As histórias e nossos medos

domingo, 26 de junho de 2016
Foto de capa

Quando meus filhos eram pequenos, fomos ao cinema num sábado à tarde e assistimos História Sem Fim. O filme era tão bonito e profundo que saímos do cinema sensibilizados, principalmente meu filho Beto que era um menino que se mobiizava com tudo. Conversamos a respeito, principalmente sobre Artax, o lindo cavalo branco que se deixou morrer pelo desânimo quando atravessava um pântano. Até hoje, anos depois, as cenas ainda me fazem pensar. E, sempre que uma certa dose de desânimo se aproxima de mim, eu me lembro da fraqueza daquele cavalo e reconheço que não posso me entregar. 

O filme nos amadureceu. 

História Sem Fim é baseado no romance do mesmo nome e foi escrito por Michel Ende, nascido na Alemanha em 1929. A obra faz parte da literatura fantástica que se caracteriza por uma narrativa baseada em fatos e personagens irreais. 

Crianças, jovens e adultos são tocados por este gênero literário, uma vez que uma certa dose de magia causa prazer, como se fosse um breve suspiro no dia a dia; suspiram sempre relaxam. 

Ah, como me divirto com Piratas do Caribe! 

E, aí, coloco a literatura nas alturas, uma vez que além de diversão, ela nos traz cultura e nos faz pensar, deixando dentro de nós sementes que guardamos e cultivamos.

A literatura fantástica pertence ao universo da ficção, ou seja, é um gênero em que a imaginação faz com que o irreal ganhe movimento e vida, dando-lhe aparência de realidade; é, de alguma forma, inspirada em fatos reais. 

Como a imaginação não tem limites, as histórias contam de tudo o que um autor possa imaginar, inclusive cria personagens fantasmagóricos e encantadores. A criança, em seu desenvolvimento cognitivo e afetivo, tem neste gênero literário um recurso capaz de ajudá-la a lidar com a vida, na medida em que correlaciona suas dificuldades ou impossibilidades com elementos fantasiosos com os quais ela estabelece algum nível de relação. Como a história de Harry James Potter, cujo enredo traz elementos mágicos e conta as aventuras de um menino franzino e órfão que se confronta, ao lado dos amigos, com o aterrorizador bruxo das trevas. A história abrange o enfrentamento, a passagem da infância à juventude, vida escolar, relações de amizade e superação. 

A literatura fantástica é uma grande contadora de histórias e a maioria das obras traz o medo como tema presente, este forte e desagradável sentimento que inquieta, desassossega, aflige e aparece ante uma ameaça real ou imaginária. Cada um vive seus medos de modo particular. Não há heróis que não o experimentem. Nem reis e princesas. Nem você e eu.

Sua leitura permite ao leitor infantojuvenil compartilhar com os personagens situações de tensão e medo, o que lhe dá oportunidade para abrir as próprias caixas de segredos e pensar sobre seus lobos. Pelo menos, reconhecê-los. Além do mais, crianças e adolescentes estão crescendo e vivendo transformações profundas num mundo não mais do que instável. Quantos medos isso não cria?

E quem não tem vergonha de mostrar seus medos? 

Um passo importante para libertá-los é buscar palavras para verbalizá-los e as histórias proporcionam isso. Quando falamos dos nossos medos, conseguimos lidar com eles. Falando, nos sentimos mais à vontade para contar a nossa própria história e encarar a vida com a possibilidade de ser modificada. Reconstruída. Deixamos de ser reféns!  

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