Você foge da angústia?

César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

quinta-feira, 09 de dezembro de 2021

Davi, ex-pastor de ovelhas se tornou rei em Israel nos tempos do Antigo Testamento e fez muita besteira, conforme nos relata a Bíblia. Pregadores dizem que Davi, sendo adúltero e assassino, era um homem segundo o coração de Deus. Mas a verdade é que ele se tornou um homem segundo o coração de Deus depois que se arrependeu profundamente de seus pecados, especialmente do adultério e homicídio.

A Bíblia mostra a verdade da história humana sem botar panos quentes em ninguém. Davi foi levado pela emoção, sensualidade, e de forma abusiva quis ter a esposa de um dos chefes de seu exército, chamado Urias. Ele mandou que colocassem este militar fiel ao rei Davi na frente da batalha e o deixassem só para ser ferido pelos inimigos. Com isso, Urias foi morto na batalha. Foi uma covardia de Davi e dos comandados dele que executaram esta ordem.

Davi queria ficar com a mulher de Urias, como ficou. Ele adulterou e assassinou um de seus líderes militares. Não pensou mais no assunto. Fugiu para a negação, para o autoengano. Muitos fogem para uma atitude mental de inconsciência da culpa, do jeito cruel e desagradável de ser. Será que fugir de si mesmo é a pior fuga?

O profeta Natã, então, enviado por Deus, foi ter com Davi e contou a ele uma parábola que retratava a injustiça. Quando Davi ouviu o relato, imediatamente disse que o personagem injusto deveria ser punido. Natã, então, disse que ele, Davi, era o homem injusto por ter tomado a mulher de Urias e mandado matá-lo. De repente a ficha caiu, Davi saiu da negação, e admitiu seus erros.

É difícil certas pessoas admitirem seus erros de comportamento se você falar com elas diretamente sobre isso. Podem ser autoritárias, mandonas, prepotentes, arrogantes. Difícil conviver com pessoas assim que, como Davi, ficam na negação o tempo todo, sempre dando desculpa pelo seu comportamento abusivo.

Alguns não sentem angústia porque possuem uma fortaleza do ego e boa capacidade de manejar suas emoções. Mas uma pessoa com estrutura emocional empobrecida, ou alienada pode não reclamar de angústia. Outro tipo de pessoa que parece não ter angústia consciente é aquela com falta de auto-observação. Podem ser muito defensivas, que não se abrem, se acham poderosas, seja porque possuem dinheiro, algum cargo político, empresarial ou social de relevância, ou porque são encharcadas de sentimentos e com isso acreditam que esbanjam amor. O amor maduro envolve o sentimento, mas o sentimento não é, sozinho, o amor.

Por que pessoas negam ter problemas de comportamento? Por que não se auto-observam e admitem seu jeito desagradável? Talvez porque não querem encontrar sua própria angústia. Uma maneira de fugir de pensar na sua angústia é criticar os outros, querer controlar os outros e ter atitude mandona.

Não sente angústia quem sofre de importante diminuição do seu sentido moral. Corruptos são assim. Uns parecem ter transtorno de personalidade por faltar remorso, sentimento de culpa verdadeira e arrependimento. Os que dizem não ter angústia, não têm sintomas, mas o jeito de viver, as práticas no dia a dia antiéticas, exploração de pessoas, ganância material, não são sintomas de doença do caráter?

Outra forma de fugir da percepção da angústia tem que ver com doenças psicossomáticas, que são manifestações da angústia no corpo, incluindo doenças autoimunes e outros sintomas sem diagnóstico de doença orgânica.

A ausência da percepção de angústia é o mesmo que ausência de sintomas? Quem não sente angústia consciente não tem sintomas de sofrimento emocional? Alguns sintomas não são tão evidentes da presença da angústia ou ansiedade excessiva. Exemplos: gaguejar, um tique, a enurese, obesidade, agressividade verbal, consumismo, fissura por sexo, vício em trabalho, entre outros.

Não fuja da angústia. A maneira de resolvê-la é passando por ela, conscientemente. Com isso, entre outras coisas, você se torna menos julgador das pessoas, mais compassivo, e talvez menos agressivo nas palavras em seus relacionamentos.

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