A Friburgo de 1945: 25 mil habitantes entre apitos das fábricas e do trem

Relembre como era a cidade há 77 anos, quando A VOZ DA SERRA foi fundada, em meio ao fim da 2ª Guerra e da ditadura Vargas
quinta-feira, 07 de abril de 2022
por Adriana Oliveira (aoliveira@avozdaserra.com.br)
Nova Friburgo na década de 40: trem, muitas bicicletas e poucos carros (Reproduções da web, todas da década de 40)
Nova Friburgo na década de 40: trem, muitas bicicletas e poucos carros (Reproduções da web, todas da década de 40)

Em 7 de abril de 1945, quando A VOZ DA SERRA surgiu, como jornal do PSD, Nova Friburgo tinha em torno de 25 mil habitantes. Também à sombra de um conflito bélico, como agora, o mundo enfrentava cinco anos da Segunda Guerra Mundial e o Brasil, oito anos da ditadura do Estado Novo, ambas já no fim. 

Na pequena Friburgo daquela época ouviam-se muitos apitos, que ecoavam do trem e das fábricas têxteis Arp, Ypu e Filó, cortando o silêncio das centenas de bicicletas e dos raros automóveis em circulação. Os carros eram praticamente apenas Chevrolets e Fords das décadas de 20 e 30, todos importados, já que não havia produção nacional. A maioria pertencia a  motoristas “de praça”, que faziam ponto em frente à Estação Leopoldina, atual sede da prefeitura (abaixo). Um ou outro médico famoso da cidade possuía um Cadillac.

Como todos os brasileiros, os friburguenses escovavam os dentes com Eucalol, se ensaboavam com Lever, lavavam roupa com Rinso, fumavam Lincoln e tomavam Melhoral para dor de cabeça. 

O Hotel Engert, que hospedava os visitantes que subiam a serra de trem, era referência e motivo de orgulho.  O “Campeonato Citadino” reuniu, em 1945, apenas três times de futebol: Esperança, Fluminense e Friburgo, e este último sagrou-se campeão. 

Já havia Coca-Cola e Brahma Chopp engarrafadas, mas os friburguenses bebiam mesmo eram guaranás de produção local, e iam às compras em lojas como Casa Libaneza, A Vantajosa, Bota Preta, Casa Chaleira, Papelaria Simões, Casa da Borracha, Drogaria Globo, Farmácia Brasil, Miele, Spinelli e Casa de Couros Mattos, entre outras.

As bandas Campesina e Euterpe já disputavam entre si qual era a melhor, em concorridas apresentações pelos coretos. Nas alamedas da Praça Getúlio Vargas, moças de cintura fina desfilavam com saias rodadas cobrindo bem além dos joelhos (quanto mais compridas, mais elegantes) e homens de terno de linho e bigode fino flertavam para, quem sabe um dia, namorarem de mãos dadas. 

As crianças estudavam no Grupo Escolar Ribeiro de Almeida. As de famílias mais abastadas, se meninos, eram matriculados no Anchieta, enquanto as meninas cursavam o “Normal” no Nossa Senhora das Dores. Nas domingueiras, cinemas de rua como o Leal e o recém-inaugurado Eldorado (abaixo) eram diversão garantida, assim como bailes em clubes como o de Xadrez. 

Na Era do Rádio

Estrearam na época filmes como Casablanca, Cidadão Kane, Gilda e O Grande Ditador. Atrizes como Lana Turner, Ingrid Bergman, Jane Russell, Veronica Lake, Rita Hayworth e Lauren Bacall eram ideais de beleza, enquanto galãs como Gary Cooper, Cary Grant, James Stewart e Humphrey Bogart arrancavam suspiros.

A Rádio Nacional popularizava talentos que o Brasil jamais esqueceu, como Mário Lago, Cauby Peixoto, Emilinha Borba, Paulo Gracindo, Janete Clair e muitos outros. As vozes de Francisco Alves, Nelson Gonçalves, Ataulfo Alves e Orlando Silva lideravam as paradas de sucesso.

Jovens como Célio Mangia, que faleceu em 2020, aos 96 anos de idade, foram lutar na Itália, junto com recrutas de Cantagalo, Cordeiro, Sumidouro e outros municípios vizinhos. Após a guerra, um abaixo-assinado fez erguer, na Praça do Suspiro, um obelisco em homenagem aos nossos pracinhas. Só Nova Friburgo enviou 67 soldados para a guerra. Apenas um deles, Antônio Moraes, morreu no front. 

Naquele ano, por causa da guerra, não houve oficialmente carnaval no Rio de Janeiro, então capital da República. O desfile das escolas de samba foi tímido e a Portela conquistou seu sétimo título de campeã, o quinto consecutivo. A Estação Primeira de Mangueira ficou com o vice-campeonato. Em Friburgo, não havia ainda agremiações além de pequenos blocos - a Alunos do Samba só viria a ser fundada em 1946.

A VOZ DA SERRA e a política

O jornal A VOZ DA SERRA foi fundado, em 1945, pelo então prefeito Dante Laginestra, com um grupo de amigos e correligionários, do qual fazia parte Américo Ventura Filho. O objetivo do semanário era dar sustentação política ao partido do então interventor federal no estado, Amaral Peixoto, e ao presidente Getúlio Vargas.

A ditadura do Estado Novo chegava ao fim e o Brasil se preparava para eleições livres, após anos de censura. Nesse contexto, três grandes partidos dominavam a cena política: o PSD (Partido Social Democrático), a UDN (União Democrática Nacional) e o PTB (Partido Trabalhista Brasileiro).

Em 1953, passadas as eleições, o jornal estava prestes a encerrar suas atividades, mas a aceitação popular era tão grande que Américo decidiu adquirir as cotas da pequena editora. O jornal, então instalado na Rua General Pedra (hoje Rua Dante Laginestra), deixou de ser um órgão oficial do partido, embora continuasse seguindo uma linha pessedista, de acordo com a ideologia de seu diretor.

Com quatro páginas, o novo jornal focava nos acontecimentos políticos da cidade e do país. Nas primeiras edições, publicavam-se quase exclusivamente notícias nacionais e esportivas, com muito texto e raras fotos, como era comum na imprensa da época. 

Em dezembro de 1945 foram realizadas eleições para presidente da República e para a formação de uma nova Assembleia Nacional Constituinte. Além de eleger o general Eurico Gaspar Dutra como presidente, o PSD saiu das urnas como força política majoritária, elegendo dois senadores e preenchendo quase três quintos das vagas de deputado federal.  Dutra derrotou o brigadeiro Eduardo Gomes, que era apoiado por uma ampla frente de oposição a Vargas, reunida em torno da UDN. Nas eleições de 1950, Getúlio foi eleito pelo voto direto, pelo PTB, sucedendo Dutra, derrotando novamente a UDN. 

Américo ficou à frente do jornal até sua morte, em 1973, quando A VOZ DA SERRA foi continuado por seu filho, Laercio Rangel Ventura. O mesmo se repetiu em 2013, quando a filha de Laercio, Adriana Ventura, assumiu a direção após a morte do pai.

 

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