Impressões - 02/05/2015

domingo, 03 de maio de 2015

Território da alma

Quando é que a força interior surge, incontrolável, arrancando frases, externando sensações e sentimentos que estavam adormecidos dentro de você e nunca soube que seria capaz disso? Na raiva? Na plenitude da alegria? Na tristeza extrema? Mas existem outras situações simples, que às vezes nos sentimos ridículos, tolos, incapazes de emitir um sentimento espontaneamente, por mais banal que seja. Porém, nos esforçamos para sermos autênticos, verdadeiros, e até mesmo inspirados.

Alguns momentos, entretanto, devemos nos esforçar e tirar das profundezas da alma uma reação absolutamente sincera, verdadeira e carregada de um sentimento puro de autenticidade.

A editora portuguesa Pena Perfeita editou, em 2007, o livro Cartas a Deus, onde é perguntado a escritores, jornalistas, homens e mulheres, crentes e descrentes, ligados a diferentes áreas da cultura: “O que eu diria a Deus se tivesse a oportunidade de lhe escrever uma carta?”. Por uma questão de espaço, não podemos detalhar o ponto de vista dessas pessoas. Transcrevo, abaixo, apenas a abertura de tais “cartas”. Servem, no mínimo, para instigar e ao mesmo tempo convidar você a fazer o mesmo. Aceita, leitor amigo?

Senhor Deus,

Convidaram-me, por e-mail, a escrever-Te uma carta. Tenho de valorar bem as palavras porque elas são a arma do povo e não quero perder esta arma mesmo numa carta dirigida a Ti, cujo limite máximo é de quatro mil caracteres.”

(José Pinto da Costa, médico e professor)

Meu caro:

Admito que não exijas excelência e que não obrigues que os homens tenham medo de ti pois já basta o diabo que é preto e deita fogo da boca e usa um garfão que nem nos churrascos da inquisição dos brancos. Aliás, tem gente que pensa que tu é branco.”

(Manuel Rui – escritor)

“Chego a ti de mãos vazias. Sinto o sabor da perda a enrolar-me a língua. Sei que nada devo pedir-te. Jamais te pedirei seja o que for. Diante de tanta solicitação, imagino o cansaço que sentirás. Prefiro, antes, sentar-me à sombra do teu silêncio, como o faria junto ao velho carvalho onde me detinha quando tempo ainda não era sombrio.”

(Maria João Cantinho – escritora)

“Entendi escrever-Te esta carta, meu Deus, porque hoje estou especialmente entristecida. Mais uma vez me entraram pela casa dentro imagens de situações que eu não desconheço, como sabes, mas que o ritmo cada vez mais frenético do dia a dia faz com que fiquem um pouco adormecidas. Será que a Tua ajuda será ‘apenas’ dar-me força?”

(Maria de Belém Roseira – jurista)

Meu Pai, meu Filho, meu Espírito Santo.

Estendo as mãos à caveira da noite, e a criatura que sou consome-a a areia do vidro do tempo. Nada digo que não te pertença, nada escrevo que não corra à eternidade.”

(Mario Cláudio – escritor)

“Levei anos a escrever-Te cartas, bilhetinhos, orações e até músicas, não só porque tinha um código postal genético que m garantia que os meus recados chegariam ao destino, como, principalmente, porque nasci, cresci e vivi a maior parte da minha vida simplesmente com a convicção absoluta que eras tão real como o chão que piso todos os dias ou o ar que respiro para sobreviver.”

(Mafalda Arnauth – fadista)

“Não é possível escrever uma carta a Deus, porque ele nos vigia, conhece as letras uma a uma antes de elas estarem escritas. Não escrevo uma carta a Deus porque conversamos algumas vezes.”

(Pedro Mexia – escritor)

“Agradeço muito o seu convite e louvo-o pela iniciativa. Se não levar a mal, porém, não participarei nela. De fato eu não tenho de imaginar o que diria eu a Deus se tivesse a possibilidade de lhe enviar uma carta, porque eu lhe envio muitas cartas todos os dias.”

(João César Neves – economista)

“...que tudo isso me seja descontado. Nada mais Te direi de mim porque tudo saberás e seria blasfemo querer atribuir-me maiores competências que as Tuas, mesmo a respeito de mim próprio e do que sou.”

(Carlos Vaz Marquews – jornalista)

Meu Deus, Meu Amigo,

Falo contigo todos os dias, de viva voz, mas hoje é por escrito que te quero agradecer. Acima de tudo, pela vida. A que tu me deste e a que tu guias, a cada passo e a cada minuto que passa.”

(Gilbeto Parca Madail – presidente da federação portuguesa de futebol)

“Olá. Tenho tanto para te dizer que... nada tenho para te dizer. Não sei por onde começar. Receio cair no exagero do louvor, na patetice, na injustiça do rancor e da inerente imprecação.”

(Rui Zink – escritor)

Meu Deus,

Acreditas que sonhava com isto de Te poder falar há já muito tempo e agora que tenho a oportunidade parece que estou engasgado?”

(Paulo Fragoso – locutor FM)

Meu querido Senhor,

É um grande atrevimento escrever-Te da parcela ínfima do meu ser e do ângulo estreito do meu olhar, para a imensa varanda donde nos vês no passado e no futuro, nos contextos apertados em que se movimenta a nossa liberdade”.

(Antonio Rego – jornalista)

“Creio que Deus não poderá receber qualquer carta minha, porque sei que Ele não existe e portanto não tem caixa de correio nem endereço eletrônico.”

(Maria Filomena Mônica – socióloga)

“Embora absurda, apeteceu-me hoje escrever-te esta carta. Chamo-lhe absurda porque, se existires, já saberás de antemão tudo o que eu possa dizer-te, adivinhando-me cada frase antes de eu a escrever.”

(Fernando Pinto do Amaral – escritor)

Linha do Tempo

"A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo. Quando verei aquele de que tenho tanta sede? As lágrimas são o meu pão de dia e de noite, eu que todo o tempo ouço perguntar: onde está o teu Deus?”

(Salmos 41, 1-4) 

Fábula

Euterpe – Uma das nove musas. Inventou a flauta e é a que preside a música. Ordinariamente se apresenta na figura de uma donzela coroada de flores e tendo junto a si papéis de solfa, uma flauta, oboés e outros instrumentos da música.

(Dicionário da Fábula – traduzido de Chompré – com argumentos tirados da história poética - Ed. Garnier – Paris)

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    (Cortesia de Paulo Henrique)

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