População negra é a que mais contrai o vírus e morre

Estudo da Fiocruz revela que efeitos da pandemia não são democráticos, como sugeria projeções iniciais
sábado, 05 de dezembro de 2020
por Guilherme Alt (guilherme@avozdaserra.com.br)
(Foto: Henrique Pinheiro)
(Foto: Henrique Pinheiro)

Diversos estudos foram publicados ao longo deste ano sobre os impactos da Covid-19 na população. O coronavírus até hoje é uma incógnita para a ciência e seus diversos efeitos são mais devastadores na população negra e pobre, de acordo com o relatório da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). 

A análise publicada em forma de ensaio científico nos Cadernos de Saúde Pública da entidade e assinado por pesquisadoras da própria Fiocruz e do Núcleo de Pesquisas Urbanas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) informa que a desigualdade no acesso aos direitos básicos como saúde, saneamento e trabalho tornou a população negra e periférica mais vulnerável à pandemia de Covid-19. A constatação contraria a ideia inicial de que as consequências da doença seriam percebidas igualmente em todas etnias.

O ensaio tem a autoria da pesquisadora Roberta Gondim, da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, e é creditado também às pesquisadoras Ana Paula da Cunha, Ana Giselle dos Santos Gadelha, Christiane Goulart Carpio, Rachel Barros de Oliveira e Roseane Maria Corrêa. O texto cita o mito da democracia racial para comparar que uma ideia semelhante circulou quando foi repetido nos primeiros meses que a pandemia seria “democrática”, representando o mesmo risco a todos os que não fizessem parte dos grupos em que a doença tem mais chances de apresentar suas formas mais graves, como idosos e doentes crônicos.

O ensaio alerta que o fato de a proporção de negros ser mais expressiva entre os óbitos que entre as hospitalizações “reforça a análise sobre a dificuldade de acesso dessa população aos serviços de saúde e medicina preventiva, principalmente os casos de maior complexidade, como os leitos de cuidados intensivos”. Além disso, a pesquisa também aponta que há um alto percentual de ausência de registro de raça e cor nos casos confirmados e óbitos por Covid-19, apesar de a portaria 344 de 2017 do Ministério da Saúde determinar que essa informação deve ser preenchida obrigatoriamente nos atendimentos em serviços de saúde. “A ausência do registro dessa variável também revela o racismo, nos moldes institucionais, pois impede que vejamos a verdadeira magnitude da exclusão da população negra”, destaca trecho do estudo. 

Primeira vítima: uma mulher negra

É importante lembrar que a primeira vítima fatal da Covid-19 no Estado do Rio de Janeiro foi uma senhora, negra, de 63 anos, moradora de Miguel Pereira, no Sul fluminense. A idosa trabalhava como empregada doméstica na capital e teve contato com a patroa, que havia voltado de viagem da Itália e testado positivo para o coronavírus. Diabética e hipertensa, ela não aparecia entre os casos confirmados no estado, o que explicita a dificuldade de mensurar a velocidade da propagação do vírus.

Doença mata seis vezes mais negros que brancos

O número de mortes pelo coronavírus da população negra é seis vezes maior do que o dos brancos, segundo um estudo do Boston Consulting Group (BCG). O grupo observou dados de órgãos governamentais dos Estados Unidos, mas a realidade também é aplicada no Brasil.

Quatro fatores influenciam as disparidades raciais relacionadas ao coronavírus, revelou o estudo: maior risco de exposição, menos acesso a testes, condições de saúde e idade, e a falta de acesso a cuidados de saúde de qualidade.

Thalita Rodrigues é coordenadora da Comissão de Psicologia e Relações Étnico-Raciais do Conselho Regional de Psicologia (CRP). De acordo com a coordenadora do CRP, isso acontece devido ao racismo institucional. “Os negros são a maior parte da população, que também é a maioria pobre. São as pessoas que têm menos acesso a empregos que permitam home office, portanto estão mais expostas nos transportes públicos. Eles continuam com o trabalho básico de limpeza, segurança pública e até mesmo na área da saúde, como de enfermagem”, explica.

As análises realizadas pela Fiocruz reforçam as dificuldades de acesso dessa população aos serviços de saúde, principalmente os de maior complexidade, como os leitos de cuidados intensivos”. Além disso, a pesquisa também aponta que há um alto percentual de ausência de registro de raça e cor nos casos confirmados e óbitos por Covid-19, apesar de a portaria 344 de 2017 do Ministério da Saúde determinar que essa informação deve ser preenchida obrigatoriamente nos atendimentos em serviços de saúde. “A ausência do registro dessa variável também revela o racismo, nos moldes institucionais, pois impede que vejamos a verdadeira magnitude da exclusão da população negra.

 

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