do capitalismo moderno.
A participação de lideranças indígenas, ribeirinhas e quilombolas nas negociações também é impulsionada pela localização no bioma. O que persiste sendo uma incógnita são os benefícios reais para a cidade de Belém para depois de novembro. Apesar de todo o entusiasmo em torno do evento e da vontade de ver o protagonismo brasileiro nas negociações deste ano, é impossível ignorar algumas contradições simbólicas para o sucesso de um acordo global como o descompasso entre o discurso do anfitrião sobre preservação ambiental e crescimento sustentável e o recente leilão para a exploração de petróleo e gás na Foz do Amazonas, além da ausência do maior emissor global, os Estados Unidos.
Embora a sua falta possa manchar o sucesso nos esforços a curto prazo, por outro lado, pode-se vislumbrar metas mais ambiciosas e robustas para os poluidores já que não haverá contestação americana. Talvez o melhor ainda possa acontecer.
(*) Isabela Braga é bióloga e cientista climática. Escreve nas edições de fim de semana
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