O que classifica uma gestão como transparente? O que faz uma Informação ser translúcida? Vamos tentar explicar.
Na nossa casa, quando a conta de luz ou de água chega alta, imediatamente lançamos o olhar para os dados da fatura, franzimos a testa enquanto buscamos entender a medição do consumo e meio que de forma automática comparamos com a medição do mês anterior.
Invariavelmente alimentamos a expectativa de ter ocorrido algum erro, algo que possa ser motivo de contestação. Também podemos nos conformar, conscientes de que naquele mês ou período optamos por fazer uso mais acentuado do ar condicionado ou mesmo, exageramos no tempo de uso do chuveiro elétrico.
De um modo ou de outro, os dados estão ali, na fatura. As informações, certas ou não, estão descritas para termos clareza do que está sendo cobrado e com base no que está sendo cobrado. Nessas situações nós somos Senhores de nosso consumo. Somos responsáveis por nossas escolhas.
Podemos regular esse consumo com mudanças de hábitos domésticos, ou reclamar com a concessionária. Podemos e fazemos isso porque fundamentalmente temos acesso à Informação.
Quando moramos em um condomínio há relativo afrouxamento desse comportamento vigilante e austero, pois delegamos a um síndico, o referido encargo de fazer esse filtro nas contas. Ou seja, confiando na administração em benefício de todos os moradores.
Mas o síndico não conduz sozinho o interesse coletivo, pois durante seu mandato existe uma convenção ou regulamento a ser observado e adotado, além de um Conselho Fiscal que acompanha a gestão que, de tempos em tempos, através de uma assembleia, são prestadas as contas para todos os condôminos. São nas assembleias que se examinam todas as informações disponíveis, todos os documentos relativos às contratações e despesas autorizadas pelo síndico.
Nada pode ser ocultado. Os contratos com prestadores de serviços, as notas de compras acompanhadas dos orçamentos comparativos, ou seja, tudo é alvo de escrutínio. Não fosse assim, o caos e a improbidade estariam instalados e a instituição, como modelo de convivência coletiva, fadada ao fracasso.
São as informações objetivas, sem invólucros ou rótulos, alocadas em um ambiente de transparência, que outorgam poder para que as pessoas exijam determinado comportamento por parte do responsável, nesse caso o síndico.
Vamos evoluir para a seara pública
A complexidade dos atos, em decorrência de inúmeras regras de comportamento previstas na densa legislação, empresta a conveniente justificativa de que os elementos e termos são técnicos demais para a compreensão do aparato burocrático por parte do público, o que abre espaço para os discursos que desafiam a inteligência do cidadão, encobrindo os meios e glorificando os resultados.
Daí a Nova Lei Orgânica do Município foi, de certa maneira premonitória, pois dispôs que a informação, de caráter público, além de garantida a acessibilidade, deve ser acima de tudo estéril.
As informações, para a Nova Lei Orgânica Municipal, devem representar o que de fato são, exatamente como estão materializadas no processo administrativo de contratação, pois é naquele ambiente em que o escrutínio se torna efetivamente público, on-line e em tempo real.
Naquele ambiente, as informações, quando controversas ou duvidosas, não podem ser objeto de manipulação e não podem ser contaminadas com idiossincrasias ou mesmo banalizadas, tal como vemos nas performances de determinados políticos adeptos das redes sociais.
Nas redes sociais, o palco é livre para manifestação do pensamento em todas as suas formas, até nas mais convenientes e polêmicas. Lá, as informações podem ser apenas citadas, comentadas, mas não expõem seu verdadeiro conteúdo.
Nos registros públicos, porém, não há palco, stories ou Reels. Não se permite ao governante achar que transparência é o ato de publicar no Diário Oficial apenas alguns extratos de contratação e resultados das licitações. Ele até pode estar cumprindo o dever legal de conferir publicidade a esses atos, mas não cumpre o dever de transparência, que é totalmente diferente. Basta também ler na Lei Orgânica o que diz sobre esse tópico.
