O governo do Estado do Rio prepara para semana que vem o lançamento de um protocolo para orientar médicos na hora de escolher quais pacientes irão para leitos de UTI. Intitulado “Recomendações éticas para destinação de cuidados intensivos dos casos suspeitos/confirmados por Covid-19 nas unidades da rede estadual de saúde”, o documento já foi encaminhado para ser publicado no Diário Oficial do Rio de Janeiro, quando entrará em vigor, de acordo com um despacho interno da Secretaria estadual de Saúde obtido pela CNN Brasil. O Rio de Janeiro tem, hoje, 372 pessoas aguardando por um leito de UTI.
O documento tem como objetivo "salvar o maior número de vidas e o maior número de pessoas com probabilidade de sobreviver por mais tempo após o tratamento". Para definir quais são essas pessoas, há dois critérios técnicos. O primeiro avalia como o paciente está, medindo a situação de órgãos como coração, pulmões, rins e fígado.
Categorização por notas
O segundo critério é a investigação de doenças pré-existentes que possam influenciar na sobrevida do paciente após sua saída da unidade de tratamento intensivo. Para cada critério, há uma nota que vai de zero (situação boa) e 24 (situação ruim). Quanto menor a nota, maior a chance de o leito ser liberado para o paciente.
Segundo o jornal Extra, quem tiver algum problema que possa ser fatal, independentemente da Covid-19, em até um ano, ganhará 4 pontos e ficará atrás na fila de quem não tiver mal algum (0 ponto) ou de quem tenha uma comorbidade que permita sobrevida maior do que um ano (2 pontos).
Idade é critério de desempate
O documento também prevê critérios de desempate, caso haja pontuações idênticas. O primeiro é se o paciente está em ventilação mecânica, já ligado a um respirador. O segundo é a idade do doente. Os mais jovens, com até 60 anos, ganharão uma vaga antes dos que têm entre 61 e 80 anos. Os acima dos 80 ficarão por último na disputa por leito. De acordo com a proposta, profissionais que atuem diretamente no combate ao coronavírus terão prioridade, caso precisem de um leito de CTI, e passarão à frente de todos. Por último, o lugar será decidido pela ordem de solicitação da vaga.
Segundo o Extra, o documento já foi assinado por Renata Carnevale de Miranda, subsecretária estadual de Regulação e Unidades Próprias, e aguarda apenas o aval do secretário de Saúde, Edmar Santos, para ser publicado no Diário Oficial. O protocolo foi desenvolvido pelos integrantes da secretaria em conjunto com outras entidades, como o Conselho Regional de Medicina do Rio e a Academia Nacional de Cuidados Paliativos. A escolha terá que ser feita porque haverá “uma inevitável sobrecarga dos equipamentos de saúde quando alcançado o período de ápice de infecção, havendo a imediata necessidade de se promover soluções que evitem o colapso da rede estadual”.
Triagem baseada em catástrofes
Segundo o texto, o grupo de trabalho levou em consideração os “Princípios de Triagem em Situações de Catástrofes” da Associação de Medicina Intensiva Brasileira, a resolução do Conselho Federal de Medicina que estabelece os critérios de admissão e alta em unidades de terapia intensiva, além de um protocolo publicado no “Journal of the American Medical Association”.
Segundo a CNN Brasil, para entrar em vigor em todo estado, as recomendações ainda precisam ser referendadas em uma reunião do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro, marcada para a próxima terça-feira. De acordo com Sylvio Provenzano, presidente do órgão, o protocolo vai ajudar médicos jovens que já estão na linha frente de combate a COVID-19. “Temos recebido reclamações dos médicos, que não sabem qual paciente deveria ir para o CTI. Se tivesse uma fartura de leitos, todos iriam. Não temos. Então essa escolha precisa ser orientada e mais segura”, disse Provenzano à CNN Brasil.
Escolha de Sofia
A CNN entrou em contato com as quatro associações médicas que participaram da elaboração do protocolo e confirmou que o teor do texto não deve ser alterado. A proposta é discutida há cerca de um mês e tem a intenção de interromper a aleatoriedade com que pacientes têm sido escolhidos para ocupar leitos de CTI, n uma espécie de "escolha de Sofia".
Já está definido, por exemplo, que a idade dos pacientes graves não é um critério inicial para que o médico decida quem vai para uma UTI. Em nota, a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, que participou do debate, informou que o protocolo do Rio não será como na Itália, em que mais jovens tinham direito automático às UTIs na frente dos mais velhos - a idade será usada quando houver empate nos pontos computados pelos médicos, ou seja, se duas pessoas tiverem a mesma chance de sobrevivência, o mais jovem será o escolhido para ocupar o leito.
Além do Cremerj e da Sociedade Brasileira de Geriatria, também participaram das discussões sobre o protocolo a Academia Nacional de Cuidados Paliativos e a Sociedade de Terapia Intensiva do Rio de Janeiro. Em nota, a Secretaria de Saúde do Rio informou que os critérios são para orientar profissionais de saúde e reafirmou seu compromisso com ações para evitar o maior número de mortes.
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