O papel da paternidade na saúde mental dos filhos

Ausência paterna pode trazer consequências psicológicas para o futuro das crianças
sexta-feira, 09 de agosto de 2024
por Jornal A Voz da Serra
(Foto: Freepik)
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Qual é o papel do pai na saúde mental dos filhos? Essa é uma pergunta muito importante, sobretudo considerando alguns aspectos e dados. Segundo a Arpen-Brasil (Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais), com números obtidos a partir do Portal da Transparência do Registro Civil, na página de Pais Ausentes, só nos três primeiros meses de 2023, mais de 60 mil crianças foram registradas apenas com o nome da mãe no Brasil.

Como diz o provérbio africano, ‘é preciso uma aldeia inteira para educar uma criança’. E a boa experiência dessa criança na sociedade, nessa aldeia, nessa comunidade, começa no seu núcleo familiar
“Por fazermos parte de uma sociedade que ainda entende que a função de cuidadora é exclusiva da mulher, e que a responsabilidade do homem nesse aspecto é menor ou até mesmo inexistente, muitas vezes as conversas sobre paternidade partem da ausência em vez da presença. Temos dados que mostram o número de crianças sem o nome dos pais na certidão de nascimento, mas isso vai muito além. Não são raros os casos de crianças, jovens e adultos que têm o nome de seu pai nos documentos mas vivem o abandono paterno”, explica a psicanalista e CEO do Ipefem (Instituto de Pesquisa de Estudos do Feminino e das Existências Múltiplas), Ana Tomazelli.

A importância da presença paterna

A presença paterna é de grande importância para o desenvolvimento dos filhos — e para a saúde dos pais, também. O tema da paternidade ativa tem ganhado outra dimensão nos últimos anos, e o tema passou a ser incluído no Programa Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem, do Ministério da Saúde (PNAISH), com iniciativas que visam estimular a participação no parto e nos cuidados básicos com o recém-nascido, fortalecendo esse vínculo desde o início.

“Falando de presença, e de uma presença positiva, respeitosa, acolhedora, os benefícios para pais e filhos são inúmeros. A paternidade ativa fortalece os vínculos afetivos e emocionais com os filhos, além de trazer mais significado para a vida do pai. É crucial reforçar que o pai tem papel tão importante quanto o da mãe na vida de um filho. Diversos estudos mostram que a presença paterna influencia diretamente no desenvolvimento cognitivo e social da criança. Além disso, influencia também na saúde mental da mãe. A presença do pai tem benefícios sistêmicos”, destaca Ana Tomazelli.

Já em relação à ausência, também há impactos na saúde mental. “A ausência paterna opera grandes impactos na vida de uma criança — lembrando que essa criança será um adulto, que também trará esses traumas e vazios. Muito se fala na “pãe”, que é a mãe que exerce algo do papel do pai para minimizar de alguma forma os desdobramentos emocionais nos filhos, mas pouco se diz sobre a carga emocional para a mulher e para a criança que vive esta situação. Hoje a sociedade avançou nos debates sobre família, maternidade e paternidade, sobretudo por conta dos formatos de família que vão além do que é “tradicional”, mas a paternidade versus a saúde mental das crianças ainda é um tema que precisa de muita conversa e aprofundamento”, aponta.

Ausência não pode ser naturalizada

A especialista lembra que a ausência paterna tem raízes sociais e históricas no Brasil. “Países colonizados em geral, sobretudo de colonização de exploração, como o Brasil, são países fundados na violência contra os corpos femininos negros e indígenas, o que pautou a ausência paterna, nos filhos que nasciam sem pai conhecido. Ou seja, há uma linha histórica que dita tudo isso. Além disso, socialmente, os pais também, muitas vezes, viveram a incompetência paterna com seus próprios pais, sem demonstrações de afeto, sem diálogos e até mesmo com violência. Obviamente essa não é uma justificativa, não é uma desculpa, mas é como se o “ser pai” fosse ensinado através das gerações dessa forma”.

Ana Tomazelli destaca que essa é uma luta que deve ser proposta pelas gerações atuais, que ainda podem mudar o cenário. “O que digo é que alguma geração vai ter que tomar a decisão de interromper esse ciclo. Então, cada vez mais, é preciso haver um convite para a reflexão não só dos novos pais, mas dos que já são pais, e até pais mais velhos, para que repensem sobre esse contexto e rompam com essa forma de paternar”.

Dados do relatório “Situação da Paternidade no Brasil” apontam que 82% dos pais brasileiros concordam que fariam tudo o que fosse necessário para estarem muito envolvidos com o cuidado do filho recém-nascido ou adotado nas primeiras semanas, mas 68% deles não tiraram sequer a licença-paternidade de cinco dias prevista por lei após o nascimento ou a adoção dos seus filhos. Outro estudo, “Atitudes globais em relação à igualdade de gênero”, aponta que um quarto da população brasileira acredita que homens que ficam em casa para cuidar dos filhos são “menos homens”.

“Infelizmente, vivemos em uma sociedade onde a ausência paterna é naturalizada. Ao assumirem o papel de cuidadores, muitos homens entram em conflito emocional, pois acreditam estar desempenhando um papel que não é deles. E isso tem consequências na criação das crianças. Uma paternidade saudável tem muito a oferecer na formação de um filho. Portanto, os pais precisam assumir que criar a criança é uma tarefa dividida por igual, e que a presença é fundamental, bem como o diálogo com os filhos e a comunicação assertiva. Como diz o provérbio africano, “é preciso uma aldeia inteira para educar uma criança”, e a boa experiência dessa criança na sociedade, nessa aldeia, nessa comunidade, começa no seu núcleo familiar”, finaliza a psicanalista.

(Fonte: blogdopapai.com.br

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