Por exercer o controle quase monopolizado da informação, muitas vezes o político atuante das redes sociais se vangloria da redução de X mil reais poupados dos cofres públicos na licitação Y, pois o que ele está performando é apenas uma ideia, uma abstração tapeada e cirurgicamente calibrada para que a “desejada” informação se propague, arregimentando curtidas e likes, em boa parte decorrentes de iludidas aprovações.
Não à toa ter a posse da informação e colocá-la em ambiente opaco e controlável sempre foi elemento determinante do exercício do poder, assim como, no sentido oposto, persiste a ojeriza, por parte de determinados governantes, aos sistemas eficazes que expõem a realidade das informações.
Toda essa reflexão aqui exteriorizada é oportuna, pois Nova Friburgo foi rebaixada no reconhecimento em Transparência Pública pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), e a Prefeitura de Nova Friburgo, na gestão do atual governo municipal, peca pela falta de transparência e pela flagrante omissão em dar cumprimento à Nova Lei Orgânica Municipal aprovada em julho de 2018.
Naquela legislatura a corrupção que se instaurou na Prefeitura foi de tal modo endêmico que conferiu legítimo e oportuno ambiente para se reformar as ferramentas de fiscalização e controle por parte da Câmara de Vereadores. Seria tudo em prol do cidadão friburguense ou apenas mais um óvulo para fecundar uma nova pretensão política?
Pelo sim, pelo não, foi através da Nova Lei Orgânica que, nos seus artigos 64 e 67, os vereadores aprovaram, por unanimidade, importantes instrumentos voltados para o pleno acesso à informação.
Informação essa real, asséptica, nua e crua, dos atos praticados pelos governantes sem a intercessão de interessados, manipulação de documentos ou entraves para a fiscalização por parte de qualquer cidadão.
Dentre uma das principais ferramentas previstas na LOM está o Processo Administrativo Eletrônico — PAe, idealizado à imagem e semelhança dos processos judiciais e administrativos que já tramitavam eletronicamente no Poder Judiciário e nos mais altos órgãos da administração federal.
A LOM idealizou essa ferramenta não apenas para se conhecer o resultado da licitação ou os termos de um contrato assinado entre o prefeito e fornecedor da prefeitura tal como se divulga de forma limitada no Portal da Transparência.
A Nova LOM buscou tornar explícito o procedimento de contratação para possibilitar o conhecimento e a perfeita compreensão por qualquer cidadão sobre a forma e os meios que justificaram a administração pública chegar a um determinado resultado.
Conhecer como se comportou o secretário, suas justificativas e motivações para a contratação, os documentos juntados pelos servidores, as datas, origens, autores e, não poucas vezes, os vícios sanáveis ou insanáveis.
São níveis de acesso à informação e promoção da transparência, previstos na Nova LOM, que colocariam Nova Friburgo no topo do pódio da Atricon por alguns ou, senão, muitos anos.
E como omissão pouca é bobagem, é possível notar que o artigo 6º das disposições transitórias da Nova LOM concedeu o prazo de 30 meses para que o Poder Público Municipal adotasse referidas ferramentas de acessibilidade e transparência das informações, inclusive prevendo, no art. 14, que as autoridades poderão ser responsabilizadas em caso de inação.
Convenhamos que os 30 meses previstos na Nova Lei Orgânica para implementação do PAe e para a ampliação das ferramentas de transparência e controle venceram em meados de janeiro de 2021 sem que nenhuma, absolutamente nenhuma providência tenha sido adotada pelo atual Prefeito Johnny Maycon Cordeiro Ribeiro.
O atual Prefeito não apenas era efusivo e combatente Vereador à época, em 2018, mas o principal signatário da Nova LOM, pois ocupava a função de PRESIDENTE da Comissão Especial criada para reforma da Lei Orgânica, conforme Projeto de Lei nº 368/18.
Não há espaço ou palco para desculpas. Referida omissão e descaso com o friburguense, tanto por parte do Palácio Barão de Nova Friburgo, quanto da própria Câmara de Vereadores, idoneamente não se justifica, pois a participação eficiente do cidadão somente acontece na proporção em que ele acessa a informação, acredita em sua própria voz e se manifesta em canais adequados para o exercício de sua cidadania.
Assim caminha Nova Friburgo.
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