É hora de reconquistar o público capaz de garantir a sobrevivência do jornalismo

Em 2024, mais do que métricas de audiência, se seguirmos as indicações que as crianças e os jovens nos dão ao falar sobre as notícias, o conteúdo jornalístico ganhará qualidade e relevância
sexta-feira, 05 de abril de 2024
por Jornal A Voz da Serra
(Foto: Freepik)
(Foto: Freepik)

“Quem aqui já leu um jornal impresso no papel?”, perguntamos para os nossos alunos iniciantes do curso de Jornalismo em 2023. A resposta, já imaginávamos, foi óbvia: nenhum. Nem em Porto Alegre (RS) nem em Campinas (SP), cidades onde lecionamos, os universitários que escolheram ser jornalistas têm o hábito de folhear páginas para se informar. A diferença é que os futuros repórteres gaúchos disseram que nunca tinham visto uma Folha de S. Paulo ou outro jornal impresso em formato standard. A referência para eles são os tabloides, comuns no estado, misturados com brinquedos, balas e outras bugigangas que enxergam de longe nas poucas bancas de revista que restam. 

Se o jornalismo no papel ficou em um passado muito distante para as novas gerações, a consulta a portais de notícia também já não interessa mais. A edição de 2023 do Digital News Report, pesquisa anual publicada pelo Instituto Reuters, aponta que a maioria das pessoas com menos de 35 anos usa as redes sociais, mecanismos de pesquisa ou agregadores de conteúdos para ler notícias. Algumas análises sobre essas tendências chegam a dizer que o desinteresse dos jovens por notícias sempre existiu. Será? Para compreendermos melhor essa relação e refletirmos como ela se dará em 2024, é preciso antes pensar em outras questões, como quem abandonou quem primeiro e o que é notícia para os jovens de hoje. 

O fato é que qualquer grupo só é reconhecido socialmente no mundo capitalista quando consome. Para o jornalismo — sempre com um olho nos valores da profissão e outro no mercado —, os jovens, pelo menos os com certo poder aquisitivo, só começaram a interessar quando, entre os anos 1950 e 1960, passaram a formar uma categoria social distinta das outras, com características próprias e com necessidades específicas de consumo. Eram as culturas juvenis que surgiam, representadas no cinema, na música, na literatura, nos quadrinhos, nas artes visuais e, consequentemente, no jornalismo. 

No mundo todo, jovens passaram a ser relacionados com um estilo de vida marcado pelo desejo de liberdade, diversão, aventura e pelo interesse por entretenimento. E todas essas ambições se transformaram em produtos.

A descoberta do jornalismo pela juventude

Foi a partir dessa época que a imprensa direcionada aos jovens cresceu, já que parte desse público ganhou maior poder de consumo. Foi também o momento em que o jornalismo passou a ser segmentado por faixas etárias — entre outros nichos. A primeira revista brasileira voltada para adolescentes foi a Pop, lançada pela Editora Abril em 1972 e que se dizia direcionada para “rapazes e moças” de 14 a 20 anos. Depois dela, uma série de revistas passou a mirar essa faixa etária, acompanhando o crescimento desse mercado também no cinema, na música, na televisão. 

Nos anos 1980 e 1990, o jornalismo para os jovens cresceu ainda mais. Foram criados cadernos especializados, surgiu a preocupação com linguagens e estéticas que agradassem especificamente aos jovens. A revista Capricho é um exemplo disso: em 1985, conseguiu mudar a imagem que carregava como publicação de fotonovelas para se tornar uma confidente das meninas, que buscavam na revista informações sobre sexo, por exemplo, e não se sentiam à vontade para falar com suas mães e mesmo com suas amigas sobre o assunto. A tiragem média de 80 mil exemplares do início daquele ano pulou para 330 mil em 1987.

Todo esse contexto já não faz mais sentido hoje, é claro, e uma grande preocupação de quem produz jornalismo para jovens é justamente que a adolescência e a juventude são períodos de muitas mudanças e, portanto, difíceis de acompanhar, ainda mais com as mutações culturais de cada época. Além disso, as transformações tecnológicas e de formatos de produção de conteúdo são cada vez mais rápidas. 

Mas, afinal, se os jovens se interessavam por jornalismo no passado, por que atualmente não se interessam? É evidente que essa questão é muito complexa e não tem resposta única. A maioria das pesquisas de mercado indica que a solução para as grandes empresas se aproximarem dos mais jovens é explorar esses formatos que lhes interessam mais, ou seja, é produzir notícias, por exemplo, no TikTok. Nossos estudos têm indicado, no entanto, que isso, ainda que interessante, não é uma receita infalível. Ao contrário.  

Esse movimento nos faz pensar que o mercado brasileiro tende, em 2024, ainda que de modo tímido, a seguir redescobrindo as infâncias e juventudes como público. Cremos que seja esse o caminho para que o jornalismo reconquiste parcela da audiência que pode ser responsável pela sua própria sobrevivência. Porque, mais do que o aumento de métricas de audiência, se repórteres e editores seguirem indicações que as crianças e os jovens nos dão ao falar sobre as notícias, os relatos com certeza ganharão qualidade e relevância.

(Texto integral em faroljornalismo.substack.com - Por Juliana Doretto e Thaís Helena Furtado)

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