Saúde e educação são, sem sombra de dúvida, o alicerce de uma grande nação. Um povo com acesso ao conhecimento e à reciclagem, com assistência adequada e bem-estar, é a premissa para a construção de um presente de oportunidades e de um futuro cada vez mais alvissareiro.
A saúde e a educação representam as bases para o crescimento de empresas, expansão de serviços e do segmento industrial, da agricultura e de todo o chamado livre mercado. Tem-se, assim, cidadãos / trabalhadores ainda mais qualificados e mais comprometidos, gestores mais esclarecidos e políticos mais fiscalizados. Dessa forma, também é semeado o terreno para um círculo virtuoso de transferência de renda, de crescimento econômico sustentável e de qualidade de vida para todos.
Parece simples. Entretanto, no Brasil, a falta de visão e de seriedade nos empurra para a mão inversa. Milhões de estudantes saem do ensino fundamental sem saber escrever. Por consequência, formam-se sem capacitação adequada, entram e saem de faculdades sem o mínimo de conhecimento necessário para exercer sua atividade profissional. Isso ocorre com parte expressiva dos advogados, jornalistas, economistas, enfim, em todas as áreas do conhecimento. Faculdades viraram máquinas de vender diplomas.
A medicina brasileira é outra área que padece deste mal. Com a abertura indiscriminada de cursos médicos, colocamos na linha de frente do atendimento, graduados que estão a um passo de não saber distinguir uma gripe de um resfriado.
Uma avaliação do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, realizada em 2011, com estudantes do sexto ano, atestou que quase 50% deles não sabia interpretar radiografia ou fazer diagnóstico após receber informações dos pacientes. Também cerca de metade administraria tratamento impreciso para infecção na garganta, meningite e sífilis.
O baixo percentual de acertos em campos essenciais da medicina, como saúde pública (49% de acertos), obstetrícia (54,1%), clínica médica (56,5%) e pediatria (59,3%) é alarmante. Aliás, os índices de reprovação desde que a avaliação foi criada, em 2007, confirmam que muitos novos médicos não estão preparados para exercer a profissão, representando risco à saúde e à vida dos cidadãos.
Pior do que o panorama atual é o que se desenha para o futuro próximo. Em vez de investir em qualidade, fiscalizando e fechando más escolas, estancando a sangria da abertura de novos cursos e premiando a boa formação, a opção foi pelo completo caos.
Notícia estampada no portal do Ministério da Educação, em 2012, acabava com qualquer dúvida sobre o assunto: “O MEC pretende aumentar o número de vagas nas instituições federais que já possuem cursos de medicina e criar novas faculdades de medicina em universidades que ainda não oferecem o curso”. Nos últimos 20 anos, o número de cursos de medicina mais do que triplicou no Brasil. Em 1997, eram 85 escolas médicas. Em 2011 saltou para 185. Hoje (2019) são 305.
No mundo, apenas a Índia possui mais, com 272 cursos e uma população de 1,2 bilhão de pessoas (seis vezes maior que a brasileira). Os números evidenciam claramente que nosso problema não é de falta de médicos. Carecemos, sim, de boa distribuição geográfica e de base para o profissional se fixar em periferias das grandes cidades, em áreas de difícil acesso por todo o país.
Não adianta sinalizar apenas com salários altos. O que precisamos é de uma carreira bem estruturada, de um plano de cargos que estimule a progressão e de ferramentas para a reciclagem permanente. Somente assim será possível seguir em frente com qualidade.
*Presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica
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