Em 2016 começou a peregrinação da administradora Rita de Cássia Novaes, com o tratamento de câncer de próstata do pai. Foram três anos indo a Teresópolis para consultas, exames, cirurgias e sessões de quimioterapia. Além de também ter que fazer viagens para Petrópolis, onde o pai fez radioterapia. Ele faleceu em abril de 2020.
2016 era também o ano em que o Hospital Estadual de Oncologia da Região Serrana, previsto para atender cerca de 500 mil pessoas de vários municípios fluminenses, seria inaugurado, em Nova Friburgo no imóvel onde funcionou o antigo Centro Adventista de Vida Saudável (Cavs), no bairro Ponte da Saudade, segundo anúncio do então governador Luiz Fernando Pezão. E essa era a segunda data de inauguração. O ex-governador, Sérgio Cabral, havia prometido entregar o Hospital do Câncer ainda em 2014.
A família da administradora não precisaria ter passado por tantos sacrifícios, caso as promessas tivessem sido cumpridas. “É cruel demais com o paciente e familiares esse deslocamento. A maioria das vezes, gasta-se mais horas na estrada do que nas consultas. Graças a Deus, tivemos condições de levar meu pai de carro. Fico imaginando quem não tem e precisa utilizar o transporte de van, oferecido pela prefeitura. As pessoas tem que esperar pelo atendimento de todos os pacientes, para embarcar no transporte de volta para Nova Friburgo, muitas vezes, passando mal com reações do tratamento. É uma via crúcis”, lamenta ela.
E, pouco mais de um ano depois da morte do pai, Rita voltou à rotina de viagens em busca de tratamento. Dessa vez para a mãe, que foi diagnosticada com câncer no endométrio em maio deste ano. “Quando eu soube da doença de minha mãe, veio toda lembrança do sacrifício que é pegar estrada. A viagem é estressante, perigosa e mais uma preocupação nesse processo. Quando o tratamento é feito na própria cidade, a pessoa se sente mais segura, está no seu ambiente, cercada de conhecidos, caso aconteça algo, é fácil pedir ajuda. Acredito que muitas pessoas abandonem o tratamento por causa das viagens”, disse ela.
Nesses nove meses de tratamento da mãe, Rita já foi cerca de dez vezes a Teresópolis levar a mãe para se tratar. As primeiras para consultas, depois cirurgia e agora, quimioterapia. São seis aplicações, feitas de 21 em 21 dias. “Semana passada, viajamos de novo e ela passou mal, não aguentou fazer a sessão e tivemos que voltar com minha mãe para Nova Friburgo, um desgaste e tanto. Paramos várias vezes na estrada, pois ela não estava bem”, relatou Rita.
E o tratamento também contará com sessões de radioterapia em Petrópolis. “Além disso, ela terá que fazer um outro procedimento, e terá que ser internada de três a cinco dias em um hospital em Campos ou no Rio de Janeiro. Passo no portão do local onde deveria estar funcionando o Hospital do Câncer e sinto uma revolta de ver que tudo seria menos dolorido se estivesse funcionando, conforme tantas vezes prometido”, relatou ela.
Tratamento Fora de Domicílio
O mesmo sentimento de Rita deve tomar conta dos 183 pacientes de oncologia e radiologia cadastrados no Tratamento Fora de Domicílio (TFD), que fazem os procedimentos no Rio de Janeiro, Teresópolis e Petrópolis. De acordo com a Prefeitura de Nova Friburgo, as vans que levam os pacientes fazem viagens diárias a essas cidades. Somente no ano passado o custo desses deslocamentos foi de aproximadamente R$ 2 milhões.
Dez anos de espera pelo Hospital do Câncer
O vereador José Roberto Folly, incansável defensor da criação da unidade oncológica e das demandas dos pacientes, ao perceber que os antigos projetos não passavam de “projetos”, criou o movimento SOS Hospital do Câncer para atrair parceiros não só do bairro mas de toda a comunidade friburguense. No início do ano, entregou ao governador Cláudio Castro um dossiê com toda a história e as condições do prédio onde deverá funcionar o Hospital do Câncer.
Desde então, várias equipes do Governo do Estado vem visitando o local para a elaboração do projeto de construção do hospital. De acordo com o Governo do Estado, a licitação deve ser feita em janeiro e o início das obras em fevereiro de 2022, dez anos depois do primeiro anúncio da construção do Hospital do Câncer em Nova Friburgo.
Em 2012, o então governador do Estado do Rio, Sérgio Cabral, assumiu o compromisso de entregar ao município de Nova Friburgo, uma unidade oncológica com 120 leitos, dez UTIs, 30 leitos para tratamento infantil, além de três salas cirúrgicas e um Centro de Imagens, num terreno de 83 mil metros quadrados. O hospital deveria estar funcionando no prédio do antigo Cavs, desapropriado pelo Governo do Estado. A Empresa de Obras Públicas do Estado (Emop) começou as obras de adaptação ainda em 2012, mas por pouco tempo. O governador pretendia inaugurar a unidade dois anos depois, ou seja, em 2014. Não foi inaugurada naquele ano nem nas gestões seguintes.
Em julho de 2014, o então prefeito de Nova Friburgo, Rogério Cabral, assinou com o governador Luiz Fernando Pezão e a presidente da República, Dilma Rousseff, o edital de abertura da licitação para uma nova tentativa de fundar no município uma unidade de tratamento oncológico. O edital foi publicado no Diário Oficial do Estado do Rio após cumprimento de todas as formalidades burocráticas previstas em lei.
O investimento foi orçado em mais de R$ 48 milhões, valor então liberado pelo Governo Federal, com inauguração prevista para 2016, com capacidade para 200 leitos, sendo 30 de oncologia infantil. Entre as modalidades integradas de prestação de assistência ao paciente constava: diagnóstico, cirurgia oncológica, oncologia clínica, radioterapia, medidas de suporte, reabilitação e cuidados paliativos, mais de 280 consultas por dia no ambulatório e cerca de quatro mil procedimentos cirúrgicos por ano.
Ao longo desses dez anos, a degradação do espaço saltava aos olhos e a população assistiu, indignada e revoltada, ao abandono, invasão e até um incêndio. “Tivemos que fazer diversas interferências durante todo esse tempo, para que o dano ao terreno e ao prédio não fosse ainda maior, talvez até inviabilizando a recuperação do local. Tínhamos que tomar conta para o local não ser invadido, para o mato não encobrir o terreno e a construção, e evitar até que o fogo destruísse tudo, quando ocorreu um incêndio. Com a ajuda dos bombeiros impedimos que a estrutura fosse totalmente comprometida”, lembrou José Roberto.
O vereador está confiante que agora o projeto sairá do papel. “Tive a oportunidade de conversar mais uma vez com o governador Cláudio Castro, com o secretário estadual de Obras, Marcos Lemos, e com o secretário de Saúde, Alexandre Chieppe, a respeito da retomada da obra. O governador garantiu, mais uma vez, a reconstrução do hospital. Trata-se de um projeto complexo, de alto custo, que demanda muita experiência e grande equipe, e que já tem verba assegurada. Por fim, torço para que em breve possamos anunciar que temos um Hospital do Câncer”, encerrou.
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