Meditação e Pandemia

sábado, 30 de maio de 2020
por Igor Fonseca*, especial para A VOZ DA SERRA
Igor Fonseca (Foto: Thiago Lima)
Igor Fonseca (Foto: Thiago Lima)

Os mestres dizem que meditar é o estado natural da mente tranquila. Sempre afirmamos que meditar é difícil, mas isso acaba sendo um erro conceitual. O que é natural não pode ser tão difícil, concorda?! É uma questão de hábito: os maus hábitos que vamos assumindo ao longo da vida, silenciosamente, nos afastam da nossa natureza original.

    Eu percebo isso numa aula de yoga de um modo bastante explícito, quando um aluno considera um grande desafio, algo quase exótico, sentar na postura correta. É como se o anatômico fosse algo mirabolante e aquele mau hábito de sentar todo torto, que vai incentivar uma série de dores, lesões e desconfortos,  fosse muito natural. O hábito molda para o bem e para o mal, e a mente inventa álibis pra sustentar o velho costume.

    Afinal de contas, sempre vai existir um jeito certo de fazer a coisa errada. O exemplo disso é o tanto de pessoas que me falam, regularmente , que “são” muito agitadas para meditar. Costumo brincar que gostaria de ganhar um real de cada pessoa que me fala isso, certo de que acumularia uma pequena fortuna. 

    Acho bastante estranha essa associação de que nossas fragilidades emocionais (ansiedades e frustrações) tenham correlação direta com as características genéticas. A cor do cabelo ou dos olhos são características que não estão associadas a um hábito cultivado por essa falta de vigília sobre a própria mente.

    Se as lentes dos seus óculos estão muito sujas, é bem provável que você vá achar a paisagem esquisita, e falar : “Essa paisagem é muito feia, essa é a minha opinião”. O que você chama de opinião é só sujeira! Parar para considerar que os óculos estão sujos dá um certo trabalho e, às vezes, é mais fácil sustentar tal convicção de forma magnânima.

    O estado meditativo é o pano que limpa a lente. Rever hábitos significa criar novos caminhos neurológicos, acionar outros neurônios e criar novas conexões Todo esse processo é, energeticamente e emocionalmente, tão desgastante que preferimos continuar com a “nossa opinião” - gosto da ironia implícita dessas aspas.

    O desafio então não é meditar. É saber olhar para esse lixo mental, que fragiliza as emoções e impede a contemplação desse estado natural da mente tranquila. Por isso, meditar não é um jeito mecânico  e automático de sentar no chão e não pensar em nada, como se isso fosse algo simples e recorrente. Antes de tudo, meditar é se expor ao exercício da auto-observação, notar os efeitos fisiológicos e psicológicos dessa inquietude toda como primeiro passo do seu exercício meditativo. 

    Neste exercício, olhamos para as fragilidades do corpo e também para a rigidez mental: os caprichos, intolerâncias, conveniências, e o reflexo dessa falta de flexibilidade para lidar com gostos e aversões. A mente é um instrumento que tem que ser utilizada para elevar ao nosso potencial, e não para reforçar e nos prender no sofrimento. 

    Um grande professor diz que é normal quando um cachorro abana o rabo, mas que seria extremamente estranho se um dia o rabo abanar o cachorro. Nesse sentido, reforço o quanto é necessário dominar as oscilações mentais antes que as oscilações nos dominem.

    Esse momento de pandemia agita a mente e reforça esse tipo de oscilação, o que consequentemente, reforça o sentimento de sofrimento, carência e insuficiência - o que é ruim se torna pior. 

    Estamos vivendo algo tão inesperado (quase surreal), que todos esses “monstrinhos” mentais escapolem. É aí que a meditação exerce papel fundamental: o exercício de meditar pode ser a coleira que você coloca no seu “monstro”, mostrando pra ele quem está no controle. É dessa forma que você não vai sucumbir à adversidade e perceber o quanto de força se tem para continuar.

    Gosto muito da tradição oriental, porque eles nunca tratam de autopiedade! Eles falam muito é de responsabilidade, e trocar o lamento pelo autocontrole é a saúde manifestada em todo seu esplendor.

 

*Igor Fonseca é instrutor de Yoga no Instituto Samsara

 

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