“Floradas na Serra”, o primeiro romance de Dinah Silveira de Queiroz, publicado em 1939, tem como pano de fundo uma doença mortal no começo do século 20 — a tuberculose. A obra traz um retrato pungente das famosas pensões (ou sanatórios) em que homens e mulheres acometidos pela doença eram internados em Campos do Jordão (SP).
Ao perder a mãe para a doença, aos três anos, a dolorosa despedida ficou gravada na memória de Dinah
Através da pensão de Dona Sofia, em Abernéssia, que abriga protagonistas como Elza e Lucília, a autora apresenta o ambiente, os demais personagens e a atmosfera local. Nesse contexto, a obra nos envolve com a solidão vivenciada por seus “hóspedes”, a exclusão do convívio social por conta da doença e a perspectiva da morte.
Ao contrário da tendência regionalista dos anos 1930, Dinah escreveu Floradas na Serra focando em uma abordagem mais psicológica, levando o romance a alcançar um absoluto sucesso de público. Em duas semanas, ele desapareceu das prateleiras das livrarias devido ao interesse dos leitores por sua história.
Além de abordar a tuberculose, Floradas… também traz lembranças de infância da autora. Aos três anos, Dinah ficou órfã de mãe, e ficou gravada em sua memória a dolorosa despedida: de longe, sua mãe pede que retirem o laço do cabelo da menina para que ela possa beijá-lo. Esta cena, que aconteceu na vida real, está presente no livro, com Dona Dinorá despedindo-se das filhas Dinah e Helena.
De vila sanitária a cidade turística
Dinah evoca a memória coletiva de uma época em que as pessoas tinham os próprios talheres e copos separados nas hospedarias para impedir a contaminação por tuberculose. Até a década de 1930, não havia política preventiva para tratar a tuberculose.
No entanto, bem antes, em 1908, o médico Emílio Ribas voltou da Europa após ter estudado a profilaxia da tuberculose e tem a ideia de transformar Campos do Jordão (que ainda não tinha esse nome), um vilarejo à época, em uma vila sanitária para tísicos. Em 1926, a vila foi reconhecida como Prefeitura Sanitária de Campos do Jordão, que mais tarde se tornaria uma importante cidade turística.
Naqueles tempos, a tuberculose era responsável por 70% das mortes por doenças infecciosas. Era, então, uma enfermidade muito comum, que acometeu pessoas famosas, como Nelson Rodrigues e Manuel Bandeira, e muito antes, Noel Rosa, Casimiro de Abreu, Castro Alves, José de Alencar. Entre 1926 a 1941, as pensões de Campos do Jordão chegaram a receber 3.563 hóspedes com tuberculose.
Apesar de historiadores afirmarem que não eram apenas os ricos que tinham acesso a Campos do Jordão, predomina a ideia de que se tratava de uma doença de ricos, uma vez que eram eles que recebiam o tratamento da “climoterapia”, ou seja, refugiar-se em lugares montanhosos para frear o avanço da doença.
Os livros de Dinah
Floradas na Serra foi o primeiro passo de Dinah Silveira de Queiroz na carreira literária, que inspirou adaptações para o cinema e a televisão, incluindo um filme em 1954, uma telenovela em 1981 e uma minissérie em 1991. Em seguida, ela escreveria outras obras que se tornariam clássicos da literatura brasileira, como A Muralha, que virou minissérie na TV Globo, em 2000.
E ainda: A Sereia Verde, Margarida La Rocque, As Aventuras do Homem Vegetal, O Oitavo Dia, As Noites do Morro do Encanto, Eles Herdarão a Terra, Os Invasores, A Princesa dos Escravos, Verão dos Infiéis, Comba Malina, Guida, Caríssima Guida, entre outros romances, contos, novelas, crônicas, peças teatrais.
A literatura de Dinah é um retrato interessante do que era ser uma mulher branca, escritora e de classe média naquele Brasil dos anos 1940. E o carinho por sua primeira obra, foi tornado público por esta declaração para a revista Manchete, em 1954:
“Defendi meu primeiro romance quando poderia abandoná-lo. Muitos autores renegam seus livros de estreia. Tenho, em relação a Floradas na Serra, porém, uma atitude de respeito. Não será a minha obra favorita, pelo contrário. Mas sabe o que representa para mim? Cem mil leitores, e dentre eles milhares de amigos. Sou humildemente grata a essa renovada simpatia.”
(Fonte: www.queridoclassico.com)
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