O samba é, sem dúvida, uma das manifestações culturais mais marcantes do Brasil. Com raízes africanas, mas moldado pela diversidade cultural que caracteriza o país, o ritmo ultrapassa as fronteiras do carnaval, consolidando-se como um símbolo da identidade nacional. Desde os primeiros batuques trazidos pelos africanos escravizados até as rodas de samba contemporâneas, o gênero carrega consigo a história, a resistência e a alegria do povo brasileiro.
Mais que música, o gênero é uma das principais manifestações culturais brasileiras
As origens do samba remontam ao século XIX, em meio à mistura de culturas africanas e europeias no Brasil. Os batuques realizados por africanos escravizados encontraram espaço nas comunidades urbanas do Rio de Janeiro, especialmente na região conhecida como Pequena África, onde hoje está o bairro da Saúde, na capital. Foi ali, entre terreiros, festas e celebrações populares, que o samba começou a tomar forma como conhecemos hoje.
Em 1916,
Pelo Telefone, de Donga e Mauro de Almeida, foi gravado como o primeiro samba registrado, marcando o início de sua profissionalização. A partir daí, o gênero se expandiu, ganhando força com a criação das escolas de samba e com artistas que transformaram o samba em uma linguagem universal, como Noel Rosa, Cartola e Carmen Miranda.
Muito além do carnaval
Embora associado ao carnaval, o samba se manifesta de diversas formas durante todo o ano. O samba-enredo, característico das escolas de samba, é apenas uma vertente. Há também o samba de roda, tombado como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela Unesco, que mantém vivas as tradições afro-brasileiras, especialmente no Recôncavo Baiano.
Já o samba-canção, que floresceu nas décadas de 1930 e 1940, trouxe uma abordagem mais intimista e melódica, enquanto o partido-alto e o pagode reforçaram o caráter comunitário e festivo do gênero. Rodas de samba, como as do Cacique de Ramos, desempenham um papel essencial na manutenção e renovação do estilo, reunindo gerações de músicos e admiradores.
Samba como resistência cultural
O samba também é uma expressão de resistência. Durante o Estado Novo, de Getúlio Vargas, e a ditadura militar, o gênero enfrentou censura e preconceito, sendo frequentemente associado a grupos marginalizados. No entanto, artistas como Beth Carvalho, Clara Nunes e Zeca Pagodinho ajudaram a consolidar o samba como um símbolo da cultura popular brasileira, superando as barreiras impostas.
Beth Carvalho, carinhosamente conhecida como Madrinha do Samba, foi uma das maiores representantes dessa luta cultural. Assim que o árbitro decretou a vitória histórica do Botafogo na Copa Libertadores da América, por 3 a 1 sobre o Atlético-MG, no Monumental de Nuñez, em Buenos Aires, o estádio foi tomado pelo som de "Vou Festejar", um dos maiores sucessos da eterna botafoguense Beth. A canção, que ecoou em alto volume pelo sistema de som, tornou-se o hino perfeito para celebrar o inédito título da Libertadores. A torcida alvinegra acompanhou em coro, entre lágrimas e abraços, especialmente no trecho marcante: "Chora, não vou negar, chegou a hora, vais me pagar. Pode chorar, pode chorar". Antes mesmo do apito inicial, Beth já havia sido homenageada no show do pré-jogo, quando o humorista Marcelo Adnet, representando o Botafogo, cantou uma música alvinegra e exaltou com emoção: "Viva, Beth Carvalho!".
Após seu falecimento, em 2019, o Botafogo, clube de futebol de seu coração, prestou uma homenagem marcante antes de um jogo contra o Bahia, no estádio Nilton Santos. Torcedores ergueram bandeiras com mensagens como “Obrigado, Madrinha” e “Vou Festejar”, uma referência ao clássico samba imortalizado por Beth. O tradicional minuto de silêncio deu lugar a um minuto de samba, em uma celebração que refletiu a alegria e a energia que ela representava.
Novos talentos e a renovação do samba
(Foto: Prefeitura do Rio de Janeiro)
Nos últimos anos, o samba tem se reinventado, dialogando com outros gêneros musicais e conquistando novos públicos. Artistas contemporâneos, como Xande de Pilares e Teresa Cristina, têm contribuído para manter a tradição enquanto incorporam elementos modernos, expandindo os horizontes do gênero.
O samba brasileiro tem ganhado reconhecimento internacional, com festivais e shows dedicados ao gênero em países como França, Japão e Estados Unidos. Essa projeção reflete não apenas a universalidade do ritmo, mas também o poder do samba como um embaixador da cultura brasileira.
Samba: patrimônio imortal
Mais do que um gênero musical, o samba é um patrimônio imaterial que celebra as alegrias e dores do Brasil. Ele é, ao mesmo tempo, uma conexão com o passado e uma expressão do presente, capaz de unir diferentes gerações e classes sociais.
Seja nas escolas de samba do Rio de Janeiro, nos terreiros do Recôncavo Baiano ou nas rodas de samba das periferias, o samba permanece como um símbolo da alma brasileira: resiliente, criativo e apaixonado. Muito além do carnaval, ele é um testemunho vivo da riqueza e diversidade cultural do Brasil.
A homenagem do Botafogo a Beth Carvalho, com bandeiras, canto e celebração, ilustra como o samba e seus ícones transcendem espaços e momentos, unindo paixões nacionais como a música e o futebol. Celebrar o samba é, acima de tudo, celebrar o Brasil, em todas as suas cores, sons e histórias.
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