“Sim, vou na igreja festejar meu protetor / E agradecer por eu ser mais um vencedor / Nas lutas, nas batalhas / Sim, vou no terreiro pra bater o meu tambor / Bato cabeça e firmo ponto, sim, senhor / Eu canto pra Ogum, Ogum” — Zeca Pagodinho, com sua canção "Ogum", traduz a fusão das energias de São Jorge e Ogum, dois guerreiros espirituais celebrados nesta quarta-feira, 23, feriado estadual. Eles, ao longo da história, se encontram no coração do sincretismo religioso brasileiro. De forma vibrante, a data celebra o protetor de todos, seja nas igrejas católicas, seja nos terreiros de umbanda, onde a devoção é igualmente profunda.
Em Nova Friburgo, assim como em muitas outras partes do Brasil, o sincretismo entre o catolicismo e as religiões afro-brasileiras é uma prática cotidiana. Neste 23 de abril, data que reverencia São Jorge, a cidade se transforma em um palco de homenagens a esse guerreiro — ou melhor, aos dois guerreiros, pois para os adeptos da Umbanda, São Jorge e Ogum são inseparáveis. Luiz Fernando Albuquerque, dirigente de uma casa espírita e umbandista, explica com clareza como esse sincretismo ocorre e qual a importância dessa conexão entre as duas figuras.
De acordo com Luiz Fernando, "São Jorge no catolicismo representa o Santo Guerreiro, que protege contra o Dragão e que vence batalhas. Por essa razão é o patrono de tantos Exércitos pelo mundo, como exemplo na Inglaterra, onde é reverenciado como o protetor da Coroa Real. No sincretismo religioso aqui no Brasil, os representantes dos cultos afro-brasileiros, quando as religiões de Matriz Africana eram discriminadas e até proibidas, associaram São Jorge com o Orixá Ogum, que na manifestação da religiosidade africana, também é o Orixá da força da guerra, que manipula as armas como lanças e espadas em defesa dos seus filhos de fé. Assim, pela semelhança de devoção, São Jorge é para nós umbandistas - o nosso Orixá Guerreiro", observa Luiz Fernando.
A relação entre São Jorge e Ogum vai além de um simples sincretismo; ela está intimamente ligada à proteção e à defesa contra as forças negativas. Luiz Fernando afirma: "São Jorge (Ogum) não está relacionado com a manifestação de fé em curas pela saúde do corpo, como doenças da matéria ou do espírito, como outros orixás, mas essencialmente, uma relação direta de um escudo de proteção contra o mal, e principalmente uma força poderosa em defesa dos mais fracos perante a força do mal. Um verdadeiro Vencedor de demandas (conflitos de interesses, os mais diversos)."
Essa combinação de proteção e força é o que torna a figura de São Jorge/Ogum tão especial para os devotos. Enquanto São Jorge é celebrado na Igreja Católica como o protetor dos exércitos e o vencedor do mal, Ogum, na Umbanda, carrega consigo a energia de luta, mas também a do compromisso com a justiça.
O dia 23 de abril, data que homenageia São Jorge, é um dos momentos de maior devoção no calendário religioso de Nova Friburgo, com celebrações tanto nas igrejas católicas quanto nos centros espíritas e de umbanda. Luiz Fernando detalha como a cidade celebra: "No dia 23 de abril as igrejas católicas realizam a alvorada - o toque dos clarins às 5h da madrugada com grande foguetório. Uma homenagem ao Santo Guerreiro, e em todos os Quartéis da Polícia Militar e dos Bombeiros esta homenagem é muito bonita e de grande devoção. Nos centros espíritas as giras de homenagem também seguem as mesmas características com muitos atabaques, palmas e reverências soando com muita vontade e energia e com fogos de artifício que recebem o nosso Orixá Vencedor das Batalhas, que incorpora em seus filhos com o fervor de um grande vitorioso, e que chega trazendo as boas vibrações da vitória do bem sobre o mal."
Nova Friburgo, com seu espírito acolhedor e plural, reflete a complexidade e a beleza desse sincretismo religioso. A cidade, onde se encontram várias tradições, celebra a força de Ogum e São Jorge como símbolos de luta, proteção e vitória. As religiões de matriz africana, a Umbanda e o Candomblé, convivem lado a lado com o catolicismo, criando um ambiente de respeito e troca de energias, onde cada culto encontra seu espaço de expressão.
O sincretismo religioso em Nova Friburgo vai além das datas comemorativas, como o dia de São Jorge. Ele está presente nas práticas diárias dos fiéis, que buscam em Ogum e São Jorge não apenas proteção, mas também força para enfrentar as dificuldades da vida. O sincretismo, mais do que uma fusão de símbolos, é uma prática viva, que atravessa gerações e reafirma a importância de celebrar a diversidade religiosa e cultural de nosso país.
Em Friburgo, carreata, missa, procissão e cavalgada
Na Igreja Católica, a programação festiva em louvor a São Jorge contará nesta quarta-feira, 23, com carreata a partir das 17h, saindo da Praça Nossa Senhora do Rosário, no centro do distrito de Riograndina, em direção à localidade rural de Janela das Andorinhas, onde está sendo erguida uma capela dedicada a São Jorge. Lá, será celebrada missa solene, às 18h, presidida pelo padre Roberto Pinto, da Paróquia de Nossa Senhora do Rosário, seguida de procissão luminosa no entorno da capela. No próximo domingo, 27, acontecerá a tradicional Cavalgada de São Jorge com concentração no distrito de Conselheiro Paulino e percurso até o Paissandu com retorno ao ponto de partida. Em frente ao Hospital Municipal Raul Sertã, haverá, como de costume, uma parada para a bênção aos doentes.
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