Pela primeira vez, o número de candidatos autodeclarados negros (pretos ou pardos) superou o total de brancos. Dados divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostraram que 276 mil candidatos negros concorreram nas eleições de 2020, o que representa 49,95% do total. Já as candidaturas brancas representaram 48,04%.
Para o senador Paulo Paim (PT-RS), decisão da Justiça levou a maior proporção de candidaturas negras da história, pois foi determinada a equiparação do tempo de propaganda política em rádio e TV, sendo dividida em 50% para mulheres brancas e 50% para negras, além de 30% para cota do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas (FEFC) para candidatas e candidatos negros.
— Foi um grande avanço para promoção da igualdade racial no Brasil, um país ainda racista. As eleições de 2020 são um grande projeto piloto para o aprimoramento dos futuros pleitos. Não basta a inscrição das candidaturas negras. Os partidos precisam priorizá-las. Não é só dizer que as candidaturas estão lá, eu quero ver se a divisão dos recursos e do tempo de rádio e TV foram os mesmos no pós-eleição — afirmou o senador.
Nas eleições gerais de 2018, embora 47,6% dos candidatos fossem negros, apenas 27,9% foram eleitos.
Mulheres
As candidaturas femininas também aumentaram neste ano, chegando a 184 mil, o que representa 33,4% do total. Já em 2016, o percentual foi de 31,9%. A população feminina representa 52,5% do eleitorado brasileiro.
Em entrevista à Agência Senado, a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) afirmou que a representatividade das mulheres em cargos eletivos e de comando ainda está bem aquém do que o necessário.
— Somos a maioria da população brasileira e avançamos pouco desde a década de 1940 nesse sentido. O sistema de cotas para mulheres ajudou, mas ainda é insuficiente para transformar essa realidade. Para muitas mulheres a política ainda é um universo inatingível e hostil.
Para a senadora Soraya Thronicke (PSL-MS), as mulheres precisam querer fazer parte da política e não aceitar serem usadas em candidaturas fraudulentas.
— Não adianta apoiarmos políticas públicas que incentivem a participação feminina na política, como é o caso das cotas de gênero, se as mulheres não entrarem verdadeiramente para competir pelas vagas nos parlamentos. É muito mais uma questão de conscientizar do que simplesmente destinar uma porcentagem de vagas para determinado gênero.
Já a senadora Kátia Abreu (PP-TO) acredita que o equilíbrio fará do Brasil um país mais justo e moderno. "A demonstração de confiança nas mulheres é sinal de progresso. Sinal de que estamos deixando os preconceitos pra trás”, disse ela no Twitter.
A senadora Simone Tebet (MDB-MS) apresentou um projeto (PL 4.391/2020) para garantir que as legendas reservem, no mínimo, 30% dos cargos dos órgãos partidários para as mulheres. A proposta também determina que, nos órgãos de juventude das siglas, a reserva seja de 50%. Pelo texto, as legendas têm até 2028 para chegar a esse patamar.
Indígenas
As candidaturas indígenas também cresceram em 2020, chegando a 2,1 mil, o que representa 0,4% do total. De acordo com dados do TSE, são 38 candidatos indígenas a prefeito e 72 a vice-prefeito, o que mostra um aumento de 25% em relação a 2016.
Apesar do avanço, o senador Telmário Mota (Pros-RR) acredita que ainda há muito o que fazer.
— Como eu sempre digo, o índio quer inclusão social, quer estudar e trabalhar, e assim defender ainda mais sua cultura e costumes. Ver meus parentes inseridos na política local e nacional é extremamente gratificante.
Mulheres negras decidem
As mulheres negras representam 27,8% da população brasileira, entretanto, têm baixa representatividade na política. Nesse ano de eleições municipais, dados divulgados pelo Movimento Mulheres Negras mostraram que, em 2016, o número de eleitas, tanto para vereadoras quanto para prefeitas, não chegou a 5%.
Tanto em número de candidatas quanto de eleitas, elas ficaram atrás de homens brancos, homens negros e de mulheres brancas nos dois cargos. Para as eleições de 2020, houve um pequeno aumento no número de candidatas negras tanto para vereadoras quanto para prefeitas. Em compensação, houve um aumento relevante de vitórias, algumas consagradoras, como a da vereadora eleita em Friburgo, Maiara Felício, a mais votada.
Nas eleições de 2016, 4,1% (691) dos candidatos às prefeituras eram mulheres negras. Já os candidatos homens brancos somavam 57,7%; homens negros, 28,7%; e mulheres brancas, 8,8%. Das candidatas negras, 3,2% (180) foram eleitas. O maior percentual de eleitos foi de homens brancos, com 62,2%. Em comparação com a eleição deste ano, houve um aumento no número de candidatas negras, de 0,4 ponto percentual.
Para o cargo de vereador, em 2016, 15,4% dos candidatos eram mulheres negras (71.066). O percentual de candidatos homens brancos foi 33%; de negros, 33,3%; e de brancas, 17,5%. Das candidatas negras, 5% (2.870) foram eleitas. O maior percentual de eleitos foi de homens brancos, com 48,7%. Em comparação com 2020, houve um crescimento de 1,4 ponto percentual no número de candidatas negras. Falta atualizar o número de vitórias.
Missão de suprir instâncias do poder
Para a cofundadora e coordenadora do Movimento Mulheres Negras Decidem, Diana Mendes dos Santos, as mulheres negras não são vistas como um grupo demográfico. O movimento, que qualifica e promove a “agenda liderada por mulheres negras na política institucional”, está presente em 16 unidades da Federação (Alagoas, Amazonas, Bahia, Distrito Federal, Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Paraná, Rondônia, Rio de Janeiro, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins).
“Enquanto movimento, tem muito essa missão de estar olhando justamente para suprir a falta de representatividade de mulheres negras dentro das instâncias de poder. Acaba focalizando isso, porque a gente trabalha muito com pesquisas, mas também tenta trabalhar uma narrativa que identifique o problema e potencialize essas mulheres que já estão, de alguma forma, trabalhando com essa agenda. Um dos principais dados que a gente tenta visibilizar, da Pnad Contínua 2019, é que mulheres negras representam cerca de 28% da população brasileira. O que isso significa? Que somos o maior grupo demográfico do país e, consequentemente, a maior força eleitoral”, avaliou Diana.
Para ela, as mulheres negras comprometidas com a agenda da população negra têm um projeto político de país. “Coisas que a gente entende em uma escala ampla de saúde e educação, que é uma política de igualdade racial que a gente deseja pro país como um todo. É realmente uma visão de futuro possível, que, claro, é desafiador, mas, ao mesmo tempo, a gente tem essa potência”, disse.
Diana acrescentou que o fortalecimento da democracia, de acesso a direitos e de uma agenda que contemple coisas que tenham a ver com a realidade da população negra e, especialmente, das mulheres negras têm a ver com esse fortalecimento nessas instâncias de poder. “É estar lá para nos representar.”
O Brasil está entre os países da América Latina (AL) que mais apresentam obstáculos para os direitos políticos das mulheres e a paridade política entre homens e mulheres, de acordo com estudo do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e da Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o Empoderamento das Mulheres (ONU Mulheres). O país ocupa o nono lugar em um ranking com 11 países.
(Fontes: Agência Senado e Agência Brasil)
Deixe o seu comentário