O Dia do Contador de Histórias, celebrado em 20 de março, remete a uma das profissões mais antigas da humanidade, essencial na transmissão de cultura, valores e saberes. Essa prática, que atravessa gerações, é fundamental na formação de leitores, especialmente nas crianças, ao criar um vínculo profundo com a literatura desde a primeira infância.
A contação de histórias tem o poder de despertar a imaginação, ensinar ética, criar laços afetivos e estimular a criatividade. "O dia 20 de março celebra uma das profissões mais antigas da humanidade. Guardiões das tradições, propagadores de lendas, transformadores de vidas, eles estão inseridos em todas as culturas e, através da oralidade, difundem os jeitos de 'sentir' e 'ver' de cada país. Por meio de um conto popular, podemos entender como cada povo lida com seus ritos de passagem, cria vínculos com seus ancestrais e elabora o próprio inventário moral", destaca o ator e contador de histórias friburguense, Laerte Vargas. Ele também enfatiza a importância da contação como a primeira ponte para o livro impresso, convidando as crianças a se aproximarem da literatura de forma prazerosa.
Estudos apontam que a contação de histórias pode ser a chave para o desenvolvimento cognitivo, emocional e social dos pequenos. De acordo com uma pesquisa da Universidade de Ohio, crianças que ouvem histórias desde cedo têm um vocabulário significativamente maior, com um diferencial de até 1,4 milhão de palavras a mais em comparação àquelas que não têm acesso ao hábito de leitura.
Vargas, com mais de 30 anos de carreira, é um grande defensor da tradição oral, acreditando que as histórias populares são ferramentas poderosas para formar cidadãos críticos e criativos. Ele explica que, ao contar histórias, não só se aprende sobre o mundo, mas também sobre si mesmo, o que torna o ato de narrar uma prática de empoderamento cultural e humano.
Além de ser uma rica fonte de aprendizado, a contação de histórias contribui para criar um ambiente acolhedor para os pequenos leitores. A construção de uma atmosfera que desperte o interesse, com livros ao alcance das mãos e uma leitura descontraída, faz toda a diferença. “Leitura é alimento: a contação é a entrada e os livros são o prato quente”, conclui Vargas.
A magia do contador de histórias
Da oralidade ao papel, as crianças podem vivenciar a contação de histórias como fruto de conhecimento e também um gesto de carinho. Para a contadora de histórias de Nova Friburgo, Tuini Bittencourt, as histórias falam a linguagem da infância, uma vez que operam em uma outra configuração de temporalidade. “Quando uma criança entra no universo das histórias e dos contos de fadas, seja lendo ou escutando, ela acessa um universo de sentidos que transcende a dureza do mundo cotidiano. Através das histórias as crianças podem ver refletidas nas palavras a riqueza do seu mundo interno”, acredita.
(Foto: Adriano José)
Tuini cita o escritor Rudolf Steiner, que no livro “Os Contos de Fadas” afirma que, “não existe arte tão grandiosa como a que completa o caminho, levando das profundezas incompreendidas da alma às imagens encantadoras, muitas vezes lúdicas, dos contos de fadas”. A contadora friburguense ainda ressalta que “contar histórias pode promover o resgate do encantamento na infância. “Vivemos hoje em uma sociedade que ainda expõe as crianças a conteúdos hiper estimulantes e inadequados. A criança é uma semente que precisa, sobretudo nos primeiros sete anos de vida, ser nutrida e protegida para ter raízes fortes. As histórias são como o sol para essa semente. Iluminando e aquecendo o coração das crianças.”, destaca a contadora que também é atriz e doutora em artes cênicas pela UniRio e promove a contação de histórias em escolas de Nova Friburgo com o projeto “Histórias do Jardim do Mundo: Semear a escola” que foi contemplado no Edital de Cultura ligado à Lei Aldir Blanc.
A tradição do contar
Antigamente era comum as pessoas se reunirem ao redor do fogo para contar histórias. Até hoje, podemos encontrar nas calçadas, nas praças, na casa dos parentes e vizinhos e durante as festividades, pessoas contando e repetindo histórias, preservando velhas tradições e costumes. Para Tuini, o ato de ouvir e contar histórias ativa uma qualidade de atenção muito particular. Hoje, imersos nessa sociedade excessivamente tecnológica, ao ouvirmos e contarmos histórias podemos acessar uma outra tecnologia.
“Trata-se de uma tecnologia milenar de comunicação e de transmissão de conhecimento diretamente ligado ao poder simbólico dos mitos e à própria história da humanidade. As histórias e os contos de fadas são portadores desse conhecimento que vai muito além do que hoje chamamos de conteúdo”, exemplifica.
História de uma contadora
Depois de quase dez anos trabalhando no teatro adulto a maternidade sensibilizou Tuini levando-a a mergulhar novamente no universo da infância. O aprofundamento na Pedagogia Waldorf a conduziu por uma jornada através dos contos de fadas, fazendo-a compreender a dimensão curativa das histórias e a expandir na direção da arteterapia. “Hoje, além das apresentações de contação de histórias, também realizo vivências artísticas e terapêuticas com grupos específicos como os Idosos e pessoas com deficiências”, conta.
* Reportagem de Liz Tamane, especial para A VOZ DA SERRA e da estagiária Laís Lima, com a supervisão de Henrique Amorim
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