Quem poderia imaginar que um dia seria obrigado a evitar o contato com os netos, e estes, com seus avós? Ninguém. Até que uma tragédia se abateu sobre o planeta, no início de 2020, dizimando, até agora, mais de 600 mil vidas, contaminando cerca de 15 milhões de pessoas, em todo o mundo. É o novo coronavírus, a Covid-19, um vírus letal, um inimigo invisível e misterioso.
Essa praga começou sendo mais ameaçadora para os idosos, mas poupando crianças. Que trágica ironia, justo para esses dois extremos das faixas etárias: avós e netos. Essa relação de amor tão única, saborosa, indispensável, tornou-se a mais perigosa de todas pela enorme capacidade de transmissão desse vírus.
Pediatras recomendam que, até nova orientação, não haja contato direto dos netos com os avós. Muito deles também são avós e sabem a grande falta que os netos fazem. Sentem, por outro lado, o quanto é difícil quebrar, mesmo que por um tempo, essa relação lúdica, de afeto, respeito, interação e formação, de grande significado para a vida de ambos. Mas, essa é a recomendação a ser seguida, em nome da vida, dizem. E respeitá-la é prova desse amor.
Nenhuma distância será capaz de diminuir o amor recíproco que une avós e netos, essa relação incondicional de amar e proteger. E esperar o tempo que for necessário para o reencontro. A seguir, publicamos o depoimento de três avós que vivem situações diferentes, mas sentem da mesma forma o momento que todos estamos passando. Confiram!
Dalva Ventura, avó de Antonia, 3 anos, Nicholas, 2, e Alice, 18
“De uma certa forma, me sinto privilegiada, pois posso estar com meus netinhos nos finais de semana, mas...do lado de fora do portão. Sem querer fazer drama, parece que estou numa prisão, atrás das grades. Não podemos nos abraçar, nos tocar, brincar junto, rolar pelo chão, assistir vídeos agarradinhos no sofá. É muito estranho. Sempre saio de lá aos prantos, com a imagem daquelas mãozinhas nos dando tchau e mandando beijos. Quando tudo começou, Nicholas praticamente não falava. Hoje, quatro meses depois, conversa conosco. Os desenhos de Antonia apenas começavam a tomar forma. Hoje ela já sabe escrever o próprio nome. Minha sensação é a de estar perdendo um tempo precioso, uma das melhores experiências que uma pessoa pode viver. Observar e acompanhar de perto o desenvolvimento de seus netos.
Alice, minha outra neta, já está com 18 anos e sinto uma falta enorme dela, mas de outra maneira. Igualmente intensa e sofrida, mas diferente. Talvez por ela não estar mais em fase de crescimento, sei lá. Já é uma adulta, conversamos muito pelo zap, posso até dizer que nos aproximamos mais neste período e nos tornamos mais íntimas. Ainda assim, é duro não ter sua presença, sempre tão constante aqui em casa. Chego a ouvir a porta da sala abrindo, como se ela estivesse entrando, como acontecia antes. Além disso, após cumprir uma quarentena de 15 dias sem sair de casa nem para ir até a portaria, minha filha acabou concordando em deixar ela passar alguns dias conosco, já por duas vezes e sabemos que logo estará de volta para outra temporada na casa da vovó e do vovô.
Um alento e tanto. Pois é. Julia e Helena que me perdoem, mas confesso que sinto mais saudade dos nossos netos que delas. Fazer o quê? Não dizem que ser avó é ser mãe duas vezes?”.
Fátima Wermelinger avó do Hugo, 2 anos e 9 meses
“O trabalho é grande e cansativo, a idade pesa (rsrs) mas o prazer de tê-lo pertinho e acompanhar o seu desenvolvimento supera qualquer cansaço. A casa fica mais animada e não apenas o Huguinho, mas nós também brincamos e nos divertimos o dia todo com ele.
Cuidar do meu neto é trabalhoso, mas é também muito gratificante. Ele passa a semana toda aqui (os pais trabalham o dia todo), e quando chega a sexta-feira estou super cansada. Mas logo no sábado já estamos morrendo de saudades, contando os minutos pra ele voltar. Tem sido muito bom ter a oportunidade de passar o dia inteiro com ele.
Nesse momento de pandemia a presença dele nos distrai, e uma criança traz alegria e descontração para nossa casa. Quando as aulas recomeçarem sentiremos falta da companhia dele, do jeito carinhoso e feliz dele, todos os dias.”
Cris Dias, avó de Davi, 2 anos e 8 meses.
“Moramos juntos, numa casa grande, eu, minha filha Yanne, e meu neto Davi. Mesmo antes da pandemia eu já dividia minha rotina diária, os horários, com a Yanne. Durante um bom tempo eu trabalhei na parte da manhã e voltava pra casa na hora do almoço, e à tarde era a filha que ia trabalhar. Então a gente se revezava conforme a necessidade, porque em dois dias da semana eu também trabalhava à tarde. Às vezes acontecia de precisar que levar Davi comigo.
Sou professora de academia e Yanne dá aula de balé em colégios e em um estúdio. Com a pandemia e fechamento das escolas e estúdio, alguns alunos aderiram às nossas aulas on-line. Continuamos dividindo nossos horários, ora sou eu que dou aulas, ora é ela.
O mais difícil do confinamento para o meu netinho, foi justamente não poder passear. Só não é pior porque temos muito espaço pra ele correr, brincar. Mesmo assim, para uma criança da idade dele, cheio de energia, não poder sair de casa é complicado. Mas conseguimos explicar a situação e ele até entendeu direitinho, ele é muito tranquilo.
Agora, estar mais em casa, ver ele acordar, ficar mais tempo com Davi, é muito importante. Tem sido recompensador poder acompanhar o desenvolvimento dele, estar disponível e dar mais atenção. Nesse sentido, tem sido bom.
Esse foi o primeiro ano em que entramos com pedido de escola pra ele, mas nem soubemos se conseguimos uma vaga porque as aulas foram suspensas. E mesmo que conseguíssemos nesse meio de ano, decidimos não colocá-lo agora, preferimos esperar ano que vem, depois que já tivermos a vacina para o coronavírus.
Vamos seguir nessa rotina por enquanto, criando brincadeiras com pintura, massinha e evoluindo na educação também, ensinando letras, cores, formas. Todo dia é uma aventura nova. A gente tem que se reinventar diariamente para ir convivendo com a pandemia.
O Davi é uma criança alegre, se distrai com os bonequinhos dele, é muito fácil de lidar, graças a Deus. Quando a gente tem que ir na rua, ele já pede a máscara, o álcool, a ‘proteção do vírus’, como ele diz. É uma graça!”
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