Uma nota de cem, outra de 20 e outra de dez já não compram um botijão de gás em Nova Friburgo, cidade conhecida por ter o GLP mais caro de toda a Região Serrana. O novo valor, apregoado por carros de som na manhã desta quarta-feira, 16, era de R$ 133, com entrega em domicílio.
Para quem se dispuser a usar o próprio carro e carregar os 13 quilos nas costas, o botijão em Friburgo sai por R$ 124. Mesmo assim, o valor é tão alto que, apesar de ser um gasto de consumo corrente, já está sendo parcelado em duas vezes no cartão, nas distribuidoras da cidade.
Segundo uma das empresas líderes de mercado, o preço do GLP em Friburgo saltou de R$ 120 para R$ 132 na última sexta-feira, 11, depois do reajuste dos combustíveis anunciado pela Petrobras, alegando a escassez das reservas mundiais com a guerra no Leste Europeu. O mesmo reajuste que fez o litro da gasolina passar de R$ 8 nos postos de Friburgo.
Em outubro passado, o preço médio do gás de cozinha já tinha ficado 7% mais caro, no sétimo aumento anunciado ao longo de 2021. Na época, o valor do quilo passou de R$ 3,60 para R$ 3,86, chegando agora a R$ 4,48 - um reajuste de 16%.
Mais caro e sem concorrência
Não bastasse o aumento, que é geral, Nova Friburgo é um dos municípios do interior fluminense que tem o gás de cozinha mais caro, e pior: sem variação de preços. Em cidades vizinhas, A VOZ DA SERRA encontrou nesta quarta-feira botijão a preços mais baixos, mesmo após o reajuste.
Em Teresópolis, por exemplo, o botijão está custando R$ 120 e sai por R$ 105 para quem for buscar no depósito em Albuquerque, na RJ-130, a 14km do Centro da cidade. Em Bom Jardim, o botijão está a R$ 123 entregue em domicílio (até no máximo Banquete), ou a R$ 105 diretamente no depósito, em São José do Ribeirão.
Conforme tabela da Superintendência de Defesa da Concorrência (SDC) da Agência Nacional do Petróleo (ANP), mesmo considerando a incidência de impostos como ICMS, PIS e Cofins, e margens brutas de revenda e distribuição, o preço final do GLP ao consumidor, no Estado do Rio, deveria ser, em janeiro deste ano, R$ 92,45 - o mais barato do país. No entanto, em Friburgo, naquele mês, o botijão já custava R$ 120.
Cartel na mira do MP
No fim de setembro, o Procon de Nova Friburgo chegou a notificar várias empresas distribuidoras, após denúncias de preços abusivos. As revendedoras tiveram que apresentar notas fiscais para provar que não aplicaram preços novos em estoques antigos.
Segundo Aleksandro Gabetta, coordenador do Procon-NF, toda a documentação apresentada pelas empresas foi encaminhada para o setor tributário da Procuradoria Geral do Município (PGM). A VOZ DA SERRA contactou a prefeitura para saber dos desdobramentos.
Em nota, a prefeitura informou que, de acordo com a PGM, as conclusões da apuração administrativa deflagrada pelo Procon-NF sobre o preço do gás em Friburgo serão encaminhadas ao Ministério Público, órgão que tem “expertise para analisar possível prática de formação de cartel”.
Segundo a prefeitura, a fiscalização notificou 22 empresas que comercializam gás de cozinha para apresentarem notas fiscais de compra nas distribuidoras e o preço de revenda. Dez notificadas responderam ao Procon-NF encaminhando os documentos. “A averiguação reuniu vasta documentação e informações que foram analisadas pela equipe da PGM, demandando tempo, uma vez que o processo ficou tão opulento que precisou ser dividido em quatro volumes. Os detalhes sobre o relatório final, entretanto, não serão divulgados neste momento para não comprometer o andamento do processo”, informou a prefeitura.
“Em Friburgo, além do preço alto, os consumidores não têm opção, pois não existe concorrência entre as distribuidoras. Todas cobram o mesmo preço. Quando há alguma diferença, é de apenas dois reais”, comentou um leitor de A VOZ DA SERRA.
Negócios impactados
Enquanto isso, quem depende do GLP para manter seu pequeno negócio em Nova Friburgo está sofrendo e até vendo o risco iminente de fechar. É o que relata a cozinheira Sheila Oliveira, moradora do Centro. “Para mim está sendo muito difícil comprar esse gás a R$ 135 que, no meu caso, dura só de 15 a 20 dias. Faço comida para entrega e não está dando mais lucro nenhum. A gente não sabe mais o que fazer”, desabafou ela.
Empreendimentos novos também estão sendo desafiados. Dono há apenas um ano e meio de uma padaria em Conselheiro Paulino, Vinicius Rangel lamentar ter que reajustar todos os produtos a cada aumento do gás que alimenta os fornos. “Quando comecei no ramo eu pagava por quinzena R$ 900 e pouco de gás. Hoje pago o dobro, e isso aumenta demais o custo da produção e o preço final para o cliente”, diz ele, que tem recorrido à criatividade, como investir em receitas com menos tempo de forno.
Gerente de um restaurante em franca expansão no Espaço Arp, Nathalya Areias também lamenta o repasse do aumento do custo como única alternativa. “Como mais da metade da nossa cozinha depende do gás, ficamos reféns do valor praticado pelas distribuidoras. Tentamos migrar algumas produções para nossos equipamentos elétricos, mas, com o preço também nas alturas, não conseguimos segurar muito os custos”.
